Complicações
A pancreatite após a CPRE é a complicação mais comum do procedimento, e ocorre em 3.5% dos pacientes.[123] Está associada a sexo feminino, idade <65 anos, tempo maior de canulação biliar e esfincterotomia "precut" (ou pré-corte).[124] Geralmente é tratada com analgesia, hidratação intravenosa e suporte nutricional. Supositórios retais de indometacina, administrados imediatamente após a CPRE, podem ajudar a prevenir esta complicação.[105][123][125]
A lesão do ducto biliar é definida como qualquer dano ao ducto biliar, inclusive vazamento de bile, lesão iatrogênica do ducto biliar e estenose biliar. O vazamento de bile ocorre em 0.5% a 1.5% dos pacientes submetidos a colecistectomias laparoscópicas e está associado a morbidade significativa e maior taxa de mortalidade a 1-2 anos, em comparação com pacientes que tiveram cirurgia não complicada.[1][135][136]
Lesões do ducto biliar ocorrem em 0.4% a 1.5% dos pacientes que se submetem a colecistectomia e resultam de trauma cirúrgico direto ou da transecção parcial/completa de ductos biliares decorrente de grampos ou ligaduras.[136] Em curto prazo (agudo ou estado perioperatório), as lesões dos ductos biliares podem causar sangramento ou perfuração e obstrução biliar. Em longo prazo, pode ocorrer estenose do ducto biliar. As estenoses biliares geralmente são preveníveis. O diagnóstico é feito com exames laboratoriais (contagem de leucócitos elevada, bilirrubina, enzima hepática) e exames de imagem (tomografia computadorizada com contraste ou colangiopancreatografia por ressonância magnética), e os pacientes podem desenvolver dor persistente, febre, náuseas e vômitos após a colecistectomia.[1]
Os fatores de risco para lesão do ducto biliar são síndrome de Mirizzi, cálculos retidos no ducto cístico e uma anatomia anormal.[1] Se detectado de forma intraoperatória, o reparo cirúrgico primário pode ser realizado; geralmente as lesões do ducto biliar são tratadas com inserção de endoprótese biliar endoscópica transpapilar, a menos que tenha havido transecção completa.[1] Caso haja biloma concomitante (um acúmulo de bile fora da árvore biliar), a drenagem percutânea também pode ser necessária, e antibióticos devem ser iniciados imediatamente.[136]
A frequência do sangramento como complicação da CPRE com esfincterotomia, e a extração de cálculos varia de 1% a 48%, dependendo da definição aplicada, assim como a magnitude do sangramento (limitado vs. de risco de vida) e se ele ocorreu durante o procedimento.[137]
Os fatores de risco para sangramento pós-esfincterotomia incluem impactação de cálculo na ampola, sangramento durante a esfincterotomia inicial, colangite antes da CPRE, distúrbio da coagulação e hemodiálise recente.[138][139] Essa complicação geralmente é identificada no momento do procedimento e pode ser tratada com técnicas endoscópicas hemostáticas, como injeção de adrenalina.[138]
Se um cálculo biliar perfurar a parede da vesícula biliar, uma fístula colecistoentérica poderá se desenvolver e levar à obstrução da saída gástrica, conhecida como síndrome de Bouveret. Geralmente, ela se manifesta com náuseas, vômitos e dor abdominal, embora possa se manifestar com sintomas de hemorragia digestiva alta, como hematêmese ou melena.[133]
O diagnóstico é feito com uma radiografia abdominal que demonstre obstrução do trato gastrointestinal, ultrassonografia ou tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética.[133] O tratamento para aliviar a obstrução normalmente envolve a extração endoscópica do cálculo, com colocação de endoprótese biliar temporária, ou cirurgia com exploração do ducto colédoco para fechar a fístula. Geralmente, a colecistectomia é justificada para prevenir a recorrência de cálculos.[133][134]
Se um cálculo biliar erodir a parede da vesícula e criar uma fístula colecistoentérica, o cálculo pode passar e levar à obstrução do segmento mais estreito do intestino sadio, frequentemente no íleo terminal.[32] Isso se manifesta com sintomas de obstrução intestinal (náuseas, vômitos, dor em cólica, distensão).[32] A tomografia computadorizada é a modalidade de imagem mais precisa para confirmar o diagnóstico; geralmente, o tratamento é feito com cirurgia.[32]
