Avaliação e manejo do risco cardiovascular perioperatório para cirurgias não cardíacas

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Todos os anos, aproximadamente 50 milhões de pacientes se submetem a uma cirurgia não cardíaca nos EUA.[1]​ Destes, cerca de 750 em cada 100,000 pessoas sofrem um infarto do miocárdio (IAM) não fatal perioperatório. Eventos cardiovasculares e cerebrovasculares graves fatais ocorrem em cerca de 1.67% dos casos.[1]​ A maior parte da morbidade e da mortalidade cardíaca perioperatória está relacionada a IAM, insuficiência cardíaca, choque cardiogênico ou arritmias.[1]

Múltiplos fatores de risco cardiovascular estão presentes em 45% dos pacientes cirúrgicos internados com idade ≥45 anos.[2]​ À medida que a população global envelhece, pode-se esperar que o número de pacientes com risco cardíaco perioperatório significativo submetidos a cirurgias não cardíacas aumente.

A avaliação do risco cardíaco pré-operatório e o manejo perioperatório enfatizam a detecção, a caracterização e o manejo dos distúrbios cardíacos nos pacientes apropriados. Os pacientes com doença arterial coronariana (DAC) conhecida ou suspeitada, arritmias, história de insuficiência cardíaca ou presença de sintomas consistentes com essas condições também devem ser avaliados. Nas pessoas com ≥45, uma história e exame físico mais extensivos são necessários.

A finalidade da avaliação do risco cardíaco pré-operatório individual é:[2][3]​​[4][5]

  • Avaliar o estado médico do paciente e os riscos cardíacos impostos pela cirurgia não cardíaca planejada

  • Recomendar estratégias apropriadas para reduzir o risco de problemas cardíacos ao longo do período perioperatório e melhorar os desfechos cardíacos em longo prazo.

Os principais objetivos gerais da avaliação são:

  • Identificar os pacientes com risco aumentado de um evento adverso cardíaco perioperatório (por exemplo, morte cardiovascular, insuficiência cardíaca aguda, IAM ou arritmia hemodinamicamente relevante)

  • Identificar pacientes com prognóstico desfavorável em longo prazo em decorrência de doença cardiovascular. Mesmo que o risco no momento da cirurgia não cardíaca possa não ser proibitivo, o tratamento adequado afetará o prognóstico em longo prazo.

A natureza da avaliação deve ser individualizada para o paciente e o cenário clínico específico.

  • Pacientes que se apresentarem com uma emergência cirúrgica aguda precisam apenas de uma rápida avaliação pré-operatória, com o manejo subsequente orientado a prevenir ou minimizar a morbidade cardíaca e a morte. Esses pacientes frequentemente podem ser avaliados mais detalhadamente após a cirurgia.

  • Pacientes submetidos a um procedimento eletivo sem urgência cirúrgica podem passar por uma avaliação pré-operatória mais detalhada.

Os pacientes têm um maior risco de eventos cardíacos perioperatórios nos primeiros 30 dias após a cirurgia, mas o risco permanece elevado por cerca de 5 meses.[5]

Considere oito passos para otimizar os desfechos perioperatórios:[6]

1. Avaliar as características clínicas

  • A história e o exame físico devem ajudar a identificar marcadores de risco cardíaco e avaliar o estado cardíaco do paciente.

  • As condições cardíacas de alto risco incluem infarto do miocárdio (IAM) recente, insuficiência cardíaca descompensada, angina instável, arritmias sintomáticas e valvopatia cardíaca sintomática.[7]

2. Avaliar o estado funcional

  • Pacientes capazes de se exercitar regularmente, sem limitações, geralmente têm uma reserva cardiovascular suficiente para suportar cirurgias estressantes.

3. Considerar o risco específico da cirurgia

  • O tipo de cirurgia tem implicações importantes para o risco perioperatório. A cirurgia não cardíaca pode ser estratificada nas categorias de alto risco, risco intermediário e baixo risco (veja abaixo "estratificação do risco de acordo com o tipo de cirurgia não cardíaca").

4. Decidir se é necessária uma avaliação não invasiva mais detalhada

  • Pacientes em baixo risco cardíaco com base nas características clínicas e no estado funcional, e que serão submetidos à cirurgia de baixo risco, geralmente não precisam de uma avaliação mais detalhada.

