Etiologia
As últimas décadas trouxeram uma melhor compreensão da etiologia e fisiopatologia da enxaqueca. Fatores genéticos, ambientais e outros fatores desconhecidos são responsáveis pela hiperexcitabilidade do sistema nervoso central, causando suscetibilidade à descompensação episódica caracterizada por cefaleia e outros sintomas associados.
Fisiopatologia
A fisiopatologia da enxaqueca continua pouco compreendida, apesar dos progressos recentes. Vários aspectos da crise de enxaqueca estão mais ou menos explicados; no entanto, um processo fisiopatológico abrangente e unificador ainda não foi esclarecido.
Uma predisposição genética para hiperexcitabilidade neuronal generalizada na enxaqueca é bem aceita, já que uma história familiar de enxaqueca é encontrada em aproximadamente 50% dos pacientes.[8] Deixando de lado as raras formas monogênicas de enxaqueca hemiplégica, a enxaqueca é considerada uma condição poligênica e epigenética. Genes que codificam vários canais iônicos (por exemplo, CACNA1A, ATP1A2, PRRT2 e SCN1A) foram associados à enxaqueca hemiplégica familiar.[1]
As crises de enxaqueca têm as seguintes fases: premonitória, aura, ictal, pós-drômica e interictal. Cada uma dessas fases tem seu próprio conjunto de vias fisiopatológicas, mais ou menos compreendidas.[9]
Alguns pacientes com enxaqueca relatam uma fase premonitória que precede o início da cefaleia em até alguns dias e que consiste em fadiga, bocejos, rigidez de nuca, alterações de humor, fissura alimentar, dores musculares e fotofobia, entre outros sintomas.[10] A base mecanicista de uma gama tão ampla de sintomas é desconhecida. Estudos de neuroimagem funcional dão suporte ao papel do hipotálamo no início da crise de enxaqueca.[11][12] Uma hipótese sugere que o hipotálamo e outras áreas corticais e subcorticais são ativadas por vários fatores desencadeantes de enxaqueca (odores, despertar, etc.). O hipotálamo exerce influências ativadoras no sistema parassimpático, levando à vasodilatação cerebral e à liberação de moléculas inflamatórias, o que, por fim, leva à ativação do nociceptor meníngeo e à cefaleia.[13] Outra hipótese sugere que o hipotálamo e o tronco encefálico exercem influências excitatórias e inibitórias no relé talâmico para os sinais trigeminovasculares nociceptivos.[14]
A fase de aura consiste em manifestações neurológicas corticais autorresolutivas, como sintomas visuais ou sensoriais, que geralmente precedem o início de uma cefaleia. Acredita-se que seja o resultado da depressão cortical alastrante, uma onda de despolarização que avança lentamente, seguida de hiperpolarização.[15]
A própria cefaleia domina a fase ictal. Os pesquisadores observaram que a ativação da via trigeminovascular é a base da fase ictal e explica o tipo de cefaleia latejante e pulsante característica da enxaqueca. Não está claro o que é responsável pela estimulação dos nociceptores das artérias meníngeas e intracranianas de grande porte.
A fase pós-drômica descreve o período entre a resolução da cefaleia e a recuperação total. Muitos pacientes relatam fadiga e dificuldades de concentração durante esse período.[16]
Classificação
Classificação internacional dos distúrbios de cefaleia, 3ª edição (ICHD-3)[1]
1.1 Enxaqueca sem aura: distúrbio de cefaleia recorrente manifestado em crises com duração de 4 a 72 horas. As características típicas da cefaleia são localização unilateral, qualidade pulsátil, intensidade moderada ou grave, agravamento pelas atividades físicas de rotina e associação a náuseas e/ou fotofobia e fonofobia.
1.2 Enxaqueca com aura: crises recorrentes, que duram alguns minutos, de sintomas visuais, sensoriais ou outros sintomas do sistema nervoso central unilaterais completamente reversíveis que, em geral, se desenvolvem gradualmente e, depois, costumam ser seguidos por cefaleia e sintomas associados a enxaqueca.
1.2.1 Enxaqueca com aura típica: enxaqueca com aura, na qual a aura consiste em sintomas visuais e/ou sensitivos ou de fala/linguagem, mas sem fraqueza motora, e é caracterizada por desenvolvimento gradual, duração de cada sintoma de até 1 hora, uma combinação de características positivas e negativas e reversibilidade completa
1.2.1.1 Aura típica com cefaleia
1.2.1.2 Aura típica sem cefaleia.
1.2.2 Enxaqueca com aura tronco-encefálica: sintomas de enxaqueca com aura claramente provenientes do tronco encefálico, mas sem fraqueza motora.
1.2.3 Enxaqueca hemiplégica: enxaqueca com aura, incluindo fraqueza motora
1.2.3.1 Enxaqueca hemiplégica familiar (EHF)
1.2.3.1.1 Enxaqueca hemiplégica familiar de tipo 1 (EHF1)
1.2.3.1.2 Enxaqueca hemiplégica familiar de tipo 2 (EHF2)
1.2.3.1.3 Enxaqueca hemiplégica familiar de tipo 3 (EHF3)
1.2.3.1.4 Enxaqueca hemiplégica familiar, outros loci
1.2.3.2 Enxaqueca hemiplégica esporádica (EHE).
1.2.4 Enxaqueca retiniana: ataques repetidos de distúrbio visual monocular, incluindo cintilações, escotoma ou cegueira, associados a cefaleia enxaquecosa.
1.3 Enxaqueca crônica: cefaleia que ocorre 15 dias por mês ou mais por mais de 3 meses que, em pelo menos 8 dias/mês, apresenta as características de cefaleia enxaquecosa.
1.4 Complicações da enxaqueca
1.4.1 Estado de mal enxaquecoso: ataque de enxaqueca debilitante com duração superior a 72 horas
1.4.2 Aura persistente sem infarto: sintomas de aura que persistem por 1 semana ou mais, sem evidências de infarto na neuroimagem
1.4.3 Infarto enxaquecoso: um ou mais sintomas de aura de enxaqueca que ocorrem em conjunto com uma lesão cerebral isquêmica no território apropriado demonstrada por neuroimagem, com início durante o ciclo de uma enxaqueca típica com ataque de aura
1.4.4 Convulsão desencadeada por enxaqueca com aura: convulsão desencadeada por um ataque de enxaqueca com aura.
1.5 Enxaqueca provável: ataques semelhantes aos da enxaqueca com ausência de uma das características necessárias para preencher todos os critérios de um tipo ou subtipo de enxaqueca descrito acima e sem preencher os critérios de outro distúrbio de cefaleia.
1.5.1 Provável enxaqueca sem aura
1.5.2 Provável enxaqueca com aura
1.6 Síndromes episódicas que podem estar associadas a enxaqueca
1.6.1 Distúrbios gastrointestinais recorrentes
1.6.1.1 Síndrome do vômito cíclico
1.6.1.2 Enxaqueca abdominal
1.6.2 Vertigem paroxística benigna
1.6.3 Torcicolo paroxístico benigno.
O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal