Abordagem

As metas principais do tratamento são o controle da infecção e a redução dos sintomas. A decisão sobre tratar o paciente de modo empírico ou internar o paciente para tratamento com antibiótico intravenoso deve se basear nos sintomas e nas comorbidades do paciente.

Esquema de tratamento

As indicações para internação incluem:

  • Incapacidade de manter hidratação oral ou adesão ao esquema medicamentoso

  • Hipotensão

  • Vômitos

  • Desidratação

  • Sepse

  • Leucocitose

  • Pacientes com temperatura de 39.0 °C (>102.2 °F)

  • Pacientes gravemente doentes com acentuada debilidade ou várias comorbidades

  • Gestação

  • Incerteza sobre o diagnóstico.

Os pacientes idosos e imunocomprometidos, que correm o risco de doença mais grave, também são geralmente internados.

Opções de antibióticos empíricos

O tratamento deve ser iniciado antes do recebimento dos resultados da hemocultura e da cultura de urina nos pacientes com alta suspeita de infecção para evitar a deterioração do paciente. A escolha de antibióticos empíricos deve se basear na gravidade da doença, na história de uso prévio de antibióticos, nas suscetibilidades bacterianas locais e nos fatores de risco para resistência.​[35][49][50]

Há crescente resistência aos antibióticos orais atualmente recomendados para o tratamento empírico da pielonefrite não complicada; eles incluem as fluoroquinolonas e as cefalosporinas orais.​[35][51]​​​[52]​ No entanto, uma revisão sistemática que avaliou a eficácia das cefalosporinas para o tratamento da pielonefrite aguda não complicada de 2010 a 2022 mostrou que a cefalosporina continua a ser uma opção de tratamento efetiva e não inferior às fuoroquinolonas ou a sulfametoxazol/trimetoprima.[51]

Como as altas concentrações de medicamento na medula renal estão mais fortemente correlacionadas à cura que os níveis séricos ou urinários de medicamento, agentes como aminoglicosídeos e fluoroquinolonas, os quais atingem altos níveis no tecido renal, podem ser preferíveis aos antibióticos betalactâmicos.[53] É recomendada a prescrição de posologia reduzida de gentamicina em pacientes com diminuição da função renal. A suscetibilidade antimicrobiana de uropatógenos na comunidade também orientará as decisões do tratamento.

Os antibióticos fluoroquinolonas sistêmicos podem causar eventos adversos graves, incapacitantes e potencialmente duradouros ou irreversíveis. Isso inclui, mas não está limitado a: tendinopatia/ruptura de tendão; neuropatia periférica; artropatia/artralgia; aneurisma e dissecção da aorta; regurgitação da valva cardíaca; disglicemia; e efeitos no sistema nervoso central, incluindo convulsões, depressão, psicose e pensamentos e comportamento suicida.[54]

  • Restrições de prescrição aplicam-se ao uso de fluoroquinolonas e essas restrições podem variar entre os países. Em geral, o uso de fluoroquinolonas deve ser restrito apenas em infecções bacterianas graves e de risco de vida. Algumas agências regulatórias também podem recomendar que eles sejam usados apenas em situações em que outros antibióticos comumente recomendados para a infecção sejam inadequados (por exemplo, resistência, contraindicações, falha do tratamento, indisponibilidade).

  • Consulte as diretrizes e a fonte de informações de medicamentos locais para obter mais informações sobre adequação, contraindicações e precauções.

Pielonefrite leve a moderada e não complicada

Esses pacientes são capazes de tomar medicamentos por via oral e estão hemodinamicamente estáveis. Os outros parâmetros laboratoriais estão basicamente normais. O tratamento é feito com antibióticos orais. Os esquemas de antibioticoterapia possíveis incluem as fluoroquinolonas, as cefalosporinas e as sulfonamidas.​[35][51][55][56]​​​​​​ Até 10-14 dias de tratamento ambulatorial com antibióticos orais geralmente são suficientes nos casos leves.​[35]​ Ciclos de agentes altamente ativos (por exemplo, fluoroquinolonas) por apenas 5-7 dias podem ser suficientes para os casos leves ou moderados nas regiões onde a resistência às fluoroquinolonas for <10%.[35][57][58]​​ Se os perfis locais de sensibilidade bacteriana não forem conhecidos, ou nas regiões onde a resistência às fluoroquinolonas for >10%, uma dose intravenosa única de um antimicrobiano de ação prolongada, como a ceftriaxona, ou uma dose de 24 horas consolidada de um aminoglicosídeo, pode ser considerada no início da terapia.​[35]​ Orientações do American College of Physicians recomendam um tratamento de curta duração com antibióticos (5-7 dias) com uma fluoroquinolona em homens ou mulheres não gestantes com pielonefrite não complicada, ou 14 dias de sulfametoxazol/trimetoprima, dependendo da susceptibilidade antibiótica.[56] Não são necessárias as culturas de urina pós-tratamento de rotina em pacientes assintomáticos.