  • Pacientes em risco cardíaco elevado com base nas características clínicas, com estado funcional desfavorável e que estejam sendo considerados para uma cirurgia não cardíaca de alto risco podem se beneficiar de uma avaliação mais detalhada.

5. Decidir quando recomendar uma avaliação invasiva

  • As indicações para a angiografia coronariana pré-operatória são semelhantes às do cenário não cirúrgico e incluem pacientes com evidências de risco cardíaco elevado com base em exames não invasivos, angina sem resposta à terapia medicamentosa adequada, angina instável e cirurgia não cardíaca proposta de risco intermediário ou alto depois de resultados duvidosos dos exames não invasivos.

  • A angiografia e a revascularização não são indicadas de maneira rotineira para os pacientes com doença arterial coronariana (DAC) estável.

6. Otimize os fatores de risco cardiovascular, as intervenções de estilo de vida e a terapia medicamentosa

  • O controle dos fatores de risco cardiovascular, incluindo a hipertensão, a dislipidemia e o diabetes, é importante antes de uma cirurgia não cardíaca.[3]​ Consulte Hipertensão essencial, Hipercolesterolemia e Diabetes mellitus do tipo 2 em adultos.

  • Os pacientes deverão receber a terapia medicamentosa ideal no período perioperatório e em longo prazo, com base na condição cardíaca subjacente.

  • Alterações no estilo de vida antes de uma cirurgia não cardíaca podem reduzir o risco de complicações perioperatórias, mas seu impacto sobre as complicações cardiovasculares não foi adequadamente estudado. O abandono do hábito de fumar antes da cirurgia tem a base de evidências mais robusta.[3][8]​ Consulte Abandono do hábito de fumar.

7. Realizar a vigilância perioperatória adequada

  • Em pacientes com DAC conhecida ou suspeita, a possibilidade de IAM ou isquemia perioperatória pode ser estimada com base na magnitude da elevação de biomarcadores, em novas anormalidades eletrocardiográficas, na instabilidade hemodinâmica e na qualidade e intensidade da dor torácica ou outros sintomas.

8. Planejar a terapia máxima em longo prazo

  • A avaliação para hipercolesterolemia, tabagismo, hipertensão, diabetes mellitus, sedentarismo, doença vascular periférica, sopros cardíacos, arritmias, anormalidades de condução e/ou isquemia perioperatória pode resultar em avaliações e tratamentos que reduzam o futuro risco cardiovascular.

A anamnese do paciente deve ser abrangente e ter como objetivo:

  • Identificar condições cardíacas (por exemplo, infarto do miocárdio recente ou prévio, insuficiência cardíaca descompensada, angina instável prévia, arritmias significativas, valvopatia cardíaca)

  • Identificar comorbidades clínicas graves (por exemplo, diabetes mellitus, doença vascular periférica, acidente vascular cerebral [AVC], insuficiência renal, doença pulmonar)

  • Determinar a capacidade funcional do paciente

  • Documentar todos os medicamentos em uso, alergias, uso de tabaco e álcool, e hábitos de vida (incluindo dieta e exercícios físicos).

No exame físico, os pacientes devem ser avaliados quanto a sinais clínicos sugestivos de distúrbios cardíacos, incluindo: pressão venosa jugular elevada, sopros cardíacos e edema periférico e pulmonar.[9]

Já se demonstrou que a capacidade funcional do paciente para realizar atividades comuns do cotidiano tem uma boa correlação com a captação máxima de oxigênio no teste ergométrico.[2] O equivalente metabólico de uma tarefa (EMDT) é um conceito fisiológico que expressa o custo energético de uma atividade física. Os valores de referência para EMDT são mostrados abaixo. À avaliação, os pacientes com EMDT <4 são considerados como tendo baixa capacidade funcional e apresentam risco relativamente elevado de um evento adverso cardíaco perioperatório, enquanto os pacientes com EMDT >10 têm excelente capacidade funcional e um risco muito baixo de tais eventos adversos, mesmo que tenham doença arterial coronariana conhecida. Os pacientes com uma capacidade funcional de 4 a 6 EMTDs ou 7 a 10 EMTDs são considerados como tendo capacidade funcional moderada ou boa, respectivamente, e geralmente são considerados como tendo baixo risco de eventos adversos cardíacos perioperatórios.[10]

1 EMDT

  • Comer, vestir-se, usar o banheiro

  • Caminhar dentro de casa

  • Caminhar em superfície plana a 3.2 km (2 milhas) por hora

  • Realizar tarefas domésticas leves, como lavar a louça.

