Abordagem
A história característica e os achados no exame físico geralmente são suficientes para diagnosticar a doença. Outras investigações são desnecessárias na avaliação inicial.
História
A constipação (dificuldade, atraso ou sofrimento na defecação) pode estar presente em 3 estágios da infância: em lactentes na introdução de alimentos sólidos, em crianças pequenas adquirindo habilidades no uso do vaso sanitário e em idade escolar.[7]
Os sintomas variam de leve e de curta duração a graves e crônicos, e são algumas vezes acompanhados de impactação fecal, incontinência fecal e urinária, infecção do trato urinário (ITU) e, ocasionalmente, dor abdominal. Geralmente, a história da doença revela início de defecação dolorosa com aumento dos intervalos entre as defecações em bebês e crianças pequenas (1-2 anos de idade), com aumento da retenção ativa frequentemente atingindo a intensidade máxima na faixa etária de 2 a 3 anos.
Em pacientes idosos, a dor abdominal pode estar relacionada com a síndrome do intestino irritável, que inclui constipação e desconforto abdominal. Na síndrome do intestino irritável, a dor nem sempre é aliviada com a eliminação das fezes.[15]
A recusa para usar o vaso sanitário é um elemento fundamental em crianças de 3 a 4 anos de idade. A retenção fecal com transbordamento, muitas vezes aliviada temporariamente pela passagem de fezes muito grandes (que bloqueiam o vaso sanitário), é típica de crianças acima dessa idade. Com o aumento da idade, as fezes impactadas no megarreto raramente, ou nunca, são eliminadas; por isso, a incontinência fecal por transbordamento é a queixa predominante.
Os pais ou cuidadores da criança devem relatar qualquer alteração alimentar, pois isso pode sugerir alergia alimentar ou intolerância como causa.[15] Outros fatores podem estar associados com o início da constipação, como treinamento esfincteriano, introdução de alimentos sólidos, início recente na escola e estressores sociais, que também devem ser investigados.[4][15]
A escala de fezes de Bristol ilustra a consistência de diferentes tipos de fezes e pode ser um recurso útil na anamnese do paciente.
[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Escala de fezes de BristolWikimedia Commons; Creative Commons Attribution-Share Alike 3.0 Unported [Citation ends].
Exame físico
A inspeção do ânus na primeira infância pode revelar posição ou aparência anormal (isto é, ectópico ou coberto). Em qualquer idade, o ânus pode mostrar evidências de fissura como uma causa de defecação dolorosa ou eritema intenso, característico de infecção por estreptococos. Fissuras que se estendem além do canal anal e que não são restritas à posição anterior ou posterior imediata e lacerações ou hematomas devem levantar suspeita de abuso sexual infantil.
A inspeção do abdome pode revelar uma distensão abdominal leve ou baixa proveniente da sobrecarga do megarreto ou de uma bexiga aumentada, como evidências do ato de evitar o banheiro. A palpação do abdome em crianças constipadas revela uma massa central surgindo desde a pelve até, frequentemente, acima do umbigo. Entretanto, fezes que foram amolecidas com eficácia por medicamentos podem ser impossíveis de sentir e, portanto, esse sinal de retenção pode não ser detectado. O abdome também pode ser sensível à palpação, com retenção de fezes significativa. Para a constipação sem etiologia subjacente, geralmente a criança está saudável, apesar do apetite diminuído ser comum em crianças que apresentam carregamento de fezes significativo. Em alguns casos de constipação grave, a criança pode apresentar vômitos quando há impactação retal.
A medição de altura, peso e perímetro cefálico deve ser realizada, pois parâmetros de crescimento anormais podem indicar causa orgânica (por exemplo, hipotireoidismo ou fibrose cística).[15]
Um exame neurológico completo deve ser realizado, incluindo exame da coluna lombar e reflexos profundos tendinosos, para avaliar a causa neuropática da constipação, inclusive síndrome da medula presa.
Outros testes
Investigações adicionais podem ser necessárias em crianças com sinais ou sintomas de alerta. Eles incluem achados abdominais no exame neurológico (por exemplo, redução dos reflexos ou tônus dos membros inferiores), parâmetros anormais de crescimento, distensão abdominal grave e história de diarreia intermitente e fezes explosivas. Recomenda-se o encaminhamento a um gastroenterologista pediátrico nestes casos.[15]
Embora não sejam rotineiramente usadas, a radiografia abdominal (após ingestão de marcadores radiopacos do trânsito intestinal) e a ultrassonografia abdominal são testes que podem ser utilizados para confirmar o diagnóstico ou para acompanhar a evolução do paciente.[34] A radiografia abdominal também pode ser útil se o exame retal for necessário, mas não desejável (por exemplo, em criança com história de abuso), para avaliar a carga de fezes ou para fins de monitoramento pós-tratamento.[15]
O enema com contraste é útil para avaliar o diâmetro retal e investigar a presença de impactação fecal. Também pode ajudar a descartar anormalidades anatômicas, como intussuscepção da mucosa, volvo de sigmoide e úlcera retal solitária.[35][36]
A biópsia retal por sucção e a manometria anorretal podem ser usadas para excluir a possibilidade de doença de Hirschsprung.
A ausência de contrações propulsivas de alta amplitude na manometria colônica pode ser útil na identificação dos pacientes com constipação refratária aos medicamentos e que possam se beneficiar da intervenção cirúrgica.
A avaliação psicológica pode ser usada para orientar o manejo eficaz, especialmente em casos com forte componente comportamental ou com ansiedade como fator contribuinte.
Uma revisão encontrou evidências insuficientes para uma associação diagnóstica entre sintomas clínicos de constipação e carga fecal na radiografia abdominal, tempo de trânsito cólico e ultrassonografia retal, mas esses testes podem ser úteis em situações específicas.[37]
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