A colecistite aguda ocorre quando há obstrução do ducto cístico que leva à inflamação da vesícula biliar. Os pacientes geralmente têm dor abdominal intensa, dor constante no quadrante superior direito (às vezes irradiando para o dorso, ombro direito ou tórax), um sinal de Murphy positivo, febre, náuseas, vômitos e leucocitose.[1]
O diagnóstico pode ser feito com base na ultrassonografia abdominal (que demonstra cálculos na vesícula biliar, com sinal de Murphy sonográfico ou espessamento da vesícula biliar).[1] A tomografia computadorizada (TC) pode demonstrar, com precisão, a distensão e o espessamento da vesícula biliar, bem como complicações como fístulas, enfisema na parede da vesícula biliar e perfuração.[1] A precisão da colecintigrafia (varredura com ácido iminodiacético hepatobiliar [HIDA]) para demonstrar ausência de enchimento da vesícula biliar é superior a 90%, embora falso-positivos ocorram nos pacientes em jejum e em unidades de terapia intensiva.[1][126][127] O escaneamento com HIDA só é realizado se a ultrassonografia e a TC não forem diagnósticas, pois a falta de visualização de cálculos biliares e a radiação ionizante tornam esse teste menos favorável.[1]
O tratamento inclui hidratação intravenosa, antibióticos, analgésicos conforme necessário e colecistectomia precoce. Evidências sugerem que a colecistectomia precoce esteja associada a hospitalização mais curta e menor recorrência dos sintomas.[128] Pacientes não elegíveis para cirurgia podem ser tratados com colocação de tubo por colecistostomia percutânea.[1]
A colangite aguda ocorre quando existe obstrução completa do ducto biliar resultando em colestase e bile infectada. A apresentação clássica consiste em dor biliar, icterícia e febre (tríade de Charcot).[1] A hipotensão e a alteração do estado mental também podem estar presentes (pêntade de Reynolds). Leucocitose e testes da função hepática anormais são característicos.[1] A colangite bacteriana deve ser considerada uma emergência médica.
O tratamento inclui hidratação intravenosa, antibióticos de amplo espectro, analgesia e descompressão biliar em 24-48 horas.[1] O método preferido de descompressão biliar é a CPRE com esfincterotomia e extração dos cálculos.[129] A colocação de endoprótese biliar sem remoção de cálculos, drenagem percutânea ou exploração cirúrgica do ducto colédoco são opções alternativas, se a descompressão endoscópica fracassar ou se houver contraindicações a procedimentos endoscópicos, como coagulopatia.[1][31][130] Se a CPRE falhar, pode ser necessária drenagem biliar guiada por ultrassonografia endoscópica, drenagem percutânea ou exploração cirúrgica do ducto colédoco.[131]
Ocorre quando há obstrução do fluxo de saída pancreático ou refluxo da bile no ducto pancreático. Os pacientes geralmente apresentam dor abdominal epigástrica grave com ou sem irradiação para o dorso, náuseas, vômitos e enzimas pancreáticas elevadas.[1]
O diagnóstico é confirmado à ultrassonografia, a qual demonstra dilatação do ducto colédoco, embora seja menos precisa para a detecção de cálculos biliares.[1]
O tratamento envolve hidratação intravenosa agressiva, analgesia e consideração de CPRE com esfincterotomia e extração dos cálculos dentro de 72 horas da internação (para a pancreatite aguda grave, com evidência de obstrução biliar e/ou colangite).[20][31][132] A pancreatite aguda leve requer somente fluidoterapia e cuidados de suporte.
A colecistectomia deve ser oferecida antes da alta do hospital.
A síndrome de Mirizzi ocorre quando um cálculo biliar grande fica preso no ducto cístico e comprime ou causa inflamação no ducto hepático comum, resultando em obstrução biliar e icterícia.[31] É uma complicação incomum da colelitíase e ocorre em 0.18% a 0.35% dos pacientes com colecistectomia nos EUA.[31] Há vários subtipos de síndrome, classificadas pela quantidade do ducto envolvida e pela presença/ausência de uma fístula.[31] Normalmente, a síndrome de Mirizzi é tratada com colecistectomia laparoscópica, embora o procedimento por via aberta seja preferível para determinados subtipos.[1][31]
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