4 EMDTs

  • Subir um lance de escadas (geralmente 18-21 degraus)

  • Caminhar em superfície plana a 6.4 km (4 milhas) por hora

  • Correr distâncias curtas

  • Passar o aspirador de pó ou levantar móveis pesados

  • Jogar golfe ou tênis em dupla.

>10 EMDTs

  • Nadar

  • Tênis individual

  • Basquete

  • Esquiar.

Vários modelos de predição de risco foram desenvolvidos com base em dados de grandes coortes. Calculadoras de risco podem ser usadas como complemento ou alternativa à avaliação de fatores de risco relacionados ao paciente e à cirurgia. Não há dados para apoiar o uso de um índice de risco em detrimento dos outros; alguns comumente usados são:[2]

Índice de risco cardíaco revisado (IRCR)

O índice de risco cardíaco revisado usa 6 variáveis para prever o risco cardiovascular perioperatório:[11]

  • Cirurgia de alto risco (intratorácica, intra-abdominal ou vascular suprainguinal)

  • Cardiopatia isquêmica (definida como uma história de infarto do miocárdio [IAM], ondas Q patológicas no ECG, uso de nitratos, teste ergométrico anormal ou dor torácica secundária a causas isquêmicas)

  • Presença de insuficiência cardíaca congestiva

  • História de doença cerebrovascular

  • Diabetes mellitus que requer insulinoterapia

  • Nível de creatinina sérica pré-operatório superior a 2 mg/dL.

A cada uma das 6 variáveis de risco é atribuído 1 ponto. Aos pacientes com 0, 1 ou 2 fatores de risco são atribuídas as classes I, II e III do RCRI, respectivamente. Os pacientes com 3 ou mais fatores de risco estão na classe IV, e são considerados de alto risco. Cada classe representa os riscos de 0.4% (classe I), 0.9% (classe II), 6.6% (classe III) e 11% (classe IV) para eventos cardíacos importantes. Em geral, o RCRI realiza bem a função de estratificar pacientes como sendo de baixo risco quando comparados com os de alto risco para todos os tipos de cirurgia não cardíaca, mas parece menos preciso nos pacientes submetidos a cirurgias vasculares.

Programa Nacional de Melhora da Qualidade Cirúrgica do American College of Surgeons (NSQIP-ACS)

Uma calculadora de risco cirúrgico foi desenvolvida pelo NSQIP do ACS com o uso de 21 fatores pré-operatórios.[12]​ Esses fatores incluem 20 características do paciente (idade, sexo, classe funcional, caso de emergência, classe da American Society of Anaesthesiologists, uso de corticosteroide, presença de ascite dentro de 30 dias, sepse sistêmica, dependência ventilatória, presença de câncer disseminado, diabetes mellitus, hipertensão, insuficiência cardíaca dentro de 30 dias, presença de dispneia, status de tabagismo, história de DPOC grave, necessidade de diálise, presença de insuficiência renal aguda, altura e peso) e o tipo de procedimento. Este modelo apresentou um excelente desempenho para mortalidade (estatística-c = 0.944; escore de Brier = 0.011 [onde escores próximos a 0 são melhores]), morbidade (estatística-c = 0.816; escore de Brier = 0.069), e 6 complicações adicionais (estatística-c >0.8).[12]​ A calculadora de risco cirúrgico do NSQIP do ACS oferece aos cirurgiões a capacidade de estimar rápida e facilmente os riscos pós-operatórios importantes específicos do paciente e apresentar as informações em um formato acessível ao paciente.

