Abordagem
O diagnóstico da intoxicação por monóxido de carbono (CO) se baseia em um alto índice de suspeita clínica, pois os sintomas variam e podem ser inespecíficos.[1] O diagnóstico consiste em uma "tríade clínica": uma história recente de exposição a CO, a presença de sintomas consistentes com intoxicação por CO e níveis de carboxi-hemoglobina (CO-Hb) arterial ou venosa elevados.[2] Os sintomas de intoxicação aguda não se correlacionam necessariamente com o nível de CO-Hb, particularmente com o tempo após a remoção da fonte ou da oxigenoterapia.[26] É importante estar ciente das fontes comuns de intoxicação por CO, variações sazonais e regionais e fatores de risco para a exposição ao CO.
História
Ao se obter a história, deve-se procurar as fontes comuns de exposição:
Incêndios residenciais
Exposição aos gases de escape do motor de combustão interna de um veículo ou gerador (ato acidental ou intencional de autolesão)
Uso de aquecedores e fogões internos com ventilação inadequada
Fornos com defeito
Exposição a equipamentos pesados operados por propano em trabalhadores de fábricas
Para crianças: andar na traseira de uma caminhonete, principalmente aquelas com uma capota fechada na traseira da caminhonete.
A presença de sintomas em vários habitantes de uma residência deve levantar suspeita de exposição não intencional a uma fonte única de CO.
Os sinais e sintomas da intoxicação por CO podem ser agudos ou crônicos, dependendo da intensidade e da duração da exposição. Deve-se suspeitar de intoxicação aguda por CO em pacientes com: cefaleia (frequentemente do tipo tensional), náuseas, vômitos, vertigem, torpor, tontura, dispneia, taquipneia, dor torácica, confusão, síncope, irritabilidade, diarreia e dor abdominal.[1][27] A intoxicação crônica por CO pode ocorrer durante semanas a meses. Ela frequentemente não é diagnosticada porque as características clínicas são inespecíficas. Essas características clínicas incluem: cefaleia, letargia/cansaço leve, náuseas, problemas de memória, alterações do sono, sintomas tipo gripe, confusão, dores de estômago/dores inespecíficas e dispneia.[27] Os sintomas e sinais podem ser semelhantes aos da intoxicação aguda, mas com um início mais gradual e insidioso.
Exame
Os achados na apresentação podem variar de sintomas leves sem sinais clínicos a comprometimentos neurológicos e cardiovasculares graves.
Os sinais costumam ser decorrentes da hipóxia, e os pacientes podem apresentar taquicardia, hipotensão, isquemia cardíaca, arritmias, vesículas cutâneas e edema pulmonar, o qual pode ter uma etiologia não cardíaca. As outras manifestações clínicas incluem sinais neurológicos que vão da confusão ao coma, convulsões ou síndromes semelhantes a um AVC. A pele vermelho-cereja classicamente descrita, resultante de níveis muito elevados de CO-Hb, é muito raramente observada na prática.[28]
A ataxia troncular é um sinal físico comum naqueles que estão conscientes. Ela pode ser avaliada examinando-se a marcha, a marcha tandem (caminhar com contato calcanhar a dedo para frente e para trás com os olhos abertos e fechados), e o teste de Romberg sensibilizado. Este teste deve ser realizado em um piso duro, de preferência com os pés descalços. Solicita-se que o paciente coloque um pé na frente do outro e cruze os braços sobre o peito com os olhos fechados.[29] Um exame normal consiste em manter a postura ereta por pelo menos 20 segundos.
Investigações
Os pacientes com suspeita de exposição a CO devem ter seu nível de CO-Hb medido por CO-oximetria sanguínea laboratorial (coletada de sangue venoso ou arterial). Geralmente, o resultado é apresentado como um nível de CO-Hb. É importante observar quanto tempo decorreu desde que o paciente deixou o local da exposição ao CO, pois os níveis de CO-Hb podem diminuir com o tempo e o tratamento e podem não refletir a verdadeira gravidade da exposição.[27] No entanto, a CO-Hb é extremamente estável, portanto, se a CO-oximetria não puder ser obtida imediatamente, as amostras de sangue anticoagulado obtidas no momento da apresentação poderão ser analisadas posteriormente, se necessário.
