Abordagem
O tratamento do estrabismo depende do tipo e da etiologia da anormalidade e é orientado pela avaliação do oftalmologista.
A presença de estrabismo impede o desenvolvimento das funções visuais binoculares como percepção de profundidade e estereopsia na infância. A função visual binocular só poderá se desenvolver normalmente, ou ser restaurada caso esteja subdesenvolvida, se o estrabismo for tratado com sucesso em uma idade jovem. No entanto, o estrabismo pode apresentar resolução espontânea em crianças com <4 meses de idade, particularmente se houver um desvio intermitente, variável ou pequeno (<40 dioptros prismáticos).[2]
Terapias não cirúrgicas iniciais
Correção dos erros de refração
A acuidade visual de todos os pacientes com estrabismo deve ser avaliada. Se um erro de refração significativo estiver presente, deverá ser corrigido com óculos de grau ou lentes de contato.
Isso pode causar o realinhamento dos olhos na esotropia acomodativa (com correção da hipermetropia) e alguns casos de exotropia intermitente. Em crianças, o erro de refração precisa ser medido sob cicloplegia (por exemplo, 30 minutos após a aplicação de colírios cicloplégicos, como ciclopentolato a 1%).[21]
A reversão da monovisão (se presente), em que a visão do olho dominante é corrigida para a distância, e o olho não dominante é corrigido para a visão de perto, também pode ser necessária para resolver os sintomas para alguns pacientes adultos.[28]
Se a esotropia não responder à prescrição inicial ou se recorrer após a cirurgia, repetir a refração cicloplégica antes de diagnosticar um componente não acomodativo.[2]
Tratamento da ambliopia
Embora a ambliopia possa ocorrer em qualquer idade antes do desenvolvimento da maturidade visual, ela não afeta pacientes com estrabismo de início na idade adulta.
O tratamento da ambliopia deve ser realizado em crianças e considerado em jovens adolescentes. As evidências para a resolução bem-sucedida após o tratamento em adultos são insatisfatórias.
Se estiver presente, a ambliopia deve ser tratada antes ou paralelamente à correção do estrabismo, pois tem sido demonstrado que o alinhamento cirúrgico dos olhos é mais bem-sucedido em pacientes com ambliopia leve ou ausente que naqueles com ambliopia moderada ou grave.[29]
O tratamento da ambliopia envolve a oclusão do olho sadio com uma pala, ou a penalização do olho sadio por meios ópticos (isto é, óculos de grau) ou meios farmacêuticos (colírios de atropina a 1%), ou ambos.[30] Evidências de uma revisão sistemática sugeriram que a oclusão, durante o uso de correção da refração, parece ser mais eficaz que apenas a correção da refração no tratamento da ambliopia estrábica.[22] Consulte Ambliopia (Abordagem de tratamento).
Tratamento da diplopia
A diplopia pode estar ausente em crianças com estrabismo resultante de supressão (processo ativo do sistema nervoso central pelo qual a entrada visual de um olho é ignorada) da imagem criada pelo olho não fixador.
Oclusão: embora a diplopia possa ser tratada com facilidade cobrindo-se um olho com um tampão, isso raramente é uma solução de longo prazo. Em crianças com ambliopia, o olho sadio é coberto (obstruído) e, na ausência de ambliopia, o olho que não se desvia é coberto. Se nem a ambliopia nem um olho com desvio óbvio estiverem presentes, a cobertura com tampão alternada será usada. Para evitar o desenvolvimento de ambliopia, a cobertura com tampão deve ser limitada a, no máximo, 6 horas por dia, com uma duração recomendada de 2 a 6 horas.[2] A oclusão deve ser usada com cautela na exotropia intermitente devido ao risco de evoluir para ambliopia.
Prismas: usados em crianças com estrabismo de início agudo para promover a fusão (sobreposição de imagens dos dois olhos) e evitar a ambliopia, mas raramente são úteis na exotropia intermitente. Em adultos, eles podem ser usados para tratar diplopia.[28] Os prismas alteram o caminho da luz, deslocando a imagem de um determinado objeto. Desse modo, eles são usados para sobrepor as imagens dos dois olhos quando os eixos visuais não estão alinhados, permitindo a fusão. Como os prismas não alteram a posição dos olhos, estes permanecem desviados sob o prisma. Os prismas funcionam melhor no estrabismo comitante (quando o ângulo do desalinhamento é constante em diferentes posições do olhar) e quando o ângulo do desvio é pequeno.
Tratamento da exotropia intermitente
Em crianças pequenas com exotropia intermitente e bom controle fusional, a cirurgia raramente é necessária porque raramente se deterioram para exotropia constante ou estereopsia reduzida.[2]
Prescrição excessivamente negativa: podem ser prescritos óculos de grau com uma potência negativa maior que a necessária para reduzir o ângulo de desvio e promover a binocularidade, embora esta seja apenas uma medida temporária e possa causar astenopia.[31][32]
Oclusão: cobrir um olho com um tampão pode resultar em melhor controle do desvio. Uma revisão Cochrane constatou que a cobertura com tampão oferece benefício clínico, em comparação com a observação em crianças de 12 meses a 10 anos.[31] Isso é realizado com cautela devido ao risco de desenvolvimento de ambliopia. Na presença de ambliopia, o olho sadio é coberto e, em sua ausência, é usada uma cobertura com tampão alternado por 2 a 6 horas por dia.[2]
Qualquer uma dessas técnicas pode ser usada e a outra deverá ser considerada se a primeira falhar.[32]
Exercícios ortópticos
Tanto crianças como adultos podem apresentar insuficiência de convergência e devem receber exercícios ortópticos para melhorar os sintomas associados à visão de perto.[2]
Os exercícios podem ser feitos em consultório ou em casa. Um artigo de revisão não encontrou nenhuma evidência científica para dar suporte ao uso da terapia de visão optométrica no tratamento de outras formas de estrabismo.[33]
Os exercícios ortópticos não devem atrasar a aplicação da terapia padrão.
tratamento da causa subjacente
Como o estrabismo secundário pode resultar de diversas patologias subjacentes (como paralisias de nervos cranianos e supranucleares, doença de Graves, fraturas orbitais e miastenia gravis), é fundamental que essas condições sejam identificadas e tratadas.
