Etiologia

Todas as ictioses hereditárias têm uma base genética. Existem várias interações complexas de proteínas intracelulares e extracelulares, lipídios, filamentos nucleares e enzimas envolvidas na formação da epiderme. Os defeitos em qualquer um desses componentes podem acarretar função epidérmica alterada.

A ictiose vulgar (a ictiose mais comum) e ictiose epidermolítica são herdadas de forma dominante. Uma história familiar positiva constitui forte fator de risco para a ocorrência dessas doenças.

Muitos dos tipos mais graves de ictioses são herdados em um padrão recessivo. Assim, existe uma maior frequência dessas doenças em populações consanguíneas.[5]

A ictiose adquirida pode ser causada por medicamentos, incluindo a clofazimina, agentes hipolipemiantes e a butirofenona.[6][7][8] Várias doenças sistêmicas foram relatadas em associação com a ictiose adquirida, inclusive linfoma, diabetes mellitus e lúpus eritematoso sistêmico (LES).[9][10][11][12]

Fisiopatologia

As manifestações clínicas das diferentes ictioses resultam de um defeito em um dos muitos processos envolvidos na queratinização. A característica clínica comum a muitas das diferentes ictioses é a presença de escamas. O tamanho e a espessura dessas escamas variam dependendo do subtipo específico de ictiose, e o grau da descamação pode levar a outras manifestações da doença, como eritema, prurido, colonização bacteriana, ectrópio e queda de cabelos. Como algumas das ictioses são causadas por um defeito em alguma proteína ou enzima que tem um papel na função dos sistemas de órgãos, podem ocorrer manifestações sistêmicas.

Classificação

Tipos de ictiose hereditária[1]

Ictioses comuns

  • Ictiose vulgar (autossômica semidominante; mutações em FLG):

    • Início na infância ou primeira infância de escamas aderentes; mais proeminente sobre as pernas, solas e palmas hiperlineares

    • Pode ter dermatite atópica, ceratose pilar.

  • Ictiose ligada ao cromossomo X recessivo (recessiva ligada ao X; mutações em STS):

    • Descamação variável, muitas vezes proeminente na parte lateral do pescoço

    • As características associadas incluem opacidades corneanas assintomáticas e criptorquidia.

Ictioses congênitas não sindrômicas

  • Ictiose congênita autossômica recessiva ([ARCI] mutações em ABCA12, TGM1, ALOXE3, ALOX12B, NIPAL4, CYP4F22, CERS3, PNPLA1):

    • Termo genérico, incluindo o espectro de ictiose lamelar (LI), eritrodermia ictiosiforme congênita (CIE) e ictiose arlequim (HI)

    • O fenótipo neonatal é membrana de colódio ou descamação e eritema generalizados, que evolui até o fenótipo maduro de escamas e vermelhidão variáveis

    • A ictiose arlequim se manifesta com escamas espessas e amarelas características associadas a ectrópio e eclábio

    • Pequenas variações incluem bebê colódio autocurável e ictiose do tipo molhada.

  • Ictiose queratinopática:

    • Ictiose epidermolítica (autossômica dominante; mutações em KRT1, KRT10)

    • Ictiose epidermolítica superficial (autossômica dominante; mutações em KRT2). Presente no nascimento com eritema, bolhas e erosões, hiperceratose variável ao longo do tempo, muitas vezes mais proeminente nos locais de flexão

    • Queratoderma palmoplantar classicamente associado às mutações do KRT1.

Ictiose sindrômica[1]

Síndrome de Sjogren-Larsson (autossômica recessiva; mutações em ALDH3A2):

  • Distúrbio neurocutâneo raro causado por atividade deficiente da aldeído graxo desidrogenase (FALDH), uma enzima necessária para oxidar o álcool adiposo em ácido graxo.

  • Descamação sobre tronco, pescoço e locais de flexão

  • Muitas vezes associada a prurido intenso

  • Diplegia ou tetraplegia espástica e deficiência intelectual.

Síndrome de Netherton (autossômica recessiva; mutações em SPINK5):

  • Eritema e descamação ao nascer que evoluem para um de dois fenótipos: eritema e escama generalizados ou ictiose linear circunflexa; vários pacientes também têm dermatite

  • Características associadas incluem anormalidades na haste capilar (tricorrexe invaginada), IgE sérica elevada, alergias e retardo do crescimento pôndero-estatural.

Doença de Refsum (autossômica recessiva; mutações em PHYH, PEX7):

  • Também conhecida como neuropatia motora e sensorial hereditária tipo IV (NMSH IV)

  • Cerca de 50% dos pacientes têm achados cutâneos com descamação branca e fina que muitas vezes assemelham-se a ictiose vulgar

  • As características associadas incluem retinite pigmentosa atípica, anosmia, surdez progressiva, neuropatia periférica e ataxia cerebelar.

Doença do armazenamento lipídico neutro com ictiose (autossômica recessiva; mutações em ABHD5):

  • Descamação e eritema generalizados

  • Características associadas podem incluir miopatia, deficit no crescimento, surdez neurossensorial e cataratas

  • Vacúolos contendo lipídios observados em leucócitos no esfregaço de sangue periférico.

Tricotiodistrofia (autossômica recessiva; mutações em ERCC2, ERCC3, GTF2H5):

  • Descamação branca fina generalizada, cabelos e unhas quebradiços

  • Características associadas incluem baixa estatura, deficiência intelectual, infecções recorrentes, anomalias esqueléticas e fotossensibilidade.

Síndrome ceratite-ictiose-surdez (autossômica dominante; mutações em GJB2):

  • Manifesta-se ao nascer ou na primeira infância, com placas hiperceratóticas com predominância no rosto e membros

  • As características associadas incluem comprometimento da audição neurossensorial e ceratite progressiva

  • Infecções recorrentes são comuns, particularmente pela Candida albicans.

Síndrome da ictiose da prematuridade (autossômica recessiva; mutações em FATP4):

  • Tríade de nascimento prematuro, escama espessa semelhante a vérnix caseoso e asfixia neonatal

  • Polidrâmnios na ultrassonografia pré-natal.

Síndrome de Conradi-Hunermann-Happle (dominante ligada ao cromossomo X; mutações em EBP):

  • Vermelhidão e descamação ao longo das linhas de Blaschko ao nascer, evoluindo para atrofodermia folicular

  • Características associadas incluem condrodisplasia punctata, cataratas unilaterais, anomalias esqueléticas e alopecia cicatricial.

Síndrome CHILD (hemidisplasia congênita com eritrodermia ictiosiforme e defeitos nos membros; dominante ligada ao cromossomo X; mutações em NSDHL):

  • Vermelhidão unilateral e escama amarela aderente ao nascer, que com o tempo torna-se hiperceratótica ou verrucosa.

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