Etiologia

A maioria dos abortos espontâneos (aproximadamente 80%) ocorre no primeiro trimestre.[11][12] Aproximadamente 1% a 2% de todas as gestações no segundo trimestre resultam em aborto espontâneo antes de 24 semanas.[13] A etiologia pode ser dividida em fatores embrionários e/ou maternos, embora mais provavelmente ela seja multifatorial.


Aborto espontâneo: discussão sobre fatores causais
Aborto espontâneo: discussão sobre fatores causais

Uma mulher que sofreu vários abortos espontâneos discute com um clínico geral qual seria a melhor abordagem para conversar sobre a causa do aborto espontâneo e a importância de se evitar a culpabilização.


Fatores embrionários:

  • A maioria dos abortos espontâneos no primeiro trimestre (6 a 12 semanas) é atribuível a doença, distúrbio ou dano embrionário primário[17]

  • Até 80% dos tecidos gestacionais prematuros dos abortos espontâneos do primeiro trimestre são cromossomicamente anormais.[18] O tecido gestacional prematuro proveniente de abortamentos habituais demonstra a maior frequência das anomalias cromossômicas.[19] Embora o desvio de inativação do cromossomo X tenha sido considerado um fator etiológico genético específico, os estudos refutaram essa afirmação.[20][21] Um estudo mostrou que o aborto espontâneo parecia ser duas vezes mais provável em casais que possuíam uma parente de primeiro grau que tinha sofrido aborto espontâneo em comparação com aqueles que tinham uma parente de terceiro grau que havia tido aborto espontâneo. Portanto, a história familiar positiva para aborto espontâneo pode ser um fator causal para abortamento habitual; entretanto, são necessários estudos adicionais.[22]

  • Malformações embrionárias, principalmente do sistema nervoso central (SNC), são frequentes em gestações que sofrem aborto espontâneo.

Fatores maternos:

  • Muitos abortos espontâneos ocorridos no segundo trimestre (13ª à 22ª semana) são decorrentes de disfunção do trato genital materno ou de doença sistêmica. Sugere-se que a maioria esmagadora dos casos esteja associada a uma infecção ascendente do trato genital inferior. Se esta informação for confirmada por dados de desfechos locais e regionais, ela destacará a necessidade de uma mudança significativa nas estratégias preemptivas e preventivas.[23]

  • Exposição materna a altas doses de agentes tóxicos, irradiação ou quimioterapia, endocrinopatias significativas, doenças imunológicas e infecções transplacentárias, todos esses fatores têm sido implicados.[8] A vaginose bacteriana assintomática pode ter um papel importante no aborto espontâneo do segundo trimestre.[24][25] Grandes miomas submucosos comprometem a angiogênese embrionária precoce e a micro-hemodinâmica. A síndrome do anticorpo antifosfolipídeo pode estar por trás do abortamento habitual do primeiro e do segundo trimestre.[26] A incompetência, insuficiência ou fraqueza cervical é responsável pela maioria dos abortos espontâneos recorrentes do segundo trimestre. Pode ter havido parto prematuro em gestações prévias consecutivas.

  • Uma análise de artigos publicados sobre medicamentos fitoterápicos/tradicionais ingeridos por gestantes constatou que alguns deles podem ter propriedades abortivas, incluindo aloe vera, limão amargo e aipo.[27] Ainda não está claro como o uso dessas substâncias, em combinação com as interações entre as substâncias e com a heterogeneidade das pacientes, pode afetar o desfecho das gestações em fase inicial. Portanto, está claro que são necessários estudos adicionais.

  • Usando um modelo preditivo que incorpora exames de translucência nucal, proteína plasmática A associada à gravidez e características maternas em gestações unifetais entre a 11ª e a 14ª semana (comparando 2396 mulheres submetidas à biópsia da vilosidade coriônica com 33,856 que não realizaram esse exame, na mesma idade gestacional), o risco de aborto espontâneo aumentou em gestações resultantes de indução da ovulação, em fetos com translucência nucal elevada e em mulheres com diabetes mellitus preexistente.[28]

  • A gravidade, o tratamento em curso e outros fatores de confusão de um distúrbio materno específico podem ser mais importantes que a existência da própria doença.

Na prática, as causas mais comuns de aborto espontâneo no segundo trimestre são incompetência, fraqueza ou insuficiência cervical, após procedimentos invasivos para diagnóstico fetal; infecção viral fetal transplacentária; infecção bacteriana fetal transplacentária; isoimunização rhesus intensa.

Fisiopatologia

A fisiopatologia não é clara. O sangramento vaginal é originário do local da implantação da decídua ou da placenta. O início do sangramento pode ocorrer antes ou depois da morte fetal. Causas imunogênicas, hipóxicas e vasculares podem resultar em um caminho comum final de grave disfunção vilosa ou placentária, causando a morte embrionária ou fetal. Uma hipótese possível é que um sangramento local de intensidade variável acompanhe todos os abortos espontâneos, mas sua persistência é revelada, ocultada ou seguida pela morte fetal. Essa hipótese é consistente com achados de desenvolvimento vascular anormal na interface maternoembriônica.[29][30] Também foram demonstradas disfunção local de fatores moduladores da implantação bem como anormalidades sistêmicas.[31] As duas principais direções das pesquisas atuais parecem ser a avaliação da atividade das células natural killer e a decidualização insuficiente.[32][33]

Classificação

Classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) das etapas do aborto espontâneo[1]

Classificado nas seguintes categorias:

  • Ameaça de aborto espontâneo: ameaça de aborto espontâneo na presença de sangramento vaginal não provocado, com ou sem dor na parte inferior do abdome, que ocorre em uma gestação de 20-24 semanas (a gestação depende do país) e onde a gestação pode continuar.

  • Aborto espontâneo inevitável: aborto considerado inevitável quando características clínicas específicas indicam que a gestação está no processo de expulsão fisiológica do interior da cavidade uterina (a gestação não continuará e constituirá aborto espontâneo incompleto ou completo).

  • Aborto espontâneo incompleto: aborto espontâneo no qual o tecido gestacional prematuro é parcialmente expelido. É possível que muitos abortos espontâneos incompletos sejam resultado da falta de reconhecimento de abortos espontâneos não identificados.

  • Aborto espontâneo completo: aborto espontâneo no qual o tecido gestacional prematuro é completamente expelido.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Evolução natural do aborto espontâneoDe: Ankum WM, Wieringa-de Ward M, Bindels PJE. BMJ 2001 Jun 2;322(7298):1343-6. [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@41ab61fb

Outros tipos de aborto espontâneo

Aborto espontâneo não identificado (morte embrionária/fetal precoce):[5]

  • Aborto espontâneo com aspectos ultrassonográficos consistentes com uma gestação inviável ou impossível de prosseguir, mesmo na ausência de achados clínicos. O aborto espontâneo não identificado geralmente é um achado incidental, pois raramente há uma indicação de que algo está errado com a gestação. Algumas mulheres mencionam um corrimento vaginal transitório e/ou amarronzado ou uma vaga redução nos sintomas de início de gravidez.

Abortamento habitual:[3]

  • A perda espontânea de ≥3 gestações consecutivas antes de completadas 20-24 semanas(a gestação depende do país) é considerada abortamento habitual.

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