Cirurgia
O tratamento definitivo para a maioria dos casos de estrabismo primário e secundário é a cirurgia dos músculos extraoculares, principalmente quando o estrabismo foi estável por vários meses.[34] A intervenção cirúrgica deve ser considerada no estrabismo infantil, no estrabismo comitante, no estrabismo sensorial e em todos os desalinhamentos estáveis (incluindo estrabismo paralítico). Nos desalinhamentos adquiridos (por exemplo, paralíticos), é importante aguardar de 6 a 12 meses por uma possível recuperação espontânea e para estabilização. Os benefícios psicossociais da cirurgia podem resultar da melhora da aparência ou função facial, mesmo em indivíduos com estrabismo não diplópico.[28]
Os princípios básicos da cirurgia são aumentar (fortalecer) ou diminuir (enfraquecer) a função muscular. Isso pode ser conseguido por meio de recessões, ressecções e plicaturas. As recessões envolvem mover a inserção de um músculo posteriormente no olho para enfraquecer o músculo. As ressecções envolvem a retirada de uma seção do músculo para fortalecê-lo, o que também pode ser feito por plicatura. O uso de estruturas ajustáveis permite refinar a posição do músculo extraocular no início do período pós-operatório, e pode resultar em melhores desfechos cirúrgicos em alguns pacientes.[35]
As decisões sobre se e quando operar são tomadas pelo oftalmologista responsável e podem ser complexas em alguns pacientes. Para a exotropia de início infantil, a cirurgia precoce pode melhorar os desfechos sensoriais se a exotropia for constante, mas raramente atinge a função binocular normal. Portanto, a cirurgia é geralmente indicada para exotropia intermitente se houver progressão para desvio constante ou quase constante, se houver redução da estereopsia e/ou se o paciente ou família relatarem efeitos negativos nas interações sociais. Os procedimentos cirúrgicos iniciais eficazes nesses casos incluem ressecção-recesso unilateral e recessão bilateral do reto lateral.[2] Para a esotropia de início infantil, a correção cirúrgica precoce provavelmente melhora os desfechos sensoriais ao diminuir a exposição, mas provavelmente não melhora os desfechos motores em comparação com uma cirurgia posterior. Também não há evidências suficientes para favorecer qualquer abordagem cirúrgica em detrimento de outra para esotropia.[2][36]
A cirurgia geralmente é necessária para corrigir o estrabismo infantil em adultos, mas os procedimentos podem ser mais desafiadores e devem abordar as sequelas de cirurgias anteriores.[18] Se o potencial para visão binocular for fraco, a cirurgia em qualquer idade ainda pode ser um tratamento adequado para restaurar uma aparência normal.[18][19]
Estima-se que complicações graves e desfechos desfavoráveis ou muito desfavoráveis surjam em 1 em 400 e 1 em 2400 cirurgias, respectivamente.[37]
Quimiodenervação
A toxina botulínica do tipo A bloqueia de maneira seletiva a liberação de acetilcolina na junção neuromuscular e causa quimiodenervação. Se injetada por via intramuscular, resulta em paralisia flácida temporária, com recuperação da função muscular geralmente em 2 meses. É, portanto, considerada mais útil no tratamento do estrabismo que deverá mudar, como estrabismo residual pós-operatório e estrabismo paralítico agudo (particularmente aquele secundário à paralisia do nervo abducente).
Na maioria dos pacientes com estrabismo, o tratamento cirúrgico é preferível à quimionervação porque o efeito desta última é temporário, conforme demonstrado pelas revisões Cochrane comparando as duas abordagens. Uma revisão concluiu que a toxina botulínica parece ser inferior tanto para o tratamento primário como para a repetição de tratamento, que pode levar a mais repetições de tratamento cirúrgico e que pode não ajudar a alcançar a binocularidade quando comparada com a cirurgia.[38] A outra revisão indicou que a cirurgia pode conseguir um melhor alinhamento dos olhos em comparação com as injeções de toxina botulínica e que está associada a um risco mínimo.[36]
A toxina botulínica tipo A pode ajudar a aliviar o estrabismo secundário à paresia aguda do nervo abducente (IV nervo craniano) por injeção no músculo reto medial para enfraquecer o músculo enquanto o insulto agudo se cura. As injeções repetidas também podem ser usadas como uma alternativa de longo prazo à cirurgia em pacientes que não são elegíveis para cirurgia devido a comorbidades, com um estudo descrevendo bons desfechos com até 68 injeções.[39] A toxina botulínica também pode ser útil no tratamento de exotropias consecutivas, especialmente após múltiplas cirurgias musculares oculares.[40]
O principal efeito adverso é a ptose (em até 40% dos pacientes), que geralmente é reversível.[38]
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