Grupo de estudo vascular do índice de risco cardíaco da Nova Inglaterra (VSG-IRC)

O índice de risco do VSG-IRC foi desenvolvido para pacientes submetidos à cirurgia vascular e é aplicável a endarterectomia carotídea, bypass dos membros inferiores e reparo aberto e endovascular de aneurismas não rotos da aorta abdominal.[13] Os preditores independentes de eventos cardíacos adversos (IAM, arritmia e insuficiência cardíaca, mas não mortalidade) foram avanço da idade, tabagismo, diabetes mellitus insulinodependente, doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca coronariana, teste de esforço anormal, terapia de longo prazo com betabloqueadores, doença pulmonar obstrutiva crônica e creatinina ≥160 micromoles/L (≥1.8 mg/dL). A revascularização cardíaca prévia ofereceu proteção. O VSG-IRC previu aumento dos níveis de risco para eventos cardíacos, variando de 2.6% para os escores de risco mais baixo (0-3) a 14.3% para os escores de risco mais alto (7-8). Esse índice de risco funciona melhor que o RCRI para as pessoas submetidas a cirurgias vasculares.[13]

A cirurgia não cardíaca pode ser estratificada de acordo com o tipo de cirurgia, nas categorias de risco alto, intermediário ou baixo.[2]

Cirurgia de alto risco

  • Suprainguinal

  • Vascular

  • Torácico

  • Transplante

  • Neurocirurgia

Cirurgia de risco intermediário

  • Geral

  • Otorrinolaringologia

  • Geniturinária

  • Ortopédica

Cirurgia de baixo risco

  • Endócrina

  • Ginecologia

  • Obstétrica

  • Mama

Os pacientes com risco de um evento adverso cardíaco perioperatório são normalmente identificados após a anamnese e o exame físico. Os pacientes de baixo risco geralmente não necessitam de exames adicionais antes de uma cirurgia não cardíaca. Entretanto, os pacientes de risco intermediário ou alto submetidos a uma cirurgia eletiva não cardíaca podem necessitar de exames pré-operatórios adicionais.

Exames laboratoriais padrão

  • Exames laboratoriais padrão, como hemograma completo e função renal, são recomendados nos pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas de risco intermediário ou alto.[3]

ECG de 12 derivações em repouso

  • Recomendado para os pacientes:[2][3]

    • Com ≥65 anos de idade

    • Com doença coronariana conhecida, arritmias significativas, outras cardiopatias estruturais significativas, fatores de risco ou sintomas de doença cardiovascular (DCV), doença arterial periférica ou doença cerebrovascular, que estiverem sendo submetidos a procedimentos cirúrgicos de risco intermediário ou alto

    • Com história familiar de cardiomiopatia genética submetendo-se a qualquer cirurgia não cardíaca, independentemente da idade ou dos sintomas.

Biomarcadores

  • Peptídeo natriurético do tipo B ou fragmento N-terminal do peptídeo natriurético tipo B (PNB/NT-proPNB)

    • O PNB parece ser independentemente preditivo de eventos cardíacos adversos significativos após cirurgia vascular eletiva.[14]

    • O uso do PNB para prever eventos cardiovasculares nos primeiros 30 dias após a cirurgia vascular pode melhorar significativamente o desempenho preditivo do índice de risco cardíaco revisado.[15]

    • Indicado em pacientes com doença cardiovascular, fatores de risco cardiovascular (inclusive idade ≥65 anos) ou sintomas que sugiram doença cardiovascular antes de uma cirurgia não cardíaca de risco intermediário ou alto.[3]

  • Troponina cardíaca de alta sensibilidade T/I (hs-cTn T/I)

    • Pode ser usada para descartar isquemia miocárdica antes de uma cirurgia não cardíaca e como parte da vigilância após a cirurgia.[3]

    • Indicado em pacientes com doença cardiovascular, fatores de risco cardiovascular (inclusive idade ≥65 anos) ou sintomas que sugiram doença cardiovascular antes de uma cirurgia não cardíaca de risco intermediário ou alto.[3]

Ecocardiografia

  • A avaliação pré-operatória não invasiva da função ventricular esquerda (VE) com ecocardiografia transtorácica (ETT) é razoável ou recomendada para os pacientes com:[2]​​

    • Dispneia nova

    • Suspeita de disfunção ventricular nova ou em piora

    • Sinais clínicos de insuficiência cardíaca (IC)

    • IC conhecida com agravamento da dispneia ou outra alteração no estado clínico

  • As outras indicações para ETT incluem os pacientes com:[3]

    • Baixa capacidade funcional e/ou NT-proPNB/PNB alto

    • Sopros detectados antes de uma cirurgia não cardíaca de alto risco

    • Suspeita de doença cardiovascular nova ou sinais ou sintomas inexplicados antes de uma cirurgia não cardíaca de alto risco

    • Baixa capacidade funcional, ECG anormal, NT-proPNB/PNB alto ou ≥1 fator de risco clínico antes de uma cirurgia não cardíaca de risco intermediário

    • História familiar de cardiomiopatia genética

Prova de esforço

  • Usada para detectar isquemia miocárdica induzível.

