Etiologia

A hiperglicemia é considerada o principal fator etiológico na retinopatia diabética. Ela afeta a vasculatura retiniana e os elementos neurais da retina.

A retina tem duas circulações: a vasculatura retiniana que irriga a retina interna e a irrigação coroide da retina externa. O diabetes afeta principalmente a retina interna, e suas manifestações clínicas são aparentes como alterações na vasculatura retiniana, inicialmente nos capilares e depois nas veias.

A hiperglicemia resulta em alterações em:

  • Composição do sangue, incluindo aumento da viscosidade, redução da capacidade de deformação dos leucócitos e alterações na atividade de pró-coagulantes, antifibrinolíticos e agregação plaquetária[15][16][17]

  • Paredes vasculares, incluindo perda da natureza normalmente antitrombogênica do revestimento endotelial dos vasos sanguíneos retinianos.[18]

  • Fluxo sanguíneo como resultado da leucostase, formação de microtrombos, oclusão vascular e perda da capacidade de autorregulação da retina.[19]

A hiperglicemia pode danificar diretamente as células ganglionares retinianas, conforme sugerido por alterações neurodegenerativas estruturais e funcionais na retina antes do desenvolvimento dos sinais clínicos da retinopatia diabética.[20][21][22][23][24]

Foi constatado que os fatores genéticos representam 25% a 50% do risco individual de desenvolvimento de retinopatia grave em estudos de agregação familiar e com gêmeos.[25][26] Foram identificados potenciais genes candidatos à suscetibilidade a retinopatia.[27]

Fisiopatologia

Alterações microvasculares retinianas

A retinopatia diabética precoce é caracterizada por apoptose de pericitos retinianos e células endoteliais vasculares, possivelmente como resultado de hiperglicemia, associada ao espessamento da membrana basal endotelial vascular.[28][29]​ Essas alterações causam oclusão capilar e isquemia, com up-regulation do fator de crescimento endotelial vascular (VEGF).[30][31]​ O VEGF, por meio da fosforilação de junções oclusivas das células endoteliais e ruptura da barreira hematorretiniana interna, promove maior permeabilidade vascular e estimula a proliferação de células endoteliais.[32][33]​ A angiopoietina 2, que bloqueia o receptor endotelial de tirosina quinase Tie2, também pode contribuir para o aumento da permeabilidade vascular.[34]

O ranibizumabe, o bevacizumabe e o aflibercepte, que se ligam ao VEGF, são a base do tratamento atual para o edema macular diabético.[35]​ Um estudo de 2021 também sugere melhora na gravidade da retinopatia nas retinopatias diabéticas proliferativa e não proliferativa grave.[36]​ O faricimabe, um anticorpo monoclonal biespecífico, se liga ao VEGF e à angiopoietina-2 e demonstra ser promissor no manejo do edema macular diabético.[37]

Inflamação

A retinopatia diabética está associada à inflamação crônica de baixo grau. Moléculas de adesão, como ICAM-1, promovem a ligação de leucócitos e endotélio e a leucostase.[38]​ Citocinas inflamatórias estimulam a atração, ativação e migração intrarretiniana de leucócitos.[39][40]​ A liberação adicional de citocinas dos leucócitos estimula a liberação de espécies reativas de oxigênio e aumenta a permeabilidade vascular, além de ampliar a resposta.[41]​ Acredita-se que as células gliais retinianas iniciem e aumentem a inflamação.[42]​ O VEGF também é pró-inflamatório.[43]

A dexametasona intravítrea e a fluocinolona acetonida, por meio da ação anti-inflamatória e da down-regulation do VEGF, são efetivas no tratamento do edema macular diabético.[44][45]

Neurodegeneração

Em pacientes com diabetes, há up-regulation de moléculas pró-apoptóticas nas células ganglionares retinianas.[46]​ O estresse oxidativo também pode contribuir para a apoptose neural retiniana.[47]

[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética não proliferativa: anormalidade microvascular intrarretiniana (AMIR; seta verde), "rosário" venoso e segmentação (seta azul), aglomerado hemorrágico (círculo vermelho), retina sem características observáveis indicando ausência de perfusão capilar (elipse branca)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@6f80184e[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética não proliferativa com edema macular: exsudato (seta amarela)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@65c05e25[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética não proliferativa com edema macular: retina espessada (elipse branca), exsudato (seta amarela)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@5c0b68[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética não proliferativa com edema macular: mancha branca do tipo "bolas de algodão" (seta branca), retina espessada (círculo branco)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@7bea303b[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética proliferativa: vasos novos no disco óptico (seta vermelha), anormalidade microvascular intrarretiniana (AMIR; seta verde), manchas brancas do tipo "bolas de algodão" (seta branca), "rosário" venoso e segmentação (retângulo vermelho), retina sem características observáveis indicando ausência de perfusão capilar (elipse branca)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@18ab5ce6[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética não proliferativa com edema macular: hemorragia na camada de fibras nervosas (seta azul), exsudato (seta amarela)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@54d34f89[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética proliferativa: novos vasos no disco óptico (círculo vermelho)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@7117701a[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética proliferativa: hemorragia vítrea extensa, obstruindo a maior parte do fundo (círculo branco)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@19d102f1[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Retinopatia diabética proliferativa: tração no sentido do disco óptico e consequente descolamento total da retina (seta branca)Cortesia do Acervo Fotográfico do Moorfields; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@542b8b56

