Etiologia

O pênfigo vulgar (PV) e o pênfigo foliáceo (PF) são doenças cutâneas bolhosas autoimunes mediadas por anticorpos. O PV responde por 80% dos casos de pênfigo, e o PF representa 10%.

O pênfigo paraneoplásico (PPN) é ao mesmo tempo autoimune (mediado por anticorpos) e mediado por células. O pênfigo eritematoso e o pênfigo por IgA são variantes raras.

O pênfigo é um grupo de doenças autoimunes mediadas pela IgG de epitélios escamosos estratificados, como a pele e a mucosa oral, em que a acantólise (perda da adesão celular) causa vesículas e erosões.

No PV e no PF, os autoanticorpos da IgG ligam-se exclusivamente ao componente desmogleína (uma molécula de adesão semelhante à caderina) do desmossomo (um complexo proteico responsável pela adesão entre células da pele). Os autoanticorpos, caracteristicamente contra a desmogleína 3 (e, em menor grau, a desmogleína 1) no PV e a desmogleína 1 no PF, causam ruptura da ligação celular ao ligar a porção extracelular do ceratinócito.[5] No PPN, os autoanticorpos ligam porções de hemidesmossomo, resultando em uma fisiopatologia mais complexa.[16][17][18]

A maioria dos casos de pênfigo se desenvolve espontaneamente. Raramente, o PV e o PF podem estar associados à exposição de determinados medicamentos (por exemplo, D-penicilamina, captopril, enalapril, penicilina, interleucina 2, nifedipino e rifampicina). A distribuição geográfica do PF endêmico é semelhante à da mosca negra, a qual se acredita ser um possível vetor que desencadeia a doença.[19][20] Outros insetos hematófagos, como percevejos e barbeiros, têm também sido implicados.[21] No PF endêmico, constatou-se que anticorpos antidesmogleína 1 reagem de forma cruzada ao antígeno salivar LJM11 do flebotomíneo.[22][23]

O PPN está fortemente relacionado a malignidades subjacentes. Em um terço dos pacientes, o PPN é um marcador de malignidade desconhecida. A distribuição de PPN é bimodal, ou seja, uma doença que ocorre em pessoas jovens, tipicamente associada à doença de Castleman por herpes-vírus não humano tipo 8, e em idosos com história de linfoma não Hodgkin, leucemia linfocítica crônica, timoma e sarcomas raros.[4]

Fisiopatologia

O pênfigo é um grupo de doenças autoimunes mediadas pela IgG dos epitélios escamosos estratificados, apresentando-se principalmente na pele e na mucosa oral. O pênfigo vulgar (PV) é o subtipo mais comum.

O pênfigo vulgar e o pênfigo foliáceo são caracterizados por autoanticorpos na desmogleína (antidesmogleína 3 e, em menor proporção, antidesmogleína 1 no PV; antidesmogleína 1 no PF). Desmogleína 1 e 3 são expressadas na boca e na pele.

Os níveis de distribuição e expressão da desmogleína 1 e da desmogleína 3 podem ser responsáveis pela distribuição e a localização características da doença em pacientes com PV ou PF. Pacientes com PV (isto é, com autoanticorpos antidesmogleína 3) desenvolvem doença da mucosa porque não há expressão suficiente da desmogleína 1 para manter a adesão dos ceratinócitos da mucosa e prevenir erosões orais. Um subconjunto de pacientes com PV não desenvolve doença de pele, pois a expressão proeminente da desmogleína 1 na pele é suficiente para estabilizar a adesão dos ceratinócitos e prevenir a formação de vesículas. No entanto, muitos pacientes com PV desenvolvem autoanticorpos contra a desmogleína 1, o que causa o agravamento da doença de pele.[24] Assim, o perfil de anticorpo subjacente é importante para determinar o fenótipo do PV.

Em pacientes com PF que têm autoanticorpos patológicos de antidesmogleína 1, a boca não é afetada porque a expressão de desmogleína 3 pode manter a adesão dos ceratinócitos da mucosa.

Embora o PV e o PF sejam categorizados como doenças distintas, há evidências de que eles representem um espectro de doenças. Por exemplo, o pênfigo confinado à boca pode se generalizar à pele; menos comumente, há relatos de casos de pacientes com PF clássica que evoluiu para PV. Na teoria, isso pode ser por causa da disseminação de epítopos (epítopo é um local antigênico em uma proteína que estimula uma resposta de anticorpos). Na disseminação de epítopos, o processo autoimune se expande para reconhecer epítopos semelhantes quimicamente ou epítopos semelhantes aos do autoantígeno inicial.[25]

O pênfigo paraneoplásico (PPN) tem uma fisiopatologia mais complexa, mas a presença de autoanticorpos que evitam a adesão de ceratinócitos é semelhante ao PV e PF. O PPN tem componentes de um processo autoimune humoral (ou seja, mediação por anticorpos) e de um processo mediado por células (ou seja, células T citotóxicas predominantes). Isso se reflete pelos achados de doenças semelhantes àqueles encontrados em processos mediados por células T citotóxicas, como eritema multiforme, doença do enxerto contra o hospedeiro e líquen plano, enquanto também têm características clássicas de pênfigo.[26]

Classificação

Não há classificação formal, mas o pênfigo é normalmente classificado em três formas principais.

