Abordagem

O tratamento da diverticulite é determinado pelos sintomas de apresentação, pela situação clínica e pela presença de complicações que requeiram investigação e tratamento adicionais, incluindo abscesso, obstrução, perfuração e fístulas. A presença de complicações pode ser determinada pela tomografia computadorizada inicial e justifica consultas cirúrgicas.

Os pacientes com suspeita de diverticulite aguda complicada devem ser tratados com antibióticos intravenosos. Sinais de sepse devem ser procurados ativamente e tratados prontamente, se presentes. Os pacientes com diverticulite aguda não complicada podem precisar de antibióticos orais se estiverem sistemicamente enfermos, apresentarem sinais de inflamação sistêmica, estiverem imunossuprimidos ou apresentarem comorbidades significativas.​[7]​ Se o paciente estiver sistemicamente bem e com sintomas leves, uma analgesia simples pode ser um tratamento adequado para a diverticulite não complicada.

A diverticulose assintomática descoberta incidentalmente não requer tratamento, embora os pacientes devam ser encorajados a fazer mudanças alimentares e no estilo de vida, como abandonar o hábito de fumar e perder peso se estiverem com sobrepeso ou obesos, pois estes são fatores de risco para a diverticulite.[3]

Diverticulose assintomática

A diverticulose é a presença de divertículos sem sintomas.[1] A diverticulose assintomática descoberta acidentalmente não requer tratamento.[1]

Há evidências de que esses pacientes podem se beneficiar com o aumento das fibras alimentares, incluindo frutas e vegetais, o que pode reduzir o risco de evolução para diverticulite.[41][42]​​[43][59][60]​​​ Os pacientes devem ser orientados a manter uma dieta saudável e equilibrada.[1] Nos pacientes com dieta com baixo teor de fibras e constipação, é aconselhável aumentar a ingestão de fibras gradualmente para minimizar a flatulência e a distensão abdominal, e garantir um consumo adequado de líquidos.[1] Não há necessidade de os pacientes evitarem sementes, nozes, pipoca ou cascas de frutas.

Os pacientes devem ser aconselhados a abandonar o hábito de fumar e a perder peso se estiverem com sobrepeso ou obesos, pois estes são fatores de risco para diverticulite.​[3][7]

Diverticulite aguda não complicada

A diverticulite aguda não complicada indica inflamação aguda de um divertículo ou divertículos, sem abscesso, flegmão, obstrução, perfuração, estenose ou fístulas.

Os principais objetivos do tratamento da diverticulite aguda não complicada incluem a resolução da inflamação aguda e a prevenção de complicações. A maioria dos pacientes pode ser tratada no cenário ambulatorial.[45]

Para os pacientes com sintomas leves, a analgesia pode ser um tratamento adequado. Recomenda-se uma analgesia simples, como paracetamol, com orientação de retorno caso os sintomas se agravem.[1]​ Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e analgésicos opioides devem ser evitados, pois estão associados ao risco de perfuração diverticular (embora os opioides possam ser administrados para as dores intensas em um ambiente hospitalar).

Os antibióticos podem não ser necessários se um paciente com diverticulite aguda não complicada estiver sistemicamente bem.​[7]​​[43][45][61]​​​​​​ Antibióticos orais são indicados se o paciente estiver sistemicamente enfermo (por exemplo, febre), apresentar sinais de inflamação sistêmica (por exemplo, proteína C-reativa >140 mg/L [>14 mg/dL] ou contagem leucocitária basal >15 x 10⁹), estiver imunossuprimido ou apresentar comorbidades significativas.​[7][43]​​ Ao selecionar a classe de antibióticos, siga o protocolo local ou procure orientação da equipe de infectologia. Os exemplos de esquemas antibióticos adequados podem incluir amoxicilina/ácido clavulânico, ou ciprofloxacino associado a metronidazol.[43][45]

Os pacientes tratados com antibióticos orais podem ser tratados com segurança em domicílio, desde que estejam clinicamente estáveis e sejam capazes de tolerar a ingestão oral.[45][62][63][64][65][66]​​​​​​​ Entretanto, se os sintomas persistirem ou se agravarem, o paciente deve ser hospitalizado e receber antibióticos intravenosos até a melhora clínica - consulte a seção Diverticulite aguda complicada, abaixo.[67]

