Abordagem
O tratamento para o adenocarcinoma de sítio primário desconhecido (ASPD) é orientado pela capacidade funcional do paciente (isto é, aptidão física) e sintomas, e se ele tem ou não um subtipo clinicopatológico favorável (por exemplo, um sítio primário provável; lesão metastática única; doença oligometastática) que permite tratamento personalizado com terapia específica ao sítio.[3] Aproximadamente 20% dos pacientes com câncer de sítio primário desconhecido (CSPD) apresentam um subtipo favorável.[2][3] Consulte Etiologia (Classificação) para obter detalhes sobre subtipos favoráveis.
A maioria dos pacientes com ASPD tem múltiplas metástases e/ou nenhum sítio primário provável óbvio (isto é, subtipo desfavorável).
Quimioterapia: considerações gerais
A quimioterapia tem sido a base do tratamento do ASPD e é usada empiricamente com intenção paliativa em pacientes com um subtipo desfavorável.[2][3]
Muitos esquemas quimioterápicos foram avaliados, mas as revisões sistemáticas e as metanálises não conseguiram demonstrar superioridade de um esquema em relação ao outro.[34][35][36] Uma metanálise relatou uma tendência de melhora na sobrevida com esquemas contendo agentes de platina ou taxanos.[36]
Capacidade funcional
A capacidade funcional do paciente é um determinante crítico do tratamento. A escala do Eastern Cooperative Oncology Group (ECOG), que varia de 0 (totalmente ativo) a 5 (morto), é comumente usada para avaliar a capacidade funcional. Consulte Critérios de diagnóstico.
A maioria dos pacientes com ASPD é formada por idosos, com um pouco de comprometimento funcional relacionado à doença avançada.
As diretrizes da National Comprehensive Cancer Network (NCCN) recomendam a consideração da terapia sistêmica para pacientes que:[2]
Sintomáticos com capacidade funcional de 1-2, ou
Assintomáticos com câncer agressivo e capacidade funcional 0.
A reavaliação frequente tipicamente inclui uma nova história e um novo exame físico para avaliar a capacidade funcional e a tolerância da terapia, com dados laboratoriais básicos para averiguar a função do órgão. Se houver alguma deterioração na capacidade funcional ou se a tolerância da terapia for insatisfatória (seja por relato do paciente ou por um desequilíbrio laboratorial significativo [neutropenia, trombocitopenia ou disfunção renal ou hepática]), a quimioterapia deverá ser reavaliada e/ou descontinuada. Os cuidados de suporte devem continuar conforme necessário.
Cuidados de suporte
Devem ser iniciados cuidados de suporte, de preferência sob a supervisão de um médico ou uma equipe de cuidados paliativos.
As estratégias iniciais de tratamento têm o objetivo de controlar os sintomas atribuídos ao processo subjacente, como dor ou obstrução local, e o foco deve ser o alívio dos sintomas.
Dor óssea: geralmente requer tratamento com um anti-inflamatório não esteroidal (AINE), um analgésico opioide, um corticosteroide ou uma combinação adequada desses agentes. Ácido zoledrônico (um bifosfonato) ou denosumabe pode ser administrado para a dor decorrente de metástase óssea e para reduzir o risco de eventos relacionados aos ossos, como fraturas. A radioterapia paliativa também pode ser considerada.
Dor neuropática: pode responder à terapia com anticonvulsivante (por exemplo, gabapentina) ou antidepressivo (por exemplo, duloxetina).
Dor local: pode ser tratada com bloqueios de nervos regionais ou radioterapia.
Sintomas obstrutivos: estão relacionados a massa tumoral ou inflamação localizada, e são comuns (por exemplo obstruções intestinal, biliar e brônquica). Os sintomas obstrutivos devem ser tratados de modo agressivo, usando uma abordagem multidisciplinar, com radiologia intervencionista, intervenção cirúrgica ou endoscópica, radioterapia e farmacoterapia, conforme apropriado.
Outros sintomas que requerem atenção incluem fadiga, depressão, náuseas e delirium.
Pacientes com múltiplas metástases e/ou sem provável sítio primário (subtipo desfavorável)
Para pacientes com ASPD nos quais não é identificado um subtipo clínico-patológico favorável, o tratamento inicial recomendado é a quimioterapia empírica.[2][3]
A quimioterapia empírica padrão para pacientes com ASPD é um esquema duplo que compreende um agente de platina combinado com um taxano (paclitaxel ou docetaxel) ou gencitabina.[2][3] As respostas não são duráveis (sobrevida mediana de, aproximadamente, 12 meses entre pacientes com boa capacidade funcional).[37][38]
Não existe consenso sobre a terapia de segunda linha adequada para pacientes tratados previamente com esquemas que contêm platina; nenhum agente único ou combinação se mostrou benéfico (taxa de resposta ou sobrevida mediana). As decisões sobre a terapia de segunda linha se baseiam na preferência do oncologista ou em outras características do paciente que podem impedir o uso de determinadas classes de medicamentos citotóxicos.
