Abordagem
A reposição oral de ácido fólico é a terapia preferencial (porque várias vias eficazes de absorção específica e inespecífica de folato operam em todo o intestino delgado).[55] O ácido fólico é uma forma sintética oxidada de folato.[52] As preparações orais de ácido fólico são estáveis e de baixo custo.[40]
O ácido fólico parenteral pode ser considerado nos estados de má absorção graves. Os pacientes com má absorção hereditária de folato requerem doses altas de ácido fólico, geralmente administradas de maneira parenteral em esquemas especializados.
É importante descartar a deficiência de vitamina B12 (cobalamina), pois iniciar a terapia com o ácido fólico pode mascarar as manifestações neurológicas de uma deficiência de vitamina B12 subjacente.
Nos estados de anemia megaloblástica grave, em que é essencial iniciar a terapia imediatamente, deve-se administrar concomitantemente ácido fólico e vitamina B12. Testes para deficiência de vitamina B12 devem ser solicitados, em associação com aqueles para deficiência de folato. Os resultados dos testes determinam a terapia subsequente.
O ácido folínico, uma forma reduzida de ácido fólico, pode ser convertido em tetraidrofolato biologicamente ativo sem a ação da diidrofolato redutase. Consequentemente, pode ser usado para prevenir a deficiência de folato em pacientes que tomam medicamentos que afetam a enzima diidrofolato redutase, como metotrexato, pirimetamina e trimetoprima.[52]
Deficiência de folato adquirida
Sintomas graves de anemia
A anemia induzida pela deficiência de folato geralmente é bem compensada. Quando a anemia for grave e estiver associada a sintomas de insuficiência cardíaca, deve-se considerar uma transfusão de concentrado de eritrócitos. A transfusão sanguínea deve ser realizada lentamente com o uso de medicamentos diuréticos para evitar uma sobrecarga de volume. A terapia de reposição de ácido fólico deve ser instituída simultaneamente. Os pacientes devem ser monitorados quanto à ocorrência de hipocalemia após a iniciação de terapia com ácido fólico para anemia megaloblástica grave.[61]
Sintomas não graves de anemia
Os pacientes com anemia megaloblástica em decorrência de causas adquiridas da deficiência de folato respondem bem à terapia de reposição de ácido fólico. O ácido fólico por via oral deve ser instituído assim que um diagnóstico de deficiência for confirmado. Em estados de má absorção, o ácido fólico é melhor absorvido que o folato natural (na dieta); por isso, a terapia oral geralmente é adequada para tratar a deficiência. Os achados hematológicos se corrigem depois de aproximadamente 8 semanas.
Outras estratégias de manejo adicionais são essenciais em determinadas condições.
As gestantes e lactantes precisam de doses diárias de ácido fólico.[24] A ingestão diária recomendada (IDR) de folato durante a gestação e a lactação varia de 400-800 microgramas/dia dependendo de fatores como dieta, inclusão de alimentos fortificados com ácido fólico, status socioeconômico e história médica individual. US Department of Agriculture and US Department of Health and Human Services: dietary guidelines for Americans, 2020-2025 Opens in new window NIH: dietary supplement fact sheet - folate Opens in new window
Os estados crônicos de má absorção precisam de suplementação contínua com ácido fólico caso o distúrbio subjacente não seja corrigido completamente.
Os distúrbios hematológicos com aumento da renovação eritrocitária podem precisar de reposição contínua de ácido fólico para atender à demanda crônica; os pacientes que recebem suplementação contínua com ácido fólico precisam ter seus níveis de vitamina B12 monitorados periodicamente para evitar um diagnóstico errado de deficiência de vitamina B12. Faltam ensaios clínicos randomizados de suplementação de ácido fólico no estado hemolítico comum e na doença falciforme.[62]
As modificações nos hábitos alimentares são importantes em determinados grupos de pacientes: os idosos e os grupos de baixa condição socioeconômica precisam modificar seus hábitos alimentares, passando a incluir legumes, vegetais com folhas verde-escuras e frutas.[63] Além disso, o ácido fólico pode ser suplementado por meio de preparados polivitamínicos, ou de programas nacionais de fortificação alimentar que enriquecem com ácido fólico determinados tipos de alimentos, como os cereais.
Pacientes assintomáticos
A terapia com ácido fólico por via oral deve ser instituída para os pacientes assintomáticos com deficiência de folato documentada, com ou sem macrocitose.
Defeitos congênitos do metabolismo do folato
O tratamento de crianças com defeitos congênitos do metabolismo do folato requer doses extremamente altas de ácido fólico que são iniciadas precocemente na primeira infância e frequentemente administradas por via parenteral.[10][40] O objetivo da terapia é manter os níveis de folato no sangue e no líquido cefalorraquidiano.