Pielonefrite grave ou complicada

Os pacientes com pielonefrite e com sintomas de gravidade (febre >39.0 °C [102.2° F], incapazes de tomar medicamentos por via oral, com depleção de volume, parâmetros hemodinâmicos precoces sépticos e outros parâmetros laboratoriais anormais), doença complicada e/ou todas as pacientes gestantes devem ser internados e tratados com agentes intravenosos.[10][59][60]​​​​ Os pacientes idosos e imunocomprometidos, que têm risco de doença mais grave, também são geralmente internados. Devem ser realizadas a hemoculturas e a urocultura. A escolha do esquema antibiótico deve se basear nos resultados das culturas quando disponíveis, e nos padrões de resistência locais. O tratamento não deve ser adiado enquanto se aguardarem os resultados das culturas, mas a terapia deve ser ajustada onde necessário, quando disponíveis.[10]​ Os possíveis esquemas incluem uma fluoroquinolona (por exemplo, ciprofloxacino, levofloxacino), uma cefalosporina de espectro estendido (por exemplo, ceftriaxona), um aminoglicosídeo (por exemplo, gentamicina) com ou sem ampicilina (se enterococcus estiver sendo considerado) ou um betalactâmico de espectro estendido (por exemplo, ceftolozana/tazobactam, ceftazidima/avibactam, piperacilina/tazobactam, imipeném/cilastatina, imipeném/cilastatina/relebactam).[10][35][50]​​​​

As infecções com resistência antimicrobiana (RAM) que causam pielonefrite grave e complicada estão aumetando. Isso inclui infecções causadas por Enterobacterales produtoras de betalactamase de espectro estendido (BLEE), e Pseudomonas aeruginosa com resistência de difícil tratamento (P aeruginosa DTR).[50][61]​​​​​​ Os pacientes com sepse ou risco de infecção com um organismo BLEE podem ser considerados para tratamento empírico com betalactâmicos de espectro estendido. Ele pode ser ajustado à medida que os dados de suscetibilidade se tornarem disponíveis.[11]​ Por exemplo, é provável que a ceftolozana/tazobactam seja efetiva contra BLEE, mas estudos recentes sugerem reservá-lo para o tratamento de P aeruginosa DTR ou infecções polimicrobianas (por exemplo, P aeruginosa DTR e BLEE).[50]​ A European Association of Urology sugere o uso das fluoroquinolonas apenas em circunstâncias limitadas (por exemplo, quando a resistência na comunidade for <10% e o paciente tiver contraindicação para uma cefalosporina de terceira geração ou aminoglicosídeo) e desaconselha o seu uso em pacientes internados em uma ala de urologia, ou que tiverem recebido fluoroquinolonas nos 6 meses anteriores, devido ao alto risco de resistência.[35]

Tradicionalmente, o tratamento consistia em antibióticos intravenosos por 6 semanas. Estudos posteriores mostraram que um curso terapêutico de 2 semanas, geralmente, era suficiente para a cura bacteriológica e a melhora dos sintomas.[62][63]​​ Um estudo randomizado de não inferioridade mostrou que a suspensão dos antibióticos não fluoroquinolonas efetivos após uma melhora clínica no dia 7 não foi inferior à continuação do tratamento até o dia 14 em pacientes selecionados com pielonefrite aguda que necessitam de hospitalização.[64]​ No entanto, outros estudos e revisões sistemáticas que avaliaram evidências para os tratamentos antibióticos de curta versus longa duração revelaram resultados conflitantes, e ensaios clínicos de alta qualidade que avaliem estratégias para encurtar a duração do tratamento antibiótico para infecção bacteriana em cenários secundários devem ser uma prioridade agora.[65][66]​​​ A transição para a terapia oral pode ser considerada quando a suscetibilidade a um agente oral apropriado for demonstrada, e o paciente apresentar melhora clínica e estiver hemodinamicamente estável.[50][60][67]

As complicações adicionais observadas na pielonefrite aguda incluem obstrução que necessite de cateterismo, sepse, insuficiência renal, formação de abscesso e falha do antibiótico. Uroculturas de acompanhamento são recomendadas várias semanas após a conclusão do tratamento, para documentar a cura bacteriológica.

Gestação

Constatou-se que as gestantes que apresentam bacteriúria assintomática no rastreamento devem ser tratadas para garantir a erradicação das bactérias.[10][35][59][68]​​ No entanto, há alguma incerteza quanto à duração mais efetiva do tratamento antibiótico. [ Cochrane Clinical Answers logo ] ​​[Evidência C]​​ O American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) recomenda um ciclo de 5 a 7 dias de antibióticos direcionados para tratar a bacteriúria assintomática na gestação com contagens de colônias de 100,000 UFC/mL ou mais.[10]

Para as pacientes gestantes com pielonefrite aguda, o ACOG recomenda um ciclo de antibioticoterapia de 14 dias, mas com a melhora clínica as pacientes podem fazer a transição dos antibióticos intravenosos para uma terapia oral apropriada para completá-lo. O tratamento antimicrobiano de primeira linha inclui um betalactâmico de amplo espectro, considerando-se a adição de um aminoglicosídeo (por exemplo, ampicilina associada a gentamicina) ou uma dose única de cefalosporina (por exemplo, ceftriaxona). Para as pacientes com alergia à penicilina, o aztreonam é uma escolha adequada.[10]​ As taxas de cura são elevadas para as gestantes tratadas com antibióticos; entretanto, a pielonefrite recorrente ocorre em até 25% das pacientes grávidas antes do parto.[10][69]​ Uma urocultura deve ser obtida após a conclusão dos antibióticos, para garantir que não haja infecção residual.[10]

Doença recorrente

A recorrência geralmente ocorre em 1-2 semanas. A causa mais provável da recorrência é uma duração insuficiente do tratamento inicial. As outras possibilidades incluem o desenvolvimento de resistência antibiótica ou a seleção de outro organismo. É indicada a repetição dos testes da urocultura e de suscetibilidade antimicrobiana. Se, na repetição da cultura, a cepa bacteriana e o perfil de suscetibilidade forem iguais, deve-se considerar a existência de um fator complicador.[35] Uma ultrassonografia renal ou tomografia computadorizada deve ser obtida para avaliar qualquer patologia geniturinária funcional que interfira no tratamento. A repetição do tratamento pode ser um curso terapêutico mais longo com o mesmo antibiótico usado na terapia inicial ou um tratamento com um antibiótico diferente.

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