Pacientes com provável sítio primário (subtipo favorável)
Os pacientes com características clinicopatológicas análogas a um câncer primário conhecido podem ser tratados com terapia específica adaptada a esse sítio.
Mulheres com linfadenopatia axilar isolada
As pacientes do sexo feminino que apresentam linfadenopatia axilar isolada e adenocarcinoma documentado devem ser submetidas à mamografia para suspeita de câncer de mama.[2] A RNM da mama com contraste e/ou a ultrassonografia da mama são indicadas se a mamografia não for diagnóstica, mas houver evidências histopatológicas de câncer de mama.[2] Estudos retrospectivos indicam que a RNM da mama pode ajudar a identificar o câncer primário em aproximadamente dois terços dos pacientes com exame clínico negativo e mamografia negativa.[39]
A avaliação de marcadores de câncer de mama por coloração imuno-histoquímica (por exemplo, GATA3; receptor estrogênico/receptor de progesterona [RE/RP]) é recomendada em mulheres com linfadenopatia axilar isolada.[2] Os tumores positivos para RE/RP podem ser tratados com terapia hormonal. As pacientes com provável câncer de mama primário devem ser tratadas de acordo com os protocolos para câncer de mama primário.[2][3] Consulte Câncer de mama invasivo primário.
Mulheres com carcinomatose peritoneal de adenocarcinoma papilar seroso
Histologicamente análogo ao câncer de ovário em estádio III. As mutação das linhas germinativas BRCA1/2 podem estar presentes, e o CA-125 normalmente está elevado, consistente com o perfil de câncer de ovário. A terapia de primeira linha é semelhante à usada para câncer de ovário em estádio avançado, que inclui redução cirúrgica ideal e quimioterapia adjuvante à base de platina, geralmente dupla com taxano/platina.[3] Há evidências, embora não consistentes, para dar suporte ao uso de quimioterapia intraperitoneal para câncer de ovário em estádio avançado; seu potencial papel no manejo do adenocarcinoma papilar da cavidade peritoneal ainda não foi analisado.[40][41][42] As pacientes com câncer de sítio primário desconhecido do tipo câncer de ovário são tratadas de acordo com as diretrizes para câncer de ovário.[2][3] Consulte Câncer de ovário.
Carcinoma pouco diferenciado com características neuroendócrinas.
Uma minoria significativa de carcinomas pouco diferenciados ou indiferenciados tem características neuroendócrinas identificadas pela avaliação histológica. Subtipos favoráveis de carcinoma neuroendócrino não são considerados nas diretrizes europeias porque um câncer primário indefinido é um achado comum.[3]
A quimioterapia combinada com paclitaxel, carboplatina e etoposídeo foi associada com uma importante taxa de resposta de 53% (sobrevida mediana de 14.5 meses; taxas de sobrevida em 2 e 3 anos de 33% e 24%, respectivamente), em um ensaio clínico de fase 2 com pacientes virgens de tratamento com carcinoma neuroendócrino metastático pouco diferenciado.[43] Em um estudo subsequente de fase 2, irinotecano e cisplatina não foram inferiores a etoposídeo e cisplatina em pacientes com carcinoma neuroendócrino gastroenteropancreático pouco diferenciado.[44] A participação no estudo terminou mais cedo (n=66 pacientes) porque as análises iniciais relataram taxas de resposta similares.[44] Tumores neuroendócrinos pouco diferenciados são tratados de acordo com as diretrizes para câncer pulmonar de células pequenas.[2][45] Consulte Câncer pulmonar de células pequenas.