Metanálises de estudos comparando o tratamento antibiótico com a ausência de tratamento antibiótico revelaram que tratar e monitorar a diverticulite não complicada com ou sem antibióticos é seguro e efetivo, e que o manejo observacional não foi estatisticamente diferente do tratamento com antibióticos para o desfecho primário de necessidade de cirurgia.[68][69][70]​​​ Uma revisão Cochrane sobre diverticulite não complicada revelou que o efeito dos antibióticos é incerto para as complicações (precoces e de longo prazo, cirurgia de emergência, recorrência e ressecção eletiva do cólon).​ [ Cochrane Clinical Answers logo ] ​​ Uma revisão sistemática de estudos comparando o tratamento antibiótico com a ausência de tratamento antibiótico em pacientes com diverticulite não complicada não encontrou diferença nos riscos de falha do tratamento, cirurgia eletiva, recorrência e complicações pós-tratamento.[71]

As diretrizes do National Institute for Health and Care Excellence (NICE) do Reino Unido, da American Gastroenterological Association (AGA), da American Society of Colon and Rectal Surgeons (ASCRS), do American College of Physicians (ACP) e da World Society of Emergency Surgery (WSES) recomendam que os antibióticos sejam usados seletivamente, em vez de rotineiramente, nos pacientes imunocompetentes com diverticulite aguda não complicada que estiverem sistemicamente bem e saudáveis.​[3][7][37][43][45]​​​[72][73][74]

Os antibióticos fluoroquinolonas sistêmicos, como o ciprofloxacino, podem causar eventos adversos graves, incapacitantes e potencialmente duradouros ou irreversíveis. Isso inclui, mas não está limitado a: tendinopatia/ruptura de tendão; neuropatia periférica; artropatia/artralgia; aneurisma e dissecção da aorta; regurgitação de valva cardíaca; disglicemia; e efeitos sobre o sistema nervoso central, incluindo convulsões, depressão, psicose e pensamentos e comportamento suicidas.[75]

  • Restrições de prescrição aplicam-se ao uso das fluoroquinolonas, e essas restrições podem variar entre os países. Em geral, o uso das fluoroquinolonas deve ser restrito apenas nas infecções bacterianas graves e com risco à vida. Algumas agências regulatórias também podem recomendar que eles sejam usados apenas em situações em que outros antibióticos comumente recomendados para a infecção sejam inadequados (por exemplo, resistência, contraindicações, falha do tratamento, indisponibilidade).

  • Consulte as diretrizes e a fonte de informações de medicamentos locais para obter mais informações sobre adequação, contraindicações e precauções.

Durante a fase aguda da diverticulite não complicada, recomenda-se uma dieta líquida sem resíduos.[43]​ À medida que os sintomas melhoram, a dieta pode progredir; manter uma dieta saudável e equilibrada com cereais integrais, frutas e vegetais é importante para prevenir o risco de recorrência.​[43]

Diverticulite aguda complicada

As complicações que requerem investigação e tratamento adicionais incluem abscesso, flegmão, obstrução, perfuração, estenose e fístulas. A presença de complicações pode ser determinada pela tomografia computadorizada (TC) inicial e justifica o apoio cirúrgico. A intervenção cirúrgica também pode ser considerada para diverticulite indolente (inflamação que persiste por semanas a meses e pode ser detectada em exames de imagem) sem resposta clínica ao tratamento clínico adequado.

Os pacientes com suspeita de diverticulite aguda complicada devem ser internados para tratamento.

A - antibióticos

  • Os pacientes com diverticulite aguda complicada suspeitada ou confirmada devem ser tratados com antibióticos intravenosos.[1]

  • Siga o protocolo local ou peça orientação à equipe de infectologia ao selecionar os antibióticos.​[7]​ Os exemplos de esquemas adequados incluem ceftriaxona associada a metronidazol, ou piperacilina/tazobactam.[20]

  • Todos os antibióticos devem ser revisados após 48 horas, e deve-se considerar a redução para antibióticos orais adequados.[1]

  • Sinais de sepse devem ser procurados ativamente e tratados prontamente, se presentes. Consulte Sepse em adultos.

Analgesia

  • Recomenda-se um analgésico simples como o paracetamol.[1] Em geral, os opioides e os AINEs devem ser evitados, pois estão associados ao risco de perfuração diverticular.[1] Entretanto, para o alívio de dores intensas, a analgesia pode ser aumentada usando-se tramadol (um opioide fraco) e, se necessário, um opioide mais potente (por exemplo, morfina) de forma titulada.[1]

Jejum/dieta líquida

  • Os pacientes com peritonite localizada ou generalizada devem passar por um período de jejum rigoroso. Isso pode progredir para uma dieta líquida sem resíduos quando houver melhora clínica adequada.