  • Pode ser considerada nos pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas de risco elevado (isto é, risco alto ou intermediário), com capacidade funcional baixa ou desconhecida e com maior risco de eventos adversos cardíacos perioperatórios.[2]

  • A escolha do teste ergométrico (isto é, exercício vs. teste farmacológico) geralmente se baseia nas preferências do médico e do paciente, bem como em fatores do paciente.

  • Geralmente ela é evitada nos pacientes com síndromes instáveis, incluindo síndrome coronariana aguda, IC descompensada e estenose aórtica.

Angiotomografia coronária (ATC)

  • Pode ser considerada para detectar uma anatomia coronária de alto risco nos pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas de alto risco, com capacidade funcional baixa ou desconhecida e com maior risco de eventos adversos cardíacos perioperatórios.[2]

Angiografia coronariana

  • Indicada em pacientes com:

    • Evidência de risco cardíaco elevado, com base em exames não invasivos ou ATC

    • Angina sem resposta à terapia medicamentosa adequada ou angina instável

    • Proposta de cirurgia não cardíaca de risco intermediário ou alto depois de resultados duvidosos nos exames não invasivos

  • Contraindicada em pacientes com angina estável.[7][16]

1. Eletrocardiograma de esforço

Estratificação do risco perioperatório baseada no eletrocardiograma de esforço:

  • Baixo risco: capacidade de exercitar-se moderadamente (4-5 equivalentes metabólicos de tarefas [EMDTs]) sem sintomas; pacientes que podem atingir >75% da frequência cardíaca máxima predita sem alterações no eletrocardiograma (ECG).

  • Risco intermediário: pacientes com resposta anormal no ECG a >75% da frequência cardíaca predita.

  • Alto risco: pacientes com resposta anormal no ECG em <75% da frequência cardíaca predita.

2. Exames de imagem sob estresse

Estratificação do risco cardíaco perioperatório com baseada nos exames de imagem sob estresse:

  • Mais de 4 segmentos miocárdicos de redistribuição indicam um risco significativo de eventos adversos cardíacos perioperatórios.

  • A redistribuição em 3 territórios de artérias coronárias e a dilatação reversível da cavidade ventricular esquerda indicam um risco mais alto de eventos.

  • A área total de isquemia é mais preditiva que a gravidade da isquemia em um determinado segmento.

A terapia perioperatória pode incluir:

  • Revascularização pré-operatória com enxerto coronariano ou intervenção coronária percutânea

  • Betabloqueadores

  • Estatinas

  • Suspensão temporária de outros medicamentos (por exemplo, inibidores da proteína cotransportadora de sódio e glicose 2 [SGLT2], anticoagulantes)

Revascularização coronária antes de cirurgia não cardíaca[2]

  • Recomendada nos pacientes com síndromes coronarianas agudas submetidos a uma cirurgia eletiva não cardíaca, com adiamento da cirurgia

  • Pode ser razoável nos pacientes com doença coronariana crônica e estenose hemodinamicamente significativa do tronco da coronária esquerda ≥50% submetidos a uma cirurgia não cardíaca eletiva, com adiamento da cirurgia

  • Não recomendada nos pacientes com doença de tronco coronário não esquerdo submetidos a uma cirurgia não cardíaca

Um stent coronário é usado na maioria dos procedimentos de revascularização percutânea. Nesse caso, o adiamento da cirurgia não cardíaca pode ser benéfico. A cirurgia eletiva não cardíaca não é recomendada em até 30 dias após o implante de um stent coronário metálico ou em até 6 a 12 meses após o implante de um stent coronário farmacológico.[2] O risco adicional de cirurgia não cardíaca sobre eventos cardíacos adversos entre pacientes pós-colocação de stent é maior nos primeiros 6 meses após implantação de stent, estabilizando-se em 1.0% após 6 meses. Cirurgia eletiva, de alto risco em pacientes hospitalizados e os pacientes com um stent farmacológico, são os que mais se beneficiam de um atraso de 6 meses após a colocação de stent.[17]

Nos pacientes submetidos a uma angioplastia com balão somente, sem colocação de stent coronário, a cirurgia não cardíaca deve, idealmente, ser adiada por pelo menos 14 dias após o procedimento.[2]