Classificação

Os dois mecanismos pelos quais a doença retiniana diabética causa danos à visão são:

  1. Evolução da retinopatia para formação de novos vasos, hemorragia vítrea e perda grave da visão (tratada principalmente com laser). O risco é definido pela escala de gravidade da retinopatia abaixo.

  2. Edema macular diabético com perda moderada da visão (tratada principalmente com injeções de anti-VEGF intravítreas). O risco é estabelecido pela definição de edema macular diabético abaixo:

Escala de gravidade clínica internacional proposta para a retinopatia diabética[1]

A lista a seguir mostra como a gravidade da retinopatia corresponde aos sinais observados na fundoscopia dilatada:

  • Ausência de retinopatia aparente: ausência de anormalidades

  • Retinopatia diabética não proliferativa (RDNP) leve: apenas microaneurismas

  • RDNP moderada: mais sinais que apenas microaneurismas, mas menos que na RDNP grave

  • RDNP grave: ausência de sinais indicativos de retinopatia proliferativa, juntamente com qualquer um dos itens a seguir: mais de 20 hemorragias intrarretinianas em cada um dos quatro quadrantes; "rosário" venoso definido em dois ou mais quadrantes; anormalidades microvasculares intrarretinianas proeminentes em um ou mais quadrantes

  • Retinopatia diabética proliferativa: um ou mais dos seguintes fatores: neovascularização, hemorragia vítrea/pré-retiniana.

Considera-se que os pacientes com hemorragia vítrea não transparente ou descolamento por tração macular têm retinopatia proliferativa avançada. Considera-se que os pacientes com neovascularização da íris têm retinopatia proliferativa.

Classificação do edema macular diabético[2]

Com base da tomografia de coerência óptica, determine se há presença de edema macular (espessura do subcampo central acima de 300 micrômetros) e, se houver, verifique se envolve ou não o centro e, em seguida, subclassifique de acordo com a acuidade visual:

  • Edema macular diabético sem envolvimento do centro (EMDSEC)

  • Edema macular diabético com envolvimento do centro (EMDCEC): o aumento da espessura da mácula central de 1 mm foi considerado a causa da perda visual.

Subclassificação de acuidade visual (AV):

  • AV melhor que 6/9

  • AV 6/9 a 6/18

  • AV 6/18 a 6/96.

Classificação que combina edema macular e gravidade da retinopatia

  • Retinopatia não proliferativa leve a moderada

    • Ausência de EMD3

    • EMDSEC

    • EMDCEC com AV melhor que 6/9

    • EMDCEC com AV de 6/9 a 6/18

    • EMDCEC com AV de 6/18 a 6/96

  • Retinopatia diabética não proliferativa grave

    • Ausência de EMD3

    • EMDSEC

    • EMDCEC com AV melhor que 6/9

    • EMDCEC com AV de 6/9 a 6/18

    • EMDCEC com AV de 6/18 a 6/96

  • Retinopatia proliferativa

    • Ausência de EMD3

    • EMDSEC

    • EMDCEC com AV melhor que 6/9

    • EMDCEC com AV de 6/9 a 6/18

    • EMDCEC com AV de 6/18 a 6/96

  • Neovascularização da íris

  • Retinopatia diabética proliferativa avançada.

Escala usada para o rastreamento na atenção primária do Reino Unido

No National Diabetic Retinopathy Screening Programme do Reino Unido, a escala internacional de gravidade da retinopatia é reduzida a:[3]

  • R0 - ausência de retinopatia

  • R1 - retinopatia diabética não proliferativa leve/moderada

  • R2 - retinopatia diabética não proliferativa grave

  • R3 - retinopatia diabética proliferativa.

No National Diabetic Retinopathy Screening Programme do Reino Unido, é usada a seguinte definição de edema macular (M1):

  • Exsudato dentro de um diâmetro de disco do centro da fóvea, OU

  • Circinado ou grupo de exsudatos na mácula, OU

  • Qualquer microaneurisma ou hemorragia dentro de um diâmetro de disco do centro da fóvea, se associado com acuidade visual com melhor correção de menos de 6/12.

Caso esses critérios não sejam atendidos, o grau M0 é usado.

Os graus podem ser combinados para retinopatia e edema macular: por exemplo, lado direito R2 M0 e lado esquerdo R3 M1.

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