Erros inatos de metabolismo do folato requerem abordagens de tratamento diferentes:
A má absorção hereditária de folato, causada por mutações no transportador de folato acoplado a prótons, é tratada com injeções diárias de ácido folínico (folinato de cálcio).
A deficiência grave de metilenotetraidrofolato redutase, o distúrbio mais comum do metabolismo do folato, é tratada com betaína (um substrato da betaína homocisteína metiltransferase que catalisa a conversão de homocisteína para metionina sem precisar de folato ou vitamina B12). Além disso, foram feitas tentativas com ácido fólico, cianocobalamina, riboflavina, metionina, piridoxina e levocarnitina.[10]
A deficiência de glutamato formiminotransferase é tratada com ácido fólico associado a metionina.[64][65]
Evidências anedóticas sugerem que a deficiência de diidrofolato redutase pode responder ao ácido folínico (folinato de cálcio).[66]
A deficiência de transporte cerebral de folato é caracterizada pela diminuição do transporte de folato através da barreira hematoencefálica. Geralmente, ela é causada por anticorpos contra proteínas do receptor de folato, que transporta folato para o sistema nervoso central (SNC). Vários transtornos neuropsiquiátricos resultam da diminuição do transporte de folato ao cérebro, mas podem responder ao tratamento com ácido folínico (que leva o folato ao SNC por meio de uma proteína transportadora de folato reduzido).[67][68]
Manejo de distúrbios subjacentes
É essencial realizar a avaliação e o tratamento dos distúrbios subjacentes para evitar e tratar os estados continuados de deficiência. As perdas constantes de folato podem requerer reposição contínua (por exemplo, a anemia hemolítica crônica e a dermatite esfoliativa exigem suplementação diária e contínua de ácido fólico). Os estados de má absorção exigem correção do distúrbio subjacente e de suplementação vitamínica. A deficiência de folato em decorrência de determinados medicamentos pode requerer modificação na terapia medicamentosa.
Monitoramento da resposta à terapia
A resposta dos reticulócitos a 1 semana e a normalização da contagem sanguínea em 8 semanas após o início da terapia são parâmetros úteis para se monitorar a resposta ao tratamento. O monitoramento do nível sérico de folato tem pouco valor. Os níveis de homocisteína diminuem em alguns dias após o início da terapia, e podem ser usados para avaliar a resposta ao tratamento.
A contagem de reticulócitos pode ser avaliada ao final da primeira semana de terapia.[40] Aumento no nível de hemoglobina e reticulocitose de 7 a 10 dias após o início do tratamento sugerem uma resposta positiva.[40]
O volume corpuscular médio (VCM) pode aumentar durante os primeiros dias de tratamento, possivelmente devido à reticulocitose.[69] À medida que os eritrócitos normocíticos substituem os macrócitos, o VCM se reduz para a faixa normal, geralmente cerca de 8 semanas após o início do tratamento.[70][71]
A hipersegmentação dos neutrófilos pode persistir durante as 2 primeiras semanas de terapia, mas a contagem plaquetária e dos leucócitos aumentam na primeira semana de terapia.
Em pacientes com perdas contínuas, pode-se considerar um monitoramento periódico do folato sérico.
Com risco de deficiência de folato
A suplementação com ácido fólico pode prevenir a deficiência de folato em estados de aumento de demanda (por exemplo, gravidez e lactação) e em condições com má absorção (por exemplo, doença celíaca) ou perda de folato (por exemplo, distúrbio hemolítico crônico).
Há evidências conclusivas de que o uso de suplementação com ácido fólico pré-concepção e durante a gravidez reduz a incidência de defeitos do tubo neural (DTNs) fetais.[15][31][43] Estudos de base populacional sugerem que fetos/bebês do sexo feminino podem obter maiores benefícios (taxa de diminuição de DTNs) da suplementação de ácido fólico materno do que os do sexo masculino.[72][73]
A suplementação contínua de ácido fólico além do primeiro trimestre até o final da gravidez pode conferir benefícios ao neurodesenvolvimento.[74] São necessários estudos clínicos randomizados adicionais.