Betabloqueadores

  • O uso perioperatório de betabloqueadores durante as cirurgias não cardíacas pode ser benéfico na redução do risco de infarto do miocárdio (IAM) não fatal. No entanto, seu uso também foi associado ao aumento do risco de eventos adversos, incluindo hipotensão, bradicardia, AVC e morte.[18]

  • Os betabloqueadores devem ser mantidos nos pacientes que já estiverem tomando doses estáveis de um betabloqueador.[2][3][8]

  • Nos pacientes nos quais uma nova terapia com betabloqueadores for indicada e iniciada, pode ser razoável iniciar os betabloqueadores perioperatórios com antecedência suficiente para avaliar a segurança, a tolerabilidade e a necessidade de ajuste da dose, de preferência ≥7 dias antes da cirurgia. Os betabloqueadores não devem ser iniciados no dia da cirurgia.[2]

Estatinas

  • As evidências disponíveis sugerem que pode haver um efeito protetor do uso de estatinas perioperatórias sobre as complicações cardíacas, como o IAM, durante as cirurgias não cardíacas.​[19]​ Entretanto, o benefício do uso rotineiro da terapia com estatinas permanece incerto.

  • A terapia deve ser mantida nos pacientes que já estiverem tomando estatinas e que forem ser submetidos a uma cirurgia não cardíaca.[2][3][8]

  • É recomendado iniciar uma estatina durante o período perioperatório nos pacientes adultos que atenderem aos critérios com base na história de doença cardiovascular (DCV) aterosclerótica ou risco de DCV em 10 anos.[2]

Considere uma suspensão temporária dos outros medicamentos

  • As diretrizes recomendam interromper os inibidores de SGLT2 3 a 4 dias antes das cirurgias eletivas não cardíacas para reduzir o risco de acidose metabólica perioperatória.[2][3]

  • Equilibrar os riscos de sangramento e trombose para os pacientes que tomam anticoagulantes é um desafio clínico; recomenda-se uma avaliação multidisciplinar dos fatores de risco e das circunstâncias individuais do paciente.[2]

Para isquemia miocárdica perioperatória

  • O monitoramento intraoperatório e pós-operatório do segmento ST pode ser útil para monitorar os pacientes com doença arterial coronariana diagnosticada ou submetidos a uma cirurgia vascular.

Para infarto do miocárdio perioperatório:

  • A medição da troponina pós-operatória é recomendada em pacientes com alterações no eletrocardiograma (ECG) ou com dor torácica típica de síndrome coronariana aguda.[2]

  • A vigilância é recomendada com a troponina cardíaca de alta sensibilidade T/I (hs-cTn T/I) nos pacientes com doença cardiovascular, fatores de risco cardiovascular (inclusive idade ≥65 anos) ou sintomas que sugiram doença cardiovascular submetidos a uma cirurgia não cardíaca de risco intermediário ou alto. A hs-cTn T/I deve ser medida antes da cirurgia e a 24 e 48 horas após a cirurgia.[2][3]

Estenose aórtica sintomática

  • A estenose aórtica grave representa um risco significativo para a cirurgia não cardíaca. As diretrizes sugerem que a cirurgia não cardíaca eletiva geralmente deve ser protelada ou cancelada nesses pacientes.[2]

  • Os pacientes precisam da substituição cirúrgica da valva aórtica antes de uma cirurgia não cardíaca eletiva, mas necessária.

Estenose aórtica assintomática

  • Se a estenose aórtica for grave, mas assintomática, a cirurgia deve ser preferencialmente protelada ou cancelada se a valva não tiver sido avaliada no ano prévio.[2]

  • Os pacientes com fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) ≤50% devem ser considerados para substituição cirúrgica da valva aórtica antes de uma cirurgia eletiva não cardíaca. Nos pacientes com FEVE ≥50%, a decisão de adiar ou prosseguir com a cirurgia dependerá de se ela é um procedimento de risco elevado (isto é, risco alto ou intermediário).

