Abordagem

As considerações a seguir aplicam-se somente à intussuscepção ileocecal (ou seja, intussuscepção que envolve o íleo distal, geralmente com o ceco, cólon transverso e ascendente). O tratamento primário é sempre por enema com contraste (gás ou líquido), a menos que haja sinais de peritonite indicando a necessidade de cirurgia imediata.[28]​ Na intussuscepção do intestino delgado (por exemplo, íleo-ileal) ou na intussuscepção que ocorre em associação com um ponto inicial patológico, diferentes considerações se aplicam. Por coincidência, uma intussuscepção íleo-ileal pode ser observada durante ou após uma laparotomia (geralmente uma cirurgia retroperitoneal). Se este não for o caso, e se a criança tiver chegado com sintomas, a probabilidade de uma redução radiológica ser bem-sucedida será menor, pois é mais difícil gerar pressão suficiente no intestino mais proximal.[29]​ Da mesma forma, quando existe suspeita de ponto inicial patológico, uma ressecção cirúrgica tem menor probabilidade de ser solicitada, dependendo da natureza do ponto inicial.[1]​ A ressecção também reduzirá a chance de recorrência.

O tratamento da intussuscepção pediátrica deve ser iniciado no momento do diagnóstico. O objetivo é a correção da hipovolemia e das anormalidades eletrolíticas e, em seguida, a redução urgente. A redução pode ser obtida com enema com contraste (ar ou líquido de contraste) ou por cirurgia.

Ressuscitação fluídica

O tratamento inicial inclui a obtenção de acesso intravenoso adequado e correção da hipovolemia com ressuscitação fluídica isotônica.

A - antibióticos

O papel do antibiótico não está claro. Em alguns centros, os antibióticos não são mais indicados como rotina para crianças com intussuscepção, a menos que haja choque séptico coexistente ou manifestações de perfuração intestinal. Em outros, o potencial de intestino mal perfundido ou dilatado para transportar e produzir bacteremia é considerado uma indicação. A administração de antibióticos profiláticos antes da redução do enema não parece reduzir o risco de complicações pós-redução.[28]​ Quando indicado, devem ser administrados antibióticos de amplo espectro que abrangem patógenos intra-abdominais.

Administre os antibióticos 1 hora antes do procedimento, se possível, depois prossiga com eles após a redução por até 48 horas, se houver isquemia ou dilatação significativa.

Para pacientes submetidos à ressecção, utilizar esquemas profiláticos intestinais de rotina. A administração prolongada de antibióticos só é recomendada em casos de perfuração ou formação de abscesso.

Redução por enema com contraste

O enema com contraste (ar ou líquido de contraste) deve ser realizado somente em pacientes clinicamente estáveis. As complicações da redução por enema com contraste incluem perfuração e fracasso da redução; ambos necessitam de intervenção cirúrgica. Devem ser considerados os riscos associadas à exposição à radiação.

  • Contraindicações absolutas: peritonite, perfuração e choque hipovolêmico.[27]

  • Contraindicações relativas: sintomas prolongados, achados de isquemia intestinal ou coleção de fluidos à ultrassonografia e nítida evidência de obstrução intestinal (por exemplo, distensão abdominal, sinais nos exames de imagem).[27] O procedimento requer certa cooperação de crianças mais velhas, que podem não tolerar o desconforto que ele gera.

  • Os fatores que sugerem uma taxa mais baixa de redução e uma taxa maior de perfuração incluem pacientes com idade <3 meses ou >5 anos, duração prolongada dos sintomas (>48 horas), eliminação de sangue por via retal, desidratação significativa, obstrução do intestino delgado e visualização de um sinal da mola espiralada.[20]

A redução deve ser tentada primeiro pelo enema com contraste (contraste de ar ou líquido), que pode ser tanto diagnóstico quanto terapêutico. A redução pneumática é considerada o método de escolha para o tratamento da intussuscepção em pacientes estáveis, contanto que não haja indicação para redução cirúrgica.[30][31]​​ Os protocolos normalmente variam de acordo com a instituição, mas geralmente envolvem a instilação de ar e/ou contraste em pressões que variam de 80 a 120 mmHg.[27]​ O paciente deve ser mantido em jejum.

