Abordagem

A tarefa inicial na avaliação de um paciente com suspeita de alergia alimentar é diferenciar a doença atópica da não atópica e distinguir os sinais e sintomas das reações imunológicas adversas mais brandas daqueles mais graves e preocupantes de resposta anafilática. Deve-se também tentar identificar, se possível, o alimento responsável. Os testes diagnósticos para identificação dos alérgenos alimentares devem ser requisitados e interpretados no contexto dos achados de exame físico e de história médica.

História e exame físico

A avaliação deve começar com o detalhamento dos sinais e sintomas específicos informados pelo paciente ou pelos pais, com enfoque especial nas manifestações dermatológicas, respiratórias, gastrointestinais, oftalmológicas e sistêmicas ou cardíacas graves. Os achados decisivos no diagnóstico de alergia alimentar incluem:

  • Prurido, rubor, urticária e angioedema cutâneo[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Achados cutâneos típicos de alergia alimentar 30 minutos após a ingestão de amendoimDo acervo de Duke University Medical Center; uso autorizado [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@36a20b42

  • Espirros, rinorreia, congestão nasal, gosto metálico, rouquidão, estridor, sensação de sufocamento, edema laríngeo, dispneia, taquipneia, sibilância, tosse ou cianose

  • Náuseas, vômitos, cólicas abdominais, distensão abdominal e diarreia

  • Hiperemia conjuntival, lacrimejamento, edema periorbital

  • Em casos graves, distúrbios de condução, taquicardia, bradicardia, arritmias, hipotensão e parada cardíaca.

Indícios pertinentes que fundamentam a impressão clínica de doença atópica incluem familiar com alergia alimentar, presença de outras doenças alérgicas (por exemplo, dermatite atópica, rinite alérgica, asma), exposição alimentar transdérmica perinatal (por exemplo, óleo de amendoim), excesso ou diminuição de vitamina D na dieta, ácidos graxos poli-insaturados ômega-3 ou antioxidantes e exposição escassa a bactérias e infecção. Estudos realizados no Reino Unido demonstraram que o risco de se apresentar alergia ao amendoim é 7 vezes maior caso algum parente de primeiro grau tenha essa alergia.[15] Foi relatado que gêmeos monozigóticos têm uma taxa de concordância de 64% para alergia alimentar, em comparação com 6.8% entre gêmeos dizigóticos.[20] Pacientes com dermatite atópica, asma e rinite alérgica são mais suscetíveis à alergia alimentar. A presença de asma é fator de risco para uma reação fatal.[36] Dois terços das crianças com dermatite atópica e alergia alimentar apresentam reatividade a ovos.[37]

Noventa por cento das reações em crianças são causadas por leite, ovos, amendoim, nozes, trigo, soja, peixe e marisco; em adultos, por amendoim, nozes, marisco, peixe e legumes e/ou hortaliças.[1][38][39] Geralmente pode-se elucidar o alimento responsável mediante questionamento rigoroso e avaliação das respostas do paciente.

  • O alérgeno alimentar suspeito foi ingerido, inalado ou tocado? O alimento suspeito específico deve produzir sintomas reprodutíveis em quase todas as vezes que é ingerido.

  • Que quantidade do alimento suspeito foi ingerida no momento da reação? As reações mediadas por imunoglobulina E (IgE) podem ser desencadeadas em alguns minutos, enquanto outros distúrbios podem levar mais tempo.

  • Quanto tempo após a exposição ao alérgeno alimentar suspeito ocorreram os sintomas? As reações mediadas por IgE geralmente ocorrem dentro de 20 minutos após a exposição e quase sempre em até 2 horas.

  • Quanto tempo os sintomas levaram para desaparecer anteriormente e como a reação foi tratada? Os sintomas mediados por IgE geralmente desaparecem em até 4 a 12 horas. As reações podem apresentar resolução espontânea ou responder a intervenções clínicas.

  • Foi estabelecida uma relação entre exercícios físicos e o surgimento dos sintomas? Pode ocorrer anafilaxia induzida por exercício dependente de alimento, caso o alimento seja ingerido em até 2 a 4 horas antes ou após os exercícios.[37]

  • Houve ingestão de medicamentos ou bebidas alcoólicas próximo à reação? Acredita-se que medicamentos e bebidas alcoólicas aumentam a taxa de absorção de alérgenos.[40][41][42]

Modalidades de testes de alergia alimentar

Devem-se realizar testes diagnósticos no caso de uma avaliação inicial sugerir alergia alimentar. Os testes podem começar tanto por imunoensaios para dosagem de imunoglobulina (Ig) E in vitro como por um teste alérgico cutâneo por puntura. Dispensam-se os testes diagnósticos caso a avaliação seja negativa (por exemplo, caso o paciente tolere o alimento regularmente e não apresente sintomas relacionados), sendo a alergia alimentar descartada como causa dos sintomas.[43] Caso um alimento tenha sido tolerado em grandes quantidades várias vezes anteriormente, provavelmente não se trata de um alérgeno relevante, mesmo com um teste positivo. Extratos de frutas e vegetais (legumes/hortaliças) industrializados não são considerados suficientemente preditivos pela labilidade da proteína processada. Devem-se utilizar frutas e vegetais frescos nos testes cutâneos.[44]

Alta sensibilidade e baixa especificidade da puntura e do teste de IgE para alergia alimentar podem produzir resultados falso-positivos, o que pode levar a dietas de eliminação potencialmente prejudiciais aos pacientes.[43] Efeitos como progressão para alergia do tipo imediato, incluindo reações anafiláticas, foram relatados.[43][45][46][47] Os testes devem ser realizados por um alergologista treinado no tratamento de eventos raros, mas potencialmente fatais. Deve-se realizar um teste de desencadeamento alimentar caso os resultados dos testes específicos fiquem abaixo dos valores preditivos de uma reação por imunoensaio e por testes cutâneos, ou caso o diagnóstico seja questionável. Testes cutâneos negativos no início da vida não excluem o desenvolvimento subsequente de hipersensibilidade à IgE específica mais tardiamente durante a infância.[22]

Os testes de desencadeamento alimentar duplo-cegos controlados com placebo são considerados os testes decisivos no diagnóstico da alergia alimentar.[48] Esses testes de desencadeamento oral (testes de provocação/desafios alimentares) são graduados, devendo haver um número equivalente de etapas alimentares e de placebos. Se o paciente passar desse teste de desencadeamento aberto, poderá ser realizada alimentação aberta. Se esta for tolerada, a alergia alimentar é descartada.

Estudos investigativos

Alérgenos purificados ou recombinantes são usados para identificar sensibilização a IgE específica para proteínas pertencentes a um determinado alérgeno alimentar através de diagnósticos resolvidos por componentes. Alguns estudos mostraram um aumento da capacidade de predizer a probabilidade de haver reação alérgica grave a alimentos como amendoim, soja ou avelã; no entanto, padrões geográficos de sensibilização ao pólen podem afetar os resultados. São necessários estudos adicionais para generalizar a interpretabilidade.[49][50] O papel da testagem de componentes continua a evoluir.[51]

Os testes de adesivos atópicos geralmente são usados para identificar os alérgenos que causam reações mediante hipersensibilidade de contato tardia, na qual as células T desempenham um papel importante. Um adesivo com extrato alergênico é aderido à pele intacta por 48 horas. O teste está disponível apenas para uso em pesquisas.[52] Os testes com adesivos estão bem validados para dermatites de contato, mas não para alergias alimentares em geral.

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