Gestação e lactação
As diretrizes recomendam a suplementação de ácido fólico pré-concepção em doses de 400-800 microgramas/dia para a prevenção de DTNs fetais em mulheres que planejem conceber ou sejam capazes de engravidar.[32][33][34] Doses mais altas (até 4 mg/dia) são recomendadas para determinados grupos de risco. O National Institute for Health and Care Excellence do Reino Unido recomenda 5 mg/dia em certos grupos de risco.[35][36] As diretrizes canadenses usam a seguinte estratificação de risco para mulheres suscetíveis a defeito do tubo neural (DTN) fetal ou outra anomalia congênita sensível ao ácido fólico:[32]
Baixo risco: sem história pessoal ou familiar de defeito do tubo neural fetal ou anomalias congênitas relacionadas ao folato
Risco médio: história familiar de defeito do tubo neural fetal; história pessoal da paciente ou do parceiro do sexo masculino de anomalia congênita relacionada ao folato; ou história pessoal de diabetes, medicação teratogênica ou má absorção da paciente
Alto risco: história pessoal de defeito do tubo neural fetal da paciente ou do seu parceiro do sexo masculino; ou filho anterior com defeito do tubo neural.
Nos Estados Unidos, a IDR de folato durante a gestação e a lactação varia de 400-800 microgramas/dia dependendo de fatores como dieta, inclusão de alimentos fortificados com ácido fólico, status socioeconômico e história médica individual. US Department of Agriculture and US Department of Health and Human Services: dietary guidelines for Americans, 2020-2025 Opens in new window NIH: dietary supplement fact sheet - folate Opens in new window
A Organização Mundial da Saúde recomenda um nível de folato eritrocitário >906 nmol/L (400 nanogramas/mL) em mulheres de idade reprodutiva.[44]
Dados de ensaios clínicos randomizados sugerem que o nível de folato plasmático em 25.5 nanomoles/L (11 nanogramas/mL) corresponde ao nível de folato eritrocitário recomendado (≥906 nanomoles/L [≥400 nanogramas/mL]) na maioria das situações.[45] São necessários níveis mais altos de folato plasmático (34.6 nmol/L [15 nanogramas/mL]) em mulheres com deficiência de vitamina B12 (cobalamina).
Para proteção máxima contra defeitos do tubo neural fetal, o nível de folato na contagem eritrocitária calculada ideal é de 1000-1300 nmol/L (442-574 nanogramas/mL) ao final das primeiras 4 semanas de gestação, quando o fechamento do tubo neural é atingido.[46]
A US Preventive Services Task Force recomenda que o período crítico para iniciar a suplementação seja de pelo menos 1 mês antes da concepção.[33]
Mulheres em idade reprodutiva (sem fortificação de folato), randomizadas para suplementação de folato a 800 microgramas/dia, tiveram maior probabilidade de alcançar as concentrações desejadas de folato eritrocitário (≥906 nanomoles/L [≥400 nanogramas/mL]) após 4 semanas comparadas a mulheres que receberam 400 microgramas/dia.[47] Foram relatados resultados similares em um período de 8 semanas.
As evidências sugerem que a suplementação de ácido fólico durante a gravidez reduz a anemia megaloblástica nas mães. Embora não haja evidências conclusivas de que a suplementação evite nascimento prematuro, natimorto, mortalidade neonatal ou aborto espontâneo, os dados do estudo Screening for Pregnancy Endpoints (SCOPE) indicam que a suplementação de ácido fólico durante a gravidez está associada a um menor risco de bebês pequenos para a idade gestacional, sem aumentar o risco de bebês grandes para a idade gestacional.[48][49][50] [
]
Em países de baixa e média renda, a suplementação materna de múltiplos micronutrientes com ferro e ácido fólico reduz o número de crianças nascidas com baixo peso ao nascer.[51]
Má absorção e perda de folato
A correção de uma causa subjacente e/ou a suplementação com ácido fólico pode prevenir a deficiência de folato em pacientes com distúrbios de má absorção, como espru tropical e doença celíaca (espru não tropical).
O aumento da perda de folato ocorre em pacientes com distúrbio hemolítico crônico (em virtude do aumento da renovação celular) e naqueles submetidos a diálise crônica (por causa da perda de ácido fólico no fluido de diálise). A suplementação diária com ácido fólico pode ser necessária nesses pacientes para prevenir a deficiência de folato.
Os pacientes que tomam medicamentos que interferem na absorção e no metabolismo do folato podem necessitar de suplementação com ácido folínico oral ou parenteral para prevenir a deficiência de folato. O ácido folínico, uma forma reduzida de ácido fólico, pode ser convertido em tetraidrofolato biologicamente ativo sem a ação da diidrofolato redutase, que é inibida por medicamentos como metotrexato, pirimetamina e trimetoprima.[52] A suplementação de ácido folínico pode reduzir o risco de hepatotoxicidade e efeitos colaterais gastrointestinais em pacientes com artrite reumatoide.[53] Em alguns casos, nos quais um medicamento apresentou redução da eficácia quando administrado com ácido folínico, pode ser necessária uma mudança para outro medicamento.
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