Os métodos de enemas terapêuticos variaram ao longo do tempo. A redução por enema com contraste tem sido classicamente realizada com líquido (contraste solúvel em água ou bário) ou ar. Enemas com soro fisiológico e enemas guiados por ultrassonografia foram bem-sucedidos, reduzindo a carga de radiação. As taxas de redução bem-sucedida e complicações com esta técnica não poderiam ser diretamente comparadas com as de outros métodos de redução por enema com contraste em razão da falta de padronização entre os estudos.[21][22] Entretanto, uma revisão Cochrane de dois estudos constatou que o ar é mais eficaz que o contraste com líquido (base de evidência de baixa qualidade).[22][Figure caption and citation for the preceding image starts]: Local de intussuscepção conforme revelado pela radiografia abdominal, que mostra o meniscoDo acervo do Dr David J. Hackam; usada com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@144a2e93[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Radiografia abdominal que mostra a passagem insuficiente de bário no local da obstrução decorrente da intussuscepçãoDo acervo do Dr David J. Hackam; usada com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@7e218566

  • Enema de bário: as vantagens em relação aos outros tipos de redução por enema com contraste incluem experiência de longa duração em alguns centros, redução eficaz na maioria dos casos, boa avaliação de intussuscepção residual e baixa taxa de perfuração. Entre as desvantagens, estão a necessidade de exposição à radiografia, peritonite química em caso de perfuração e visualização de conteúdo somente intraluminal. O enema com contraste hidrossolúvel tem sido usado para reduzir o risco de peritonite química resultante de perfuração. As taxas de redução e de perfuração são comparáveis com outros agentes de contraste.

  • Enemas de ar: menos radiação necessária e taxas de fracasso, recorrência e perfuração semelhantes às de outros agentes.

  • Enema com soro fisiológico guiado por ultrassonografia: excelentes resultados foram descritos com o uso desta modalidade, que oferece a vantagem de limitar a exposição à radiação.[30][32]​​ Embora haja menos experiência com este método que com a redução fluoroscópica, ele está sendo cada vez mais utilizado.[20][21][31][32][33]​​​​​​​

Redução cirúrgica

A radiografia abdominal simples deve ser avaliada quanto à presença ou ausência de gás intra-abdominal livre, porque a presença de pneumoperitônio indica perfuração intestinal e requer avaliação cirúrgica imediata. Os pacientes com contraindicações à redução por enema de contraste também devem ser submetidos a uma avaliação cirúrgica urgente. Nos casos não complicados, a redução cirúrgica tem sido realizada com sucesso por meio de laparoscopia, assim como por meio das abordagens abertas tradicionais.[28]

Tradicionalmente, a redução cirúrgica tem sido realizada por meio de uma abordagem aberta via incisão no quadrante inferior direito. A intussuscepção é identificada e removida do intussuscipiente. A redução laparoscópica bem-sucedida foi descrita e está se tornando popular;​ o intussuscepto é reduzido pela aplicação de tração suave.[34][35]​ A necessidade de pressão intra-abdominal significa que uma cirurgia laparoscópica não será considerada para um paciente clinicamente instável.[28]​ Se houver presença de peritonite, recomendam-se apoio cirúrgico e ressuscitação imediatos.[28]​ A ressecção do intestino ameaçado não viável é necessária para os casos complicados por isquemia, necrose e perfuração intestinais.

Recorrência

A maioria dos casos de recorrência, após a redução bem-sucedida da intussuscepção, ocorre logo após a redução. A taxa de recorrência da intussuscepção após a redução por enema com contraste (ar ou líquido de contraste) é de aproximadamente 10% e não difere significativamente com base no tipo de redução contrastada realizada.[36] O risco de recorrência dentro de 48 horas é baixo após a redução do enema, sugerindo que os pacientes que aparentam estar bem devem ser selecionados para manejo ambulatorial e acompanhamento.[37][38]

A redução cirúrgica tem sido associada a uma taxa de recorrência de 2% a 5%.[39]

Uma revisão Cochrane avaliou evidências de dois estudos que investigaram o uso de medicamento esteroide, como a dexametasona. A revisão constatou que a administração de esteroides pode reduzir a recorrência de intussuscepção, mas são necessárias pesquisas adicionais para confirmar esses resultados.[22]

Embora a suspeita de um ponto inicial patológico deva aumentar com uma intussuscepção recorrente, a redução por enema com contraste bem-sucedida tem sido defendida. A intervenção cirúrgica é reservada para as recorrências irredutíveis e quando há presença de um ponto inicial patológico identificado.​[2][36]​ Após um terceiro episódio de intussuscepção em um lactente, um ponto inicial patológico deve ser considerado. A tomografia computadorizada pode ser útil na avaliação de um ponto inicial patológico.[19]

Em crianças mais velhas com intussuscepção, os pontos iniciais patológicos devem ser considerados. Doenças como fibrose cística e púrpura de Henoch-Schönlein podem provocar anormalidades na parede intestinal que funcionam como pontos iniciais na intussuscepção.

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