As recomendações dos centros nacionais de intoxicação ou agências governamentais locais devem ser seguidas em relação aos níveis de CO-Hb. Nos EUA, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) sugerem que um nível elevado de CO-Hb de 2% em pessoas que não fumam, e >9% para aqueles que fumam, apoia fortemente um diagnóstico de intoxicação por CO.[27] O CDC afirma ainda que os níveis de CO-Hb não se correlacionam bem com a gravidade da doença, os desfechos ou a resposta à terapia; portanto, para determinar o tipo e a intensidade do tratamento, os sintomas clínicos devem sempre ser cuidadosamente avaliados e uma história detalhada da exposição deve ser obtida.[27]
A CO-oximetria não invasiva com o uso de um oxímetro de pulso específico para CO na ponta do dedo pode diferenciar entre a CO-Hb e a oxi-hemoglobina. A oximetria de pulso convencional não diferencia a oxiemoglobina do complexo CO-Hb, e não deve ser usada como medida da saturação de oxigênio.[4][27] Vários estudos mostram um acordo relativo entre a CO-oximetria não invasiva e a CO-oximetria sanguínea laboratorial; no entanto, com base na falta de estudos com prevalência de intoxicação por CO alta o suficiente nas populações, as diretrizes do American College of Emergency Physicians (ACEP) recomendam que a CO-oximetria não invasiva não seja usada para se fazer um diagnóstico definitivo de intoxicação por CO.[4][30][31][32] No entanto, o CO-oxímetro de pulso pode servir como uma ferramenta útil de rastreamento inicial até que a medição definitiva de uma amostra de sangue esteja disponível.
Para obter um diagnóstico e identificar complicações, devem-se conduzir, em todos os pacientes, as seguintes investigações adicionais:
Eletrocardiograma
Monitoramento cardíaco para disritmias
Glicemia (os desfechos neurológicos após uma intoxicação por CO são piores nos pacientes com hiperglicemia)[33]
Hemograma completo; pode mostrar leucocitose
Ureia e eletrólitos; podem mostrar resultados fora da faixa normal
Creatinina; a lesão renal aguda é uma característica da intoxicação por CO
Níveis de lactato (elevados na intoxicação grave)
Biomarcadores cardíacos (por exemplo, troponinas cardíacas específicas)
Níveis de creatina quinase (em busca de evidências de dano aos músculos esqueléticos).
O seguinte deve ser realizado em alguns pacientes:
Testes neuropsicométricos à beira do leito (para avaliar a função cognitiva na intoxicação por CO e a resposta do paciente ao tratamento).
Testes da função hepática; devem ser considerados nos pacientes com intoxicação grave.
Um teste de gravidez deve ser solicitado para todas as mulheres em idade fértil com suspeita de intoxicação por CO.[27] A exposição ao CO durante a gravidez pode causar danos ao feto.
Exames por imagem
Como a alteração do estado mental e os deficits neurológicos são sintomas comuns de intoxicação por CO, a tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética (RNM) da cabeça geralmente são realizadas em pacientes com intoxicação por CO.[34][35] Os achados mais comuns na RNM são hiperintensidade da substância branca e atrofia hipocampal.[4][36] Os pacientes podem apresentar leucoencefalopatia pós-hipóxica tardia após uma intoxicação por CO. Essa síndrome pode estar associada à hiperintensidades difusas na substância branca cerebral.[34][37] A ecocardiografia ou a RNM cardíaca podem revelar uma anormalidade significativa na função ventricular.[38] Uma radiografia torácica pode ser realizada nos pacientes com intoxicação grave por CO para rastrear para edema pulmonar não cardiogênico.
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