Prevenção primária

A prevenção é fundamental para redução da morbidade e da mortalidade, pois atualmente não há tratamentos para o manejo da febre amarela, com exceção dos cuidados de suporte. Vacinação e evitação das picadas do mosquito são as estratégias de prevenção recomendadas.

Vacinação com a vacina 17D de vírus vivo atenuado é recomendada em pessoas com idade ≥9 meses que estejam viajando para, ou morando em, áreas com risco de transmissão da febre amarela (por exemplo, África e América do Sul). A vacina deve ser administrada pelo menos 10 dias antes da viagem.[18] Devido ao surto atual no Brasil, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a vacinação contra febre amarela aos viajantes internacionais que visitam o Brasil.[19][20]

CDC: yellow fever travel information Opens in new window

A Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency (MRHA) do Reino Unido introduziu uma checklist padronizada pré-vacinação para garantir que a vacina contra febre amarela seja indicada para destinos de viagem específicos e para identificar as contraindicações ou precauções existentes em indivíduos antes da vacinação.

MHRA: yellow fever vaccine (Stamaril): new pre-vaccination checklist Opens in new window

Funcionários de laboratórios que estejam sob risco de infecção também devem ser vacinados.[18]

A OMS atualmente recomenda uma dose primária única da vacina (administrada por via subcutânea) para conferir imunidade vitalícia; não há mais a exigência de um reforço após 10 anos.[21] No entanto, apesar de o Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP) dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA concordar que isso é adequado para a maioria dos viajantes, ele recomenda doses adicionais para os seguintes grupos de viajantes:[18]

  • Mulheres que estavam grávidas quando receberam a dose inicial da vacina (elas devem receber uma dose adicional antes da próxima viagem de risco)

  • Pessoas que receberam um transplante de células-tronco hematopoéticas após receberem a dose inicial da vacina (elas devem receber uma dose adicional antes da próxima viagem de risco, desde que estejam suficientemente imunocompetentes)

  • Pessoas infectadas por HIV quando receberam a última dose da vacina (elas deverão receber uma dose a cada 10 anos se continuarem a se expor ao risco de infecção)

Além disso, as recomendações da ACIP especificam que uma dose de reforço pode ser considerada para viajantes que tenham recebido a última dose há ≥10 anos e que estarão em ambiente de alto risco, com base em localização, temporada, duração da viagem e atividades (por exemplo, períodos prolongados em áreas endêmicas). Funcionários de laboratórios que lidam com o vírus devem fazer a medição do título de anticorpos pelo menos a cada 10 anos para determinar se devem receber doses adicionais da vacina.[18] Nem todas as autoridades concordam com a interpretação dos dados disponíveis feita pela OMS.[22]

A OMS recomenda que um quinto da dose regular (dosagem fracionada) pode ser usada para controlar um surto em caso de falta de vacina.[23] Demonstrou-se que a dose fracionada foi eficaz na indução da soroconversão em pacientes que eram soronegativos na linha basal e que os títulos permaneceram acima do limiar de soropositividade 1 ano após a vacinação em 97% dos participantes.[24] Um estudo de longo prazo constatou que a dosagem fracionada induz uma resposta protetora que durou mais de 10 anos após a vacinação em 98% dos pacientes (em comparação com 97% dos pacientes que receberam a dose padrão).[25]

De acordo com o CDC, a vacina é contraindicada para crianças <6 meses de idade, pessoas com alergia a qualquer um dos componentes da vacina (a dessensibilização pode ser realizada se a imunização for considerada essencial), distúrbio do timo associado a função imunológica anormal, infecção por HIV sintomática ou contagem de CD4 <200 células/mm³ (ou <15% do total de linfócitos em crianças com idade <6 anos), imunodeficiências primárias, neoplasias malignas, pacientes que receberam transplantes de órgãos e pacientes que recebem terapias imunossupressoras ou imunomoduladoras. Ela deve ser utilizada com precaução nos lactentes com 6-8 meses de idade, adultos com idade ≥60 anos, infecção por HIV assintomática e contagem de CD4 de 200-499 células/mm³ (ou 15% a 24% do total de linfócitos em crianças com idade <6 anos) e mulheres gestantes ou que estiverem amamentando.[10]

Embora a vacina seja considerada segura e eficaz, foi relatado um aumento do risco de reações adversas com risco de vida em pacientes imunossuprimidos, com distúrbio do timo ou ≥60 anos. Os efeitos adversos graves incluem doença viscerotrópica relacionada à vacina (uma doença similar à doença do tipo selvagem) e doença neurotrópica (por exemplo, meningoencefalite, síndrome de Guillain-Barré, encefalomielite disseminada aguda, paralisias de nervos cranianos).[18][26]​ A taxa desses eventos, segundo uma revisão clínica abrangente, está na faixa de 0 a 14.6 por milhão de doses; no entanto, foi observado um aumento na taxa de complicações em pessoas com ≥60 anos de idade e em pessoas imunocomprometidas.[26] Os efeitos adversos mais comuns incluem efeitos sistêmicos leves, como febre baixa, cefaleia e mialgia, que têm início dias após a vacinação e duram 5-10 dias.[10] Um pequeno estudo sobre a vacinação contra a febre amarela em pacientes com esclerose múltipla (EM) mostrou um aumento do risco de exacerbação da EM, enfatizando a necessidade de uma avaliação cuidadosa da razão de risco/benefício ao se recomendar a vacinação contra a febre amarela a esses pacientes.[27] A vacina causa viremia de baixo nível em 50% dos pacientes. Embora essa viremia geralmente seja clinicamente irrelevante, ela pode causar problemas significativos em pacientes imunocomprometidos ou gestantes.[28][29]

