Considerações de urgência
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Há alguns princípios gerais que devem ser seguidos para todos os pacientes, independente da causa da febre. Os médicos devem evitar o uso rotineiro de antibióticos, a menos que os pacientes apresentem sinais de reação inflamatória sistêmica com disfunção de órgãos, que estejam hemodinamicamente instáveis ou que sejam imunocomprometidos. Dispositivos de acesso vascular desnecessários devem ser removidos. Os medicamentos potencialmente indutores de febre devem ser descontinuados. Os antipiréticos, como o paracetamol, são úteis porque proporcionam analgesia e reduzem as demandas fisiológicas da febre. Essas terapias não devem ser retardadas devido a preocupações quanto ao mascaramento da febre, pois há poucas evidências de que mascarar a febre agrava os desfechos.[28]
Hipertermia maligna
Uma rara reação adversa à anestesia inalatória. Geralmente, se manifesta imediatamente após a administração de um anestésico desencadeador ou succinilcolina (suxametônio), mas os sintomas podem aparecer até 1 hora após a administração desses agentes. Os sintomas incluem taquicardia, hipercapnia e/ou taquipneia, temperatura elevada e rigidez muscular.[18] Geralmente, a febre está >40 ºC (104 ºF). Se houver suspeitas, a anestesia inalatória deverá ser descontinuada, e deverá ser iniciado tratamento com o dantroleno.
Reação transfusional
Sangue ou hemoderivados podem causar reação transfusional, uma complicação grave, que geralmente ocorre durante ou imediatamente após a transfusão. A febre pode ser acompanhada por cefaleia, náuseas, vômitos, ansiedade, sibilância e/ou dor no tórax, nas costas, no abdome ou nos membros infundidos. A temperatura, a frequência cardíaca e a pressão arterial devem ser verificadas 15 minutos após o início da transfusão de sangue, e a transfusão deve ser interrompida imediatamente em caso de suspeita de reação.[29]
Síndrome do choque tóxico
Uma rara complicação de infecções cirúrgicas e derivadas de feridas pós-parto. Os organismos típicos são o Staphylococcus aureus ou o Streptococcus beta-hemolítico do grupo A. Os pacientes se apresentam com febre, hipotensão e manifestações dermatológicas que consistem em uma eritrodermia macular difusa. O choque e a insuficiência de múltiplos sistemas de órgãos podem complicar essa infecção, portanto o reconhecimento precoce é importante. Culturas de sangue, de ferida e de tecido devem ser obtidas, e a antibioticoterapia empírica deve ser administrada. Essa é uma das poucas infecções que se manifesta nas primeiras 48 horas pós-operatórias.[14]
[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Rash e edema subcutâneo na mão direita devidos a síndrome do choque tóxicoDos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e da Public Health Image Library [Citation ends].
Trombose venosa profunda e embolia pulmonar
O tromboembolismo venoso ocorre em <1% dos pacientes cirúrgicos.[6] Maior tempo de permanência hospitalar, obesidade, câncer, idade avançada e história de tromboembolismo venoso aumentam o risco de tromboembolismo venoso.[30] Os sintomas de trombose venosa profunda (TVP) incluem edema na panturrilha (ou, mais raramente, edema em toda a perna), dor localizada ao longo do sistema venoso profundo, edema ou veias superficiais dilatadas sobre o pé e a perna. Os sintomas podem ser muito sutis e os pacientes podem ser assintomáticos.
[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Trombose venosa profunda (TVP) da perna direita com inchaço e vermelhidão associadosDo acervo de James Heilman, MD. [Citation ends].
Os pacientes com grande probabilidade de TVP precisam de investigações adicionais com uma ultrassonografia duplex do membro inferior. O dímero D é elevado por, pelo menos, uma semana no pós-operatório em pacientes sem TVP, limitando sua utilidade nessa população.[31]
A embolia pulmonar (EP) é responsável por uma alta taxa de mortalidade, e os médicos devem ter um alto índice de suspeita de qualquer paciente com dispneia no período pós-operatório, sobretudo com quadro de taquicardia e febre. A suspeita de EP deve incitar o teste com uma angiotomografia pulmonar ou cintilografia de ventilação/perfusão (para pacientes com contraindicação para a angiotomografia pulmonar).
Colite pseudomembranosa
O Clostridium difficile está se tornando mais comum devido ao amplo uso de antibióticos. Se os sintomas da infecção por C difficile não forem reconhecidos precocemente, a diarreia incipiente leve poderá evoluir para uma colite fulminante.
Nos casos de pacientes febris e com diarreia, amostras fecais para exames de toxinas do C difficile devem ser enviadas, sobretudo na hipótese de haver um rápido aumento na contagem de leucócitos.
O antibiótico causador deve ser descontinuado o mais rápido possível.[32] Se os antibióticos não puderem ser suspensos, um agente com menor probabilidade de causar infecção por C difficile deverá substituí-los.
A antibioticoterapia deve ser iniciada de forma empírica se houver probabilidade de um atraso substancial (>48 horas) na confirmação laboratorial ou para infecção fulminante. No caso dos outros pacientes, a antibioticoterapia pode ser iniciada após o diagnóstico de modo a limitar o uso excessivo de antibióticos. Os esquemas recomendados baseiam-se na gravidade da doença e se o episódio é inicial ou recorrente.
Diretrizes dos EUA recomendam vancomicina oral ou fidaxomicina como agente de primeira linha para um episódio inicial de infecção por C difficile. Antes, o antibiótico de preferência era o metronidazol oral; porém, agora ele só é recomendado em situações nas quais o acesso a agentes de primeira linha é limitado.[32] As diretrizes internacionais ainda podem recomendar metronidazol como agente de primeira linha para a doença não grave. Consulte as orientações locais.