Tumores neuroendócrinos bem diferenciados
Tumores neuroendócrinos incluem tumores de ilhotas, tumores carcinoides e gastrinomas, entre outros. Subtipos favoráveis de carcinoma neuroendócrino não são considerados nas diretrizes europeias porque um câncer primário indefinido é um achado comum.[3]
Se for viável, a citorredução cirúrgica ou quimioembolização é preferida como terapia inicial, pois o controle da massa tumoral parece retardar a progressão da doença sistêmica. A quimioterapia tem efetividade variável, dependendo do tipo de tumor subjacente, com tumores neuroendócrinos pancreáticos exibindo taxas de resposta muito melhores que tumores carcinoides derivados de outros sítios primários. Devem ser considerados tratamentos adequados para tumores neuroendócrinos metastáticos bem diferenciados, inclusive análogos da somatostatina (por exemplo, octreotida, lanreotida), everolimo, sunitinibe ou radioterapia com receptor de peptídeo.[4] Tumores neuroendócrinos bem diferenciados devem ser tratados como tumores carcinoides.[2] Consulte VIPoma.
Adenocarcinoma com imuno-histoquímica colorretal
Os pacientes com coloração imuno-histoquímica que sugere sítio primário colorretal (CDX2-positivo, CK20-positivo, CK7-negativo) podem se beneficiar de esquemas de quimioterapia usados para o tratamento de câncer colorretal metastático (por exemplo, capecitabina associada a oxaliplatina [CapeOX]; fluoruracila/ácido folínico associado a oxaliplatina [FOLFOX ou FLOX] ou irinotecano [FOLFIRI], com ou sem bevacizumabe).[2][3][46] Consulte Câncer colorretal.
Carcinoma pouco diferenciado do mediastino ou retroperitôneo em homens <40 anos
Esses pacientes devem ser avaliados para tumores de células germinativas testiculares (usando os marcadores tumorais séricos alfafetoproteína [AFP] e gonadotrofina coriônica humana beta [hCG]).[2][4] Os pacientes do sexo masculino devem ser considerados para ultrassonografia testicular, particularmente se os marcadores tumorais estiverem elevados, e tratados principalmente com intenção de cura, com um esquema baseado em cisplatina (por exemplo, bleomicina, etoposídeo, cisplatina [BEP]).[2] Consulte Câncer de testículo.
Historicamente, muitos pacientes com carcinoma pouco diferenciado com distribuição na linha média, na verdade tinham tumores extragonadais de células germinativas. Assim, as diretrizes europeias sugerem que o carcinoma pouco diferenciado com subtipo de distribuição na linha média não deve mais ser usado.[3]
Homens com metástases ósseas blásticas com coloração imuno-histoquímica/expressão sérica de antígeno prostático específico (PSA)
As metástases ósseas blásticas em homens mais velhos (com idade ≥40 anos) com PSA elevado mais provavelmente indicam um tumor primário de próstata. Deve-se administrar tratamento com terapia de privação androgênica (com ou sem radioterapia), ou outros tratamentos adequados para câncer de próstata recém-diagnosticado.[4] Consulte Câncer de próstata.
Pacientes com lesão metastática única ou doença oligometastática (subtipo favorável)
Pacientes que apresentam uma única lesão metastática de sítio primário desconhecido são raros, e o tratamento deve ser individualizado. No entanto, há consenso geral de considerar a terapia local definitiva, geralmente cirúrgica; a radioterapia definitiva pode ser adequada, dependendo do local anatômico.[2][3] A quimioterapia adjuvante pode ser considerada para controlar os focos metastáticos que ainda não estão evidentes.[4]
Sítios comuns das lesões solitárias incluem o fígado, a glândula adrenal, o cérebro e os ossos. O tratamento varia dependendo do sítio primário suspeito. O teste com coloração imuno-histoquímica pode ajudar a determinar um provável sítio primário e orientar o tratamento. O esquema quimioterápico com atividade ampla em vários tipos de tumor (englobando os sítios mais prováveis da doença, como carcinoma pulmonar ou tumores gastrointestinais) normalmente é preferível.
Doença oligometastática
As diretrizes europeias sugerem que pacientes selecionados com doença oligometastática podem ser tratados com o uso de cirurgia ablativa local e/ou radioterapia.[3][47] Os pacientes candidatos devem satisfazer aos seguintes critérios:[3]
O tratamento ablativo local de todas as lesões por cirurgia e/ou radioterapia é considerado viável
O estado oligometastático foi confirmado por exame de imagem, inclusive tomografia por emissão de pósitrons/tomografia computadorizada (PET-CT) e RNM cranioencefálica.
O número de metástases não passa de cinco
Ausência de envolvimento de órgão difuso, como carcinomatose maligna pleural, peritoneal ou leptomeníngea.
Medianas de sobrevida livre de eventos e sobrevida global de 15.6 e 52.5 meses, respectivamente, foram relatadas após o tratamento ablativo local de sítio único e carcinoma oligometastático de sítio primário desconhecido.[47]
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