Foi demonstrado que a administração simultânea da vacina contra febre amarela e da vacina tríplice viral (contra sarampo, caxumba e rubéola) resulta em interferências mútuas, com taxas de soroconversão abaixo do esperado para ambas as vacinas.[30] As vacinas de vírus vivos devem ser administradas ao mesmo tempo, ou com um intervalo de pelo menos 30 dias se a administração simultânea não for possível.[10]

Devido ao risco de reações adversas muito raras, mas potencialmente fatais, a Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency do Reino Unido recomenda as seguintes medidas adicionais:[31]

  • Não administre a vacina a pessoas que tiverem tido seu timo removido, estejam tomando medicamentos biológicos imunossupressores ou imunomoduladores ou tenham um parente de primeiro grau com história familiar de doença viscerotrópica ou neurotrópica relacionada à vacina contra a febre amarela não relacionada a um fator de risco médico conhecido

  • Tenha cuidado em pacientes com 60 anos ou mais; administrar apenas quando houver um risco significativo e inevitável de se contrair a infecção da febre amarela (por exemplo, viajar para uma área em que haja um risco atual ou periódico de transmissão da febre amarela)

  • Somente profissionais da saúde treinados especificamente para avaliar os benefícios e riscos da vacina contra a febre amarela devem administrar a vacina, e somente após uma avaliação individualizada do itinerário de viagem e da adequação da pessoa para receber a vacina.

Alguns países exigem prova de vacinação antes da entrada.[18] Um Certificado Internacional de Vacinação ou Profilaxia preenchido é válido durante toda a vida do vacinado, com a exigência do reforço após 10 anos retirada em junho de 2016. Apesar disso, médicos e viajantes devem analisar os requisitos de entrada de cada país.

WHO: countries with risk of yellow fever transmission and countries requiring yellow fever vaccination Opens in new window

PAHO/WHO: updated requirements for the International Certificate of Vaccination or Prophylaxis (ICVP) with proof of vaccination against yellow fever Opens in new window

Proteção contra picadas de mosquito

  • Evitar a picada do mosquito reduz o risco de febre amarela. Viajantes com destino a áreas de risco devem ser instruídos a usar um repelente contra insetos nas partes expostas do corpo para repelir os mosquitos. Os repelentes registrados pela EPA (Environmental Protection Agency) incluem produtos contendo DEET e picaridina. Concentrações de DEET de 30% a 50% são eficazes por várias horas. A icaridina, disponível em concentrações de 7% e 15%, requer aplicações mais frequentes. Formulações com DEET de até 50% são recomendadas para adultos e crianças com mais de 2 meses de idade. Bebês com menos de 2 meses de idade devem ser protegidos com o uso de um carregador/carrinho de bebê envolto em uma tela mosquiteira com elástico para garantir uma boa vedação. Ao se usar protetor solar, o protetor solar deve ser aplicado primeiro, e depois o repelente. O repelente deve ser lavado ao final do dia, antes de ir para a cama.

  • Viajantes com destino a áreas endêmicas devem vestir camisas/camisetas de manga longa, calças compridas e chapéus que cubram a pele exposta. Repelentes que contêm permetrina (por exemplo, permanona) ou outros repelentes de insetos devem ser aplicados nas roupas, calçados, tendas, telas mosquiteiras e em outros equipamentos para obter maior proteção. Geralmente, a maioria dos repelentes é removida das roupas e equipamentos com uma simples lavagem, mas roupas tratadas com permetrina mantêm o seu efeito por até 5 lavagens. O período de maior incidência de picadas de várias espécies de mosquito ocorre entre o anoitecer e o amanhecer; no entanto, o Aedes aegypti, o vetor mais ativo do vírus da febre amarela na África, se alimenta durante o dia. O CDC recomenda cuidado extra no uso de roupas com protetores e repelentes durante o dia, assim como no fim do dia e no começo da manhã, ou que as pessoas considerem evitar atividades externas durante esses períodos em áreas de risco de febre amarela.[32]

Prevenção secundária

A febre amarela é uma doença de notificação compulsória em alguns países. Uma vez que o diagnóstico de uma febre hemorrágica viral, inclusive febre amarela, pode indicar a possibilidade de um ato bioterrorista, as autoridades locais de saúde devem ser notificadas imediatamente.[14][47][48]

A transmissão não ocorre de paciente para paciente ou de paciente para profissionais da saúde, mas os pacientes devem ser isolados e protegidos contra a exposição adicional ao mosquito (por exemplo, não se expondo ao ar livre) por até 5 dias após o início da febre para romper o ciclo de transmissão.

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