Abordagem

Embora a anamnese e o exame físico frequentemente direcionem o médico para um diagnóstico funcional, muitas vezes são necessários estudos complementares. A maioria dos distúrbios sistêmicos pode ser diagnosticada com exames laboratoriais para avaliar as funções neuroendócrina e ovariana, enquanto que a maior parte das anormalidades estruturais é identificada via exames pélvicos ou estudos de imagem.[1]

História

  • A idade média do desenvolvimento puberal auxilia na decisão do momento de uma avaliação da amenorreia. A avaliação deve ocorrer na ausência de menstruação até os 15 anos de idade (se outro desenvolvimento puberal for observado), em até 3 anos após o desenvolvimento das mamas, ou em caso de ausência de desenvolvimento das mamas até os 13 anos de idade.[1][15][16]​ A telarca ("brotamento mamário") denota uma produção prévia ou vigente de estrogênio. A idade do surgimento ou sua ausência podem ser usadas para determinar quando uma avaliação deve ser iniciada. A pubarca (surgimento de pelos pubianos) precoce pode ser associada ao desenvolvimento da síndrome dos ovários policísticos (SOPC).[17]

  • Galactorreia: a hiperprolactinemia está mais comumente associada à amenorreia secundária.

  • História de traumatismo cranioencefálico ou infecção do sistema nervoso central: uma história remota pode ser relatada pela paciente ou pelos pais.

  • Cefaleia/alterações no campo visual: sugerem um tumor no sistema nervoso central (por exemplo, craniofaringioma).[18]

  • Anosmia: sugere síndrome de Kallman ou uma deficiência congênita completa de hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH).[19]

  • Doença sistêmica crônica: pode apresentar-se com fadiga, mal-estar, anorexia e perda de peso.

  • História familiar: a estatura deve ser documentada e comparada à de outros membros da família. A baixa estatura é sugestiva de síndrome de Turner ou doença hipotalâmica-hipofisária.[20] Uma história familiar de puberdade tardia, além do início da menarca na mãe e nas irmãs da paciente, deve ser eliciada.

  • O diagnóstico de amenorreia hipotalâmica funcional só deve ser realizado após a exclusão de uma patologia anatômica ou orgânica. É necessário averiguar o estado de saúde, os hábitos alimentares e a imagem corporal da paciente. Um estado nutricional deficiente devido a doença sistêmica, transtorno alimentar e/ou baixos níveis de gordura corporal pode resultar em disfunção hipotalâmica.[21]​ Estresse emocional ou uma capacidade atlética extrema também podem resultar em um fenômeno semelhante.[22][23]

Exame físico

  • Devem ser aferidos o peso e a altura da paciente. A baixa estatura pode sugerir uma anormalidade cromossômica. Pacientes com disgenesia gonadal e hipoestrogenemia apresentam risco de baixa estatura final na idade adulta. O padrão de crescimento deve ser documentado e comparado ao de outros parentes de primeiro grau.

  • No exame inicial, muita atenção deve ser dada a fatores como alopécia androgênica, alteração na tonalidade da voz, amplitude da distribuição de pelos terminais (padrão masculino), acne ou pele oleosa, os quais podem sugerir hiperandrogenemia. Esses padrões podem variar em função da ascendência. Quando os sintomas progridem lentamente, é possível a presença da síndrome do ovário policístico (SOPC) ou uma hiperplasia adrenal congênita não clássica. Se progridem de forma aguda e progressiva, a paciente pode estar hospedando um tumor produtor de androgênio (ovariano ou adrenal).

  • Considere realizar um exame físico neurológico para avaliar achados neurológicos como alterações na visão periférica, que sugere uma massa intracraniana comprimindo o quiasma óptico (por exemplo, adenoma hipofisário, craniofaringioma).

  • Um exame físico cuidadoso das mamas para considerar galactorreia deve ser realizado no caso de haver suspeita de prolactinoma.

  • A maioria das anormalidades estruturais são identificadas por exames bimanuais com espéculo. O hímen deve ser avaliado primeiro. Uma bolsa vaginal cega será observada em pacientes com agenesia mülleriana, septo vaginal transverso ou síndrome de insensibilidade androgênica (esta última acompanhada por hérnias inguinais). O colo uterino deve ser observado no exame físico. Exames internos nem sempre são possíveis, e o médico pode precisar prosseguir com opções de captura de imagens ou exames sob anestesia.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Hímen imperfuradoLardenoije C, Aardenburg R, Mertens H. Imperforate hymen: a cause of abdominal pain in female adolescents. BMJ Case Reports 2009; doi:10.1136/bcr.08.2008.0722 [Citation ends].com.bmj.content.model.assessment.Caption@7daddf19

Exames laboratoriais

Todas as pacientes com amenorreia primária, independentemente dos achados do exame físico, devem ser submetidas a exames laboratoriais preliminares, inclusive hormônio folículo-estimulante (FSH), estradiol, hormônio estimulante da tireoide (TSH) e prolactina. Com base nos resultados, exames adicionais podem ser solicitados.

