Etiologia

O sistema de coagulação no sangue é complexo e altamente regulado. Leves perturbações nos sistemas que regulam a coagulação podem levar ao sangramento ou à trombose.[12] A maioria dos casos de embolia pulmonar é causada por embolização de uma trombose venosa profunda (TVP), a qual surge de três fatores que atuam individualmente ou em conjunto (tríade de Virchow)​:[13]

  • Lesão vascular: danos às células endoteliais promovem a formação de trombos, geralmente, nas valvas venosas, o que pode resultar em TVP, que posteriormente emboliza para formar embolia pulmonar (EP). Danos à parede vascular podem ocorrer após uma série de lesões, incluindo trauma, TVP prévia, cirurgia, dissecção venosa e cateterização venosa central.[14]​ Ocasionalmente, a EP pode surgir de um trombo que se forma no coração direito, o que pode ocorrer na fibrilação atrial.[15]​ A trombose "de novo" também pode ocorrer nas artérias pulmonares, como na infecção por COVID-19.

  • Estase venosa: o hipofluxo sanguíneo e a estase promovem a formação de trombos. Estase venosa e congestão resultam em danos valvares, promovendo ainda mais a formação de trombos. A estase venosa aumentada está associada com idade >40 anos, imobilidade, obesidade, anestesia geral, paralisia, lesão na medula espinhal, infarto do miocárdio, AVC prévio, veias varicosas, insuficiência cardíaca congestiva avançada e DPOC avançada.

  • Ativação do sistema de coagulação: várias outras condições (tanto hereditárias quanto adquiridas) aumentam o risco de EP. Entre elas estão câncer, estados de estrogênio elevado (contraceptivos orais, reposição hormonal, obesidade, gravidez), doença inflamatória intestinal, síndrome nefrótica, sepse, transfusão sanguínea e trombofilia hereditária (mutação do fator V de Leiden, mutação do gene da protrombina, deficiência de proteínas C e S, deficiência de antitrombina e síndrome do anticorpo antifosfolipídeo).

Assim, os pacientes que desenvolvem tromboembolismo venoso costumam apresentar um fator desencadeante que leve à coagulação sanguínea (por exemplo, cirurgia ou trauma que ativa o sistema de coagulação), imobilidade prolongada causando estase, ou medicações ou doenças (por exemplo, cânceres, síndrome antifosfolipídica) que possam estimular a coagulação. A susceptibilidade à trombose é geneticamente mediada. Diversas variantes genéticas no próprio sistema de coagulação (por exemplo, mutação do fator V de Leiden), bem como fora do sistema de coagulação (por exemplo, tipo sanguíneo não O), aumentam o risco de trombose. Todos esses fatores podem interagir, aumentando ainda mais o risco de EP.

Há uma clara associação entre EP e o seguinte:[16]

  • Malignidade ativa

  • Cirurgia de grande porte recente (especialmente procedimentos ortopédicos)

  • Internação recente

  • Trauma recente

  • Afecção clínica (especialmente doenças associadas a inflamação, como infecção aguda).

  • Reposição hormonal e terapia contraceptiva com estrogênio oral

  • Gestação e pós-parto

A presença ou ausência e o momento desses fatores de risco em relação ao diagnóstico de EP têm um grande impacto na determinação da duração da terapia anticoagulante.[17] A International Society on Thrombosis and Haemostasis publicou um sistema de classificação em quatro categorias (apresentadas em ordem crescente de risco de tromboembolismo venoso recorrente após um episódio inicial), consistente com as orientações do National Institute of Clinical Excellence do Reino Unido e do American College of Chest Physicians:[18][19][20]​​​

  • Grande provocação de fator de risco transitório (por exemplo, cirurgia durando >60 minutos), ocorrendo em até 3 meses antes da trombose

  • Pequena provocação de fator de risco transitório (por exemplo, contraceptivos orais, internação hospitalar), ocorrendo em até 2 meses antes da trombose

  • Não provocada (nenhum fator de risco provocador identificado)

  • Provocação por fator de risco persistente (por exemplo, câncer ativo)

As diretrizes da American Society of Hematology e da European Society of Cardiology empregam uma estrutura semelhante, com algumas diferenças na terminologia.[3][21][22]