  • À medida que os sintomas melhoram, a dieta pode progredir; manter uma dieta saudável e equilibrada com cereais integrais, frutas e vegetais é importante para prevenir o risco de recorrência.[43]

Drenagem de abscesso

  • Um abscesso >3 cm de diâmetro deve ser drenado sob orientação de TC ou ultrassonografia; a cirurgia é necessária se o abscesso diverticular não se resolver com esse procedimento.​[3][5][7]​​[76]​​​​​

  • A TC do abdome e da pelve com contraste intravenoso é o exame de imagem de escolha para a drenagem percutânea de abscessos. As amostras de pus devem ser enviadas para microbiologia para avaliar a sensibilidade aos antibióticos.​[76] Podem ser necessários exames de imagem adicionais se o paciente não melhorar, ou piorar.[1]

  • Um abscesso localizado <3 cm de diâmetro não justifica uma drenagem e pode ser tratado com antibióticos, apenas.​​[2][3][7][77]​​

  • Nos pacientes com um abscesso >3 cm, os antibióticos intravenosos devem ser mantidos até se completar um ciclo de 7 a 10 dias, dependendo da recuperação clínica. Para os pacientes com abscessos <3 cm, pode ser possível trocar para os antibióticos orais mais cedo.[1]

Tratando a perfuração intestinal ou estenose/fístula

  • Nos pacientes com perfuração diverticular com peritonite generalizada, deve-se considerar uma lavagem laparoscópica ou a colectomia.[1]​ Os riscos e benefícios de cada procedimento devem ser discutidos com o paciente.[1]

  • A lavagem laparoscópica precoce pode ser usada como estratégia cirúrgica para a diverticulite aguda (graus I, II e III de Hinchey; para obter detalhes da classificação de Hinchey, consulte Etiologia), e quando o tratamento clínico e a drenagem percutânea não conseguirem conter a sepse.[78][79][80][81][82]​​ No entanto, há evidências de que a lavagem laparoscópica para a diverticulite de grau III de Hinchey não controla totalmente a fonte de infecção e está associada a uma maior taxa de re-intervenção.[83]​ Se uma peritonite fecal for identificada durante a laparoscopia, a colectomia deverá ser realizada.[1]

  • Para os pacientes com peritonite grave ou difusa, pode ser necessária uma colectomia de emergência, um procedimento de Hartmann (ressecção do intestino com um estoma terminal), ou uma colectomia com anastomose primária (junção intestinal).[84][85]​ O National Institute for Health and Care Excellence do Reino Unido recomenda a anastomose primária com ou sem ostomia ou o procedimento de Hartmann.[1] Para pacientes selecionados (até Hinchey IV), e dependendo da expertise cirúrgica, uma colectomia laparoscópica com anastomose primária e/ou um procedimento laparoscópico de Hartmann é segura e pode melhorar os desfechos pós-operatórios.[86][87][88]​​​​

  • O tratamento da diverticulite complicada por estenose ou fístula é a colectomia por abordagens de via aberta ou laparoscópica, pois não há uma função para o manejo conservador.

Cirurgia eletiva para a diverticulite recorrente

Os critérios para recomendar a colectomia eletiva para doença recorrente não estão bem definidos e não devem ser baseados somente no número de ataques anteriores.[43] Qualquer decisão deve ser tomada de forma individual, dependendo da idade, da frequência e da gravidade dos sintomas recorrentes, das complicações anteriores, comorbidades e preferências e valores do paciente.​[3][43][89][90]​​​​​ A ressecção eletiva geralmente deve ser considerada após o tratamento não cirúrgico bem-sucedido de um abscesso diverticular, ou nos pacientes com sintomas persistentes devidos a obstrução, estenose ou fístula, ou nos pacientes imunocomprometidos.​​[3][7]​​​ A tomada de decisão compartilhada é recomendada de acordo com as preferências do paciente.[91][92]

No caso de cirurgia eletiva, a ressecção cólica laparoscópica é possível e segura; ela pode acelerar a recuperação pós-operatória e apresenta menos complicações pós-operatórias que a cirurgia convencional, incluindo infecções no local cirúrgico.[93][94][95] A administração profilática de antibióticos orais 1 dia antes da cirurgia reduz a incidência de infecção do sítio cirúrgico, sem preparação intestinal mecânica, nesses pacientes.[96]

Os aminossalicilatos ou os antibióticos não são recomendados para prevenir a diverticulite aguda recorrente.[64]

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