As pacientes com desenvolvimento sexual secundário devem ser avaliadas quanto a gravidez. O cariótipo é indicado para as pacientes com amenorreia primária e ausência de desenvolvimento sexual secundário, ou para aquelas diagnosticadas com insuficiência ovariana prematura (geralmente amenorreia secundária).[7][24]

  • FSH: em conjunto com os níveis de estradiol, as gonadotrofinas ajudam a determinar se a amenorreia é causada por insuficiência gonadal, disfunção hipotalâmica ou questões sistêmicas ou funcionais. O FSH é mais útil como teste único do que o hormônio luteinizante (LH), e o LH geralmente não está incluído nas investigações iniciais solicitadas.

  • Estradiol sérico: os baixos níveis sugerem insuficiência ovariana primária (em conjunto com FSH elevado) ou função hipotalâmica suprimida (FSH baixo).

  • Prolactina sérica: os níveis elevados de prolactina circulante (hiperprolactinemia), seja idiopática ou causada por adenoma hipofisário, resultam em hipogonadismo hipogonadotrófico. Para níveis persistentemente elevados, exames de neuroimagem são indicados para descartar uma neoplasia intracraniana.[13]

  • TSH: é indicado para descartar hipotireoidismo (primário), mais comumente associado à amenorreia secundária. É improvável que hipotireoidismo leve ou subclínico resulte em irregularidades menstruais.[25] Foi proposto que os níveis elevados de hormônio liberador de tireotrofina (TRH) estimulam a secreção de prolactina da hipófise, suprimindo a produção de FSH.[26]

  • Androgênios séricos: para verificar sinais de hiperandrogenismo. Os androgênios como sulfato de desidroepiandrosterona (DHEA-S) e testosterona livre estarão elevados nas pacientes com SOP, mas níveis mais altos são sugestivos de um tumor produtor de androgênios, e essas pacientes devem ser encaminhadas para investigações adicionais.[27][28]

  • Cariótipo: ajuda a identificar as pacientes com risco de tumores gonadais, como aquelas com insuficiência ovariana prematura (geralmente amenorreia secundária), síndrome de insensibilidade androgênica ou disgenesia gonadal.[1]​​[6][14]​​​ Um diagnóstico de insensibilidade androgênica completa pode ser confirmado por um cariótipo 46,XY, e um diagnóstico de síndrome de Turner pelo 45,X. A disgenesia gonadal (gônadas estriadas) pode ocorrer com cariótipos XX e XY normais.[1]

Exames fisiológicos e de imagem

  • Na impossibilidade de se obter um exame pélvico, realiza-se uma ultrassonografia transvaginal ou transabdominal. A ultrassonografia confirma uma anatomia normal e ajuda no diagnóstico da maioria das anormalidades estruturais, assim como da presença de um tumor ovariano ou adrenal. A via transvaginal é a modalidade preferencial, se possível e apropriada, para avaliar a espessura endometrial.

  • A ressonância nuclear magnética (RNM) é a ferramenta mais eficaz para caracterizar as anormalidades estruturais específicas, podendo dispensar um diagnóstico cirúrgico. Na RNM, a agenesia mülleriana (síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser) ou defeitos de fusão assimétrica do sistema Mülleriano (útero unicorno) podem ser identificados, bem como anormalidades renais, as quais podem ocorrer em até 30% desses pacientes.[29] Uma radiografia da coluna pode revelar anormalidades esqueléticas, que foram reportadas em cerca de 8% a 32% dos pacientes com agenesia mülleriana.[30]

  • Quando os níveis de prolactina estão significativamente elevados, uma RNM craniana é indicada para descartar adenoma hipofisário.[13]

  • A medição da densidade óssea pode ser indicada em pacientes selecionados.[24]​ A idade óssea é um exame adicional conduzido nas pacientes com puberdade tardia.

  • Recomenda-se audiometria e avaliações oftalmológicas em pacientes com síndrome de Turner. Um rastreamento celíaco também é útil nesses pacientes.

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