Fisiopatologia

A EP ocorre quando um trombo originário das veias dos membros inferiores (ou de outro lugar) se desloca e viaja pelo fluxo venoso até ficar preso nas artérias pulmonares. Essa obstrução aumenta a resistência vascular pulmonar (RVP), aumentando o trabalho do ventrículo direito. O ventrículo direito compensa aumentando a frequência cardíaca e usando a reserva de pré-carga de Frank-Starling através da dilatação. Nos casos graves de EP, os aumentos na RVP podem sobrecarregar os mecanismos compensatórios do ventrículo direito (VD), causando superdistensão do ventrículo direito, aumento na pressão diastólica final do VD e diminuição no débito cardíaco do VD. A diminuição do débito do VD causa uma diminuição na pré-carga do ventrículo esquerda (VE). Conforme diminuem o enchimento e o débito cardíaco do ventrículo esquerdo, a queda na pressão arterial média evolui para hipotensão e choque. Nos indivíduos previamente saudáveis, isso pode ocorrer quando 50% da vasculatura pulmonar estiver obstruída. No entanto, há uma variação interindividual na capacidade de tolerar a EP, e o grau anatômico de obstrução nem sempre se correlaciona bem com a gravidade fisiológica da EP.[23]

Os trombos raramente se desenvolvem "de novo" na vasculatura pulmonar, mas podem ocorrer, por exemplo, no caso de alguns subtipos de hipertensão arterial pulmonar e no contexto da COVID-19. A trombose venosa profunda (TVP) nos membros superiores está associada a uma menor incidência de EP, assim como trombos em sítios incomuns, como as veias cerebrais.[24][25] Uma pequena parte de casos de EP pode derivar da formação de trombos no átrio direito, no contexto das arritmias atriais.[26]

O dano endotelial parece ser menos importante no tromboembolismo venoso do que na trombose arterial.[27] Diferentemente dos trombos arteriais ricos em plaquetas, o tromboembolismo venoso é composto principalmente de fibrina e eritrócitos aprisionados (coágulos vermelhos). Embora seja observada agregação plaquetária, esta não é evidente no sítio da formação trombótica, sugerindo que a ativação da cascata de coagulação precede a ativação plaquetária.[27][28]

Os trombos agudos começam a ser dissolvidos pelo sistema fibrinolítico do corpo assim que um coágulo começa a se formar. Assim, níveis elevados de produtos de metabolização da fibrina de ligação cruzada, especialmente o fragmento chamado dímero D, aparecem no sangue após o início da formação do coágulo. Portanto, o teste do dímero D é um componente importante da abordagem baseada em evidências para diagnosticar uma suspeita de EP.[29]

Classificação

Classificação anatômica

A EP pode ser descrita pela localização e pela extensão dos trombos na árvore arterial pulmonar.

  • Tipo de vasos proximais: principal, lobar, segmentar, subsegmentar (a EP isolada a vasos subsegmentares apenas pode ter diferentes opções de tratamento).

  • Número de vasos ou porcentagem da vasculatura afetada. Sistemas quantitativos formais estão disponíveis.[2]

Classificação fisiológica

A EP pode ser classificada de acordo com seu impacto fisiológico sobre o sistema cardiovascular. Essa classificação tem mais correlação com o prognóstico clínico e, normalmente, informa as estratégias de tratamento das principais diretrizes.

  • Maciça versus submaciça

    • A EP maciça descreve a EP que resulta em choque ou hipotensão

    • A EP submaciça resulta em tamanho ou função anormal do ventrículo direito, mas com normotensão.

  • Classificação da European Society of Cardiology[3]

    • EP de alto risco: EP que resulta em hipotensão ou choque. Índice de Gravidade da Embolia Pulmonar (PESI) Classe III-V, ou PESI simplificado (sPESI) ≥1.

    • EP de risco intermediário-alto: EP que resulta em parâmetros anormais do VD em exames de imagem e biomarcadores cardíacos anormais, mas com normotensão. PESI Classe III-V ou sPESI ≥1.

    • EP de risco baixo-intermediário: EP que resulta em parâmetros anormais do VD em exames de imagem ou biomarcadores cardíacos anormais (mas não ambos), com normotensão. PESI Classe III-V ou sPESI ≥1.

    • EP de baixo risco: não atende a nenhum critério para risco alto ou intermediário. PESI Classe I-II ou sPESI <1.

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