Rejeição de transplante
A rejeição de transplante é uma complicação do transplante que apresenta um potencial risco de vida. A febre é um importante sinal de manifestação, e deve-se suspeitar imediatamente de uma rejeição. A rejeição hiperaguda se manifesta no período intraoperatório e imediatamente pós-operatório. Geralmente, a rejeição aguda se manifesta na segunda semana pós-operatória, embora possa se manifestar até 6 meses após o transplante.[33] A rejeição crônica pode se manifestar a qualquer momento após a quarta semana pós-operatória.
Delirium tremens
Tipicamente, a abstinência alcoólica se manifesta de 3 a 5 dias após a cessação da ingestão de álcool, embora alguns sintomas, como o tremor, possam começar nas primeiras 48 horas. Raramente, a abstinência alcoólica pode se manifestar com delirium tremens, que causa risco de vida. Os sintomas incluem confusão, agitação, paranoia e alucinações visuais e auditivas.[34] Se houver história de abuso de álcool, a possibilidade de abstinência alcoólica pós-operatória deve ser antecipada. Inicie o tratamento imediato com benzodiazepínicos para reduzir os sintomas e o risco de convulsão.
Febre em pacientes imunossuprimidos
Qualquer tipo de febre em pacientes imunossuprimidos requer uma investigação urgente, pois esses pacientes têm maior susceptibilidade a infecções bacterianas e fúngicas que podem ser fatais. O risco de todas as infecções pós-operatórias aumenta muito, e infecções adicionais causadas pela flora endógena do intestino e da mucosa podem ocorrer a qualquer momento. Os sinais habituais de inflamação podem estar ausentes ou menos óbvios nesse grupo de pacientes. Uma antibioticoterapia empírica de amplo espectro deve ser iniciada o quanto antes após o surgimento da febre.
Sepse
A sepse é um espectro de doença na qual existe uma resposta sistêmica e desregulada do hospedeiro a uma infecção.[35] A apresentação varia de sintomas sutis e inespecíficos (por exemplo, mal-estar com uma temperatura normal, mal-estar, letargia, náuseas ou vômitos) a sintomas graves com evidência de disfunção de múltiplos órgãos e choque séptico. Os pacientes podem apresentar sinais de taquicardia, taquipneia, hipotensão, febre ou hipotermia, enchimento capilar lentificado, pele manchada ou pálida, cianose, estado mental recém-alterado, débito urinário reduzido.[36] A sepse e o choque séptico são emergências médicas.
Os fatores de risco para sepse incluem:[36]
idade abaixo de 1 ano
idade superior a 75 anos
fragilidade, imunidade comprometida (em decorrência de doenças ou medicamentos)
cirurgia recente ou outros procedimentos invasivos
qualquer quebra da integridade cutânea (por exemplo, cortes, queimaduras)
uso indevido de substâncias por via intravenosa
acessos venosos ou cateteres de demora e
gravidez atual ou recente.
O reconhecimento precoce da sepse é essencial porque o tratamento precoce melhora os desfechos.[36][Evidência C][Evidência C][37] Contudo, a detecção pode ser desafiadora porque o quadro clínico da sepse pode ser sutil e inespecífico. Portanto, um limiar baixo para a suspeita de sepse é importante. A chave para o reconhecimento precoce é a identificação sistemática de qualquer paciente que tenha sinais ou sintomas sugestivos de infecção e esteja em risco de deterioração devida a disfunção orgânica. Várias abordagens de estratificação de risco foram propostas. Todas contam com uma avaliação clínica estruturada e o registro dos sinais vitais do paciente.[36][38][39][40][41] É importante consultar as orientações locais para obter informações sobre a abordagem recomendada pela sua instituição. A cronologia das investigações e tratamentos deve ser orientada por essa avaliação inicial.[41]
A Surviving Sepsis Campaign produziu diretrizes de tratamento que constituem ainda hoje o padrão mais amplamente aceito.[37][42] O tratamento recomendado para os pacientes com suspeita de sepse é:
Meça o nível de lactato e realize novamente a medição caso o lactato inicial esteja elevado (>2 mmol/L [>18 mg/dL])
Obtenha hemoculturas antes de administrar antibióticos
Administrar antibióticos de amplo espectro (com cobertura de Staphylococcus aureus resistente à meticilina [MRSA], se houver alto risco de MRSA) para adultos com possível choque séptico ou alta probabilidade de sepse
Para os adultos com sepse ou choque séptico com alto risco de infecção fúngica, deve-se administrar terapia antifúngica empírica
Comece uma administração rápida de cristaloides se houver hipotensão ou um nível de lactato ≥4 mmol/L (≥36 mg/dL). Consulte os protocolos locais.
Administre vasopressores de maneira periférica se o paciente estiver hipotenso durante ou após a ressuscitação fluídica para manter uma PAM ≥ 65 mm Hg, em vez de protelar o início até que um acesso venoso central esteja assegurado. A noradrenalina é o vasopressor de primeira escolha
Para adultos com insuficiência respiratória hipoxêmica induzida por sepse, deve-se administrar oxigênio nasal em sistema de alto fluxo.
Idealmente, essas intervenções devem começar na primeira hora após a identificação da sepse.[42]
Para pacientes com possível sepse sem choque, se a preocupação relativa à infecção persistir, deve-se administrar antibióticos até 3 horas após o reconhecimento inicial de sepse.[37] Para adultos com baixa probabilidade de infecção e sem choque, os antibióticos podem ser postergados e pode-se continuar monitorando o paciente rigorosamente.[37]
Para obter mais informações sobre sepse, consulte Sepse em adultos e Sepse em crianças.
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