Hipertensão pulmonar

  • As diretrizes recomendam avaliar os pacientes para características de risco intermediário e alto de hipertensão pulmonar que elevem o risco de complicações perioperatórias. Os pacientes devem ser avaliados por um anestesiologista e um especialista em hipertensão pulmonar, sempre que possível.[20]

Cardiopatia congênita

Os pacientes com cardiopatia congênita, especialmente aqueles com lesões não reparadas ou com carga lesional residual e estado cardiovascular comprometido, necessitam de um manejo perioperatório individualizado. As diretrizes da American Heart Association/American College of Cardiology (AHA/ACC) para o tratamento de adultos com cardiopatia congênita recomendam uma abordagem gradual para a avaliação cardíaca pré-operatória.[21][22]

Pacientes em uso de medicamentos psicotrópicos[23]

  • O tratamento antidepressivo para os pacientes com depressão não deve ser descontinuado antes de uma cirurgia não cardíaca.

  • Os pacientes tratados com antidepressivos tricíclicos de modo crônico devem passar por avaliação cardíaca antes de uma cirurgia não cardíaca.

  • Os inibidores da monoamina oxidase (IMAOs) irreversíveis devem ser descontinuados pelo menos 2 semanas antes de uma cirurgia não cardíaca e substituídos por um IMAO reversível para evitar a recidiva da doença subjacente.

  • A incidência de confusão pós-operatória é significativamente maior nos pacientes com esquizofrenia, se o tratamento medicamentoso for descontinuado antes da cirurgia. Portanto, os antipsicóticos devem ser mantidos no período perioperatório nos pacientes com esquizofrenia crônica.

  • A administração de lítio deve ser interrompida 72 horas antes da cirurgia. Ela pode ser reiniciada mais tarde se o paciente tiver faixas normais de eletrólitos, estiver hemodinamicamente estável e for capaz de comer e beber.

Avaliação pré-operatória do paciente cirúrgico idoso[24]

  • Dados da US National Hospital Discharge Survey (Pesquisa Nacional de Altas Hospitalares nos EUA) demostram um aumento no uso de hospitais por idosos.[25][26] Em resposta à necessidade de melhora da qualidade na assistência cirúrgica perioperatória geriátrica, o American College of Surgeons National Surgical Quality Improvement Program e a American Geriatrics Society formularam diretrizes práticas para garantir os cuidados ideais ao paciente cirúrgico geriátrico.[24] O painel de desenvolvimento de diretrizes priorizou vários domínios pré-operatórios específicos para idosos (por exemplo, comprometimento cognitivo, fragilidade, polimedicação) e, além disso, os problemas comumente encontrados nessa população (por exemplo, risco de desnutrição, falta de apoio da família ou social). Declarações de consenso e recomendações baseadas em evidências para melhorar a avaliação pré-operatória do paciente cirúrgico geriátrico foram resumidas em um checklist:[24]

    • Obter anamnese e exame físico completos

    • Avaliar a habilidade cognitiva e a capacidade de compreender a cirurgia prevista

    • Rastreamento de depressão

    • Identificar e documentar fatores de risco de desenvolvimento de delirium pós-operatório

    • Rastreamento de abuso/dependência de bebidas alcoólicas e outras substâncias

    • Realizar uma avaliação cardiológica pré-operatória de acordo com a diretriz local para pacientes submetidos à cirurgia não cardíaca (por exemplo, American College of Cardiology/American Heart Association, European Society of Cardiology/ European Society of Anaesthesiology)[2][27]

    • Identificar os fatores de risco de complicações pulmonares pós-operatórias e implementar estratégias preventivas

    • Documentar o estado funcional e a história de quedas

    • Determinar o escore de fragilidade na linha basal

    • Avaliar o estado nutricional e considerar intervenções pré-operatórias se o paciente estiver em risco nutricional grave

    • Documentar a história medicamentosa e considerar os ajustes perioperatórios apropriados. Monitorar a polimedicação

    • Determinar os objetivos e as expectativas do paciente quanto ao tratamento, no contexto dos possíveis desfechos do tratamento

    • Determinar o sistema de apoio familiar e social do paciente

    • Solicitar testes diagnósticos pré-operatórios adequados focados nos pacientes idosos.

(Adaptado de: Chow WB, Rosenthal RA, Merkow RP, et al. Optimal preoperative assessment of the geriatric surgical patient: a best practices guideline from the American College of Surgeons National Surgical Quality Improvement Program and the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2012;215:453-466.[24])

American College of Cardiology (ACC)/American Heart Association (AHA)

European Society of Cardiology (ESC)

Canadian Cardiovascular Society

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