Abordagem
A regurgitação aórtica (RA) aguda constitui uma emergência que exige intervenção cirúrgica urgente. A RA crônica tem uma evolução prolongada, e o paciente pode permanecer assintomático por várias décadas. Muitos daqueles que apresentam RA leve ou moderada permanecem estáveis e podem nunca necessitar de nenhuma cirurgia corretiva. A cirurgia deve ser realizada o mais rapidamente possível em pacientes com RA crônica que desenvolvem instabilidade hemodinâmica ou insuficiência cardíaca.
Regurgitação aórtica aguda
A regurgitação aórtica (RA) aguda é uma emergência cirúrgica. Os pacientes necessitam de avaliação e manejo das vias aéreas, com intubação se necessário. Recomendam-se agentes inotrópicos positivos (por exemplo, dobutamina) e um vasodilatador (por exemplo, nitroprussiato de sódio) para suporte hemodinâmico. O tratamento definitivo se dá com cirurgia urgente, principalmente nos pacientes com RA resultante de endocardite infecciosa e dissecção da raiz aórtica.[1][22]
RA crônica
O tratamento de RA crônica depende de 5 fatores:
Se a regurgitação é leve, moderada ou grave
Se o paciente é assintomático ou sintomático
Se o paciente tem função ventricular esquerda (VE) normal ou disfunção VE
Se o paciente tem dilatação VE
Se o paciente é um candidato a cirurgia.
Doença leve a moderada
Pacientes com doença leve a moderada (American College of Cardiology/American Heart Association [ACC/AHA] estágio B, RA progressiva) que são assintomáticos com função normal do VE não necessitam de tratamento e podem ser tranquilizados. Em pacientes com esse grau de gravidade de RA, os sintomas ou a disfunção VE, se presentes, provavelmente não serão decorrentes de RA. Uma causa subjacente alternativa, como hipertensão, doença arterial coronariana ou cardiomiopatia, é mais provável e deve ser investigada e tratada. Recomenda-se acompanhamento periódico para a avaliação dos sintomas e do estado funcional.
Em pacientes com doença moderada submetidos à cirurgia cardíaca por outra indicação, pode-se considerar a substituição cirúrgica concomitante da valva aórtica.[1]
Doença grave
Pacientes que apresentam RA assintomática com fração de ejeção do VE (FEVE) >55% e diâmetro sistólico final do VE (DSFVE) <50 mm (ACC/AHA estágio C1) não necessitam de tratamento, e o paciente pode ser tranquilizado. Recomenda-se acompanhamento periódico para a avaliação dos sintomas e do estado funcional. Se o paciente for submetido à cirurgia cardíaca por outra indicação, pode-se considerar a substituição cirúrgica concomitante da valva aórtica.[1]
Observe que, nas diretrizes da European Society of Cardiology (ESC), o limiar para intervenção em pacientes assintomáticos é de uma FEVE <50%.[22]
A cirurgia da valva aórtica será indicada em pacientes assintomáticos com RA grave crônica e FEVE ≤55% (ACC/AHA estágio C2), se nenhuma outra causa de disfunção sistólica for identificada. A cirurgia da valva aórtica é também justificada em pacientes com função sistólica normal do VE (FEVE >55%) quando o VE estiver muito dilatado (DSFVE >50 mm ou DSFVE indexado >25 mm/m²).[1][26] A cirurgia pode também ser considerada em pacientes com RA grave crônica e FEVE >55% em repouso (ACC/AHA estágio C1) que apresentem baixo risco cirúrgico e declínio progressivo da FEVE para a faixa baixa normal (55% a 60%) ou aumento progressivo do diâmetro diastólico final do VE (>65 mm) em, pelo menos, 3 estudos.[1]
Em pacientes com RA grave e disfunção sistólica e/ou sintomas do VE, mas um risco cirúrgico proibitivo, recomenda-se a terapia medicamentosa orientada por diretrizes para redução da FEVE e/ou da hipertensão.[1]
Todos os pacientes sintomáticos necessitam de cirurgia, independentemente de sua função e dilatação VE.[1][22][26] Para o manejo sintomático, podem ser usados vasodilatadores enquanto o paciente aguarda a cirurgia.[1] Se o paciente não for candidato cirúrgico em decorrência de comorbidades, recomenda-se a terapia medicamentosa orientada por diretrizes para redução da FEVE e/ou hipertensão.[1]
As opções cirúrgicas são o reparo ou a substituição cirúrgica da valva aórtica (SCVA). Não existe diferença nas indicações para substituição ou reparo. A SCVA é realizada na maioria dos pacientes que necessitam de cirurgia. O reparo da valva aórtica é possível em pacientes selecionados, mas somente é realizado em centros especializados. Após a cirurgia, a maioria dos pacientes mostra reversão da dilatação VE e melhora na FE. A função VE pré-operatória é o melhor preditor do prognóstico em longo prazo em pacientes submetidos a SCVA.[27] Pacientes com FE pré-operatória normal ou com curto tempo de disfunção VE (<14 meses) apresentam maior melhora nos diâmetros VE e melhora pós-operatória precoce e tardia na função VE.[28] Entre os pacientes com disfunção VE, os que têm função VE pré-operatória deficiente apresentam maior risco de evoluir para insuficiência cardíaca congestiva e maior risco de morte em comparação com pacientes com função VE pré-operatória normal.[29] A sobrevida entre pacientes com disfunção VE pré-operatória grave tem melhorado dramaticamente desde 1985 e se tornou quase equivalente à de pacientes com disfunção VE não grave. Pacientes com valva protética apresentam alto risco de tromboembolismo e precisam de terapia antitrombótica. O risco de sangramento deve ser avaliado contra o benefício da anticoagulação.
Pode-se considerar o implante transcateter da valva aórtica (ITVA) para pacientes cuidadosamente selecionados com RA grave e insuficiência cardíaca que não sejam candidatos à cirurgia, mas essa opção é raramente adotada.[1][22] O ITVA não é recomendado para pessoas com RA grave isolada que apresentem indicações para cirurgia e sejam candidatas à cirurgia.[1]
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