Pênfigo vulgar[1][3]

  • O pênfigo vulgar é a variante mais comum.

  • Geralmente começa com lesões na mucosa oral (bucal e/ou gengival); erosões dolorosas e persistentes que interferem na alimentação. Menos comumente, são observadas erosões oculares, nasais, laríngeas, esofágicas, genitais e anais.

  • O comprometimento da pele manifesta-se com bolhas flácidas com conteúdo claro. As bolhas se desenvolvem na pele não eritematosa e se transformam com rapidez em erosões pós-bolhosas.

  • As vesículas e erosões podem ser localizadas ou generalizadas e predominam em áreas seborreicas (tórax, face, couro cabeludo, região interescapular) e nos membros.

  • Histologia de rotina demonstra acantólise (perda de adesão célula a célula) superior à membrana basal da pele na porção inferior da epiderme, geralmente com o envolvimento do folículo piloso.

  • Presença de autoanticorpos contra desmogleína 3 (Dsg3) e, em menor grau, a desmogleína 1 (Dsg1).[3]

[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Erosões da mucosa oral em um paciente com pênfigo vulgarImagem cedida pelo Dr Jon Meyerle [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@3cd14a94[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Erosões disseminadas e vesículas intactas dispersas em paciente com pênfigo vulgar generalizadoImagem cedida pelo Dr Jon Meyerle [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@16170f3b

Pênfigo foliáceo[1]

  • Envolvimento cutâneo: vesículas transitórias e flácidas ou erosões em crosta em áreas de pele seborreica (tórax, couro cabeludo, face, região interescapular).

  • Comprometimento mais extenso da pele no pênfigo foliáceo esporádico e endêmico ("fogo selvagem", pênfigo brasileiro, pênfigo tunisiano).

  • Sem comprometimento da mucosa.

  • Às vezes, a histologia de rotina demonstra acantólise no nível da camada celular granular, mas frequentemente o estrato córneo (porção superior da epiderme) é perdido.

  • Presença de autoanticorpos contra a desmogleína 1 (Dsg1).

[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Pênfigo foliáceoImagem cedida pelo Dr Jon Meyerle [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@6108a6ff[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Pênfigo foliáceoImagem cedida pelo Dr Jon Meyerle [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@5bfaf1f6

Pênfigo paraneoplásico[4][5]

  • Apresenta-se no cenário de neoplasia maligna concomitante, particularmente linfoma não Hodgkin, leucemia linfocítica crônica, timoma ou doença de Castleman. A neoplasia maligna subjacente pode não ter sido diagnosticada no momento do diagnóstico.

  • Comprometimento da mucosa: inicialmente queilite limitada e/ou estomatite ulcerativa, erosões dolorosas persistentes que causam disfagia grave. Conjuntivite cicatricial, ceratite e comprometimento genital são comuns. O comprometimento faríngeo é possível; a cavidade nasal e o esôfago também podem ser afetados.

  • Lesões polimórficas cutâneas com sintomas semelhantes aos do líquen plano leve, doença do enxerto contra o hospedeiro, eritema multiforme, penfigoide bolhoso ou erupção semelhante ao pênfigo vulgar. É comum ocorrer envolvimento palmar.

  • O envolvimento pulmonar (alveolite, bronquiolite obliterante, fibrose pulmonar) é uma complicação característica e com risco de vida.

  • Os achados histopatológicos incluem:

    • Acantólise epidérmica, disceratose e alterações de interface vacuolar

    • Deposição intercelular epidérmica de IgG e C3, com ou sem deposição linear na zona da membrana basal, como demonstrado pela coloração de imunofluorescência direta

    • Autoanticorpos séricos no epitélio como demonstrado pela imunofluorescência indireta com tecido murino (bexiga, coração, fígado e língua)

    • Autoanticorpos para várias proteínas citoplasmáticas da família das plaquinas (epiplaquina, plectina, desmoplaquina I, desmoplaquina II, BPAG1 [também conhecida como distonina], envoplaquina e periplaquina).

[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Paciente com pênfigo paraneoplásicoImagem cedida pelo Dr Jon Meyerle [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@5c41959f

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