Abordagem
A avaliação da diarreia crônica pode ser difícil e uma avaliação eficaz requer um discernimento clínico significativo. A abordagem da avaliação inicialmente deve centrar-se nas condições mais comuns e as mais graves ajustando-se à história e ao quadro clínico. Se a avaliação inicial não identificar uma etiologia, o diagnóstico pode ser pesquisado de modo sistemático para cada diagnóstico diferencial.
Considerações sobre a história clínica e os sintomas
A avaliação começa com uma história completa e atenta aos sintomas, início e duração, histórico de viagens recentes, problemas médicos concomitantes, dieta (por exemplo, lactose, frutose, glúten etc.) e uso de medicamentos.[4] A documentação da consistência das fezes pode ser simplificada com a "Escala de fezes de Bristol".[5] Bristol stool chart Opens in new window
Os principais componentes da história incluem:
Duração da diarreia: mais de 4 semanas em diarreia crônica[1]
Número de episódios por dia: ≥3 evacuações diarreicas por dia na diarreia crônica[1]
Acordar à noite com os sintomas: torna menos prováveis os distúrbios funcionais
Presença de sangue nas fezes: pode significar doença inflamatória intestinal (DII), neoplasia maligna ou isquemia.
Os sintomas associados podem incluir:
Perda de peso/retardo do crescimento pôndero-estatural (por exemplo, doença celíaca, DII, neoplasia maligna, supercrescimento bacteriano no intestino delgado, pancreatite crônica, hipertireoidismo, diabetes)
Dor abdominal (por exemplo, doença celíaca, doença de Crohn, malignidade)
Constipação alternada com diarreia (por exemplo, DII, fecaloma com escape)
Náuseas e vômitos (por exemplo, doença de Crohn do intestino delgado, supercrescimento bacteriano no intestino delgado, diabetes, fecaloma)
Hematoquezia ou melena (DII, isquemia, neoplasia maligna)
Alterações na pele (doença celíaca, doença inflamatória intestinal).
Sintomas inespecíficos adicionais podem incluir:
Esteatorreia (por exemplo, em insuficiência pancreática, doença celíaca, doença hepática, giardíase)
Distensão/inchaço abdominal (inespecífico, mas esteja atento à síndrome do intestino irritável e ao supercrescimento bacteriano no intestino delgado)
Flatulência (inespecífico, mas esteja atento à síndrome do intestino irritável e ao supercrescimento bacteriano no intestino delgado)
Borborigmo (inespecífico)
Anorexia (inespecífico)
Aumento de infecções (imunodeficiência variável comum, vírus da imunodeficiência humana [HIV]).
Os medicamentos que provocam diarreia podem incluir:
Uso de laxativo (pode não ser relatado pelo paciente)
Inibidores da bomba de prótons
Medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais
Quinina
Antibióticos (esteja atento à infecção por Clostridium difficile)
Determinadas quimioterapias e outros tratamentos contra o câncer.[6]
Exame físico
O exame físico é geralmente inespecífico.
Os principais achados são:
As erupções cutâneas, como dermatite herpetiforme, eritema nodoso e pioderma gangrenoso, são compatíveis com doença celíaca ou DII
A linfadenopatia ou massas abdominais são sugestivas de infecção ou malignidade
Sangue ao exame retal é altamente sugestivo de lesão na mucosa, como DII ou neoplasia maligna.
Avaliação laboratorial
Os exames laboratoriais devem ser individualizados de acordo com os fatores de risco para a doença. Por exemplo, as doenças parasitárias são raras na América do Norte e na Europa Ocidental, caso não haja histórico de viagens recentes.
Os exames laboratoriais básicos, realizados em todos os pacientes, incluem hemograma completo, eletrólitos, glicose, testes de função hepática, proteína C-reativa, testes de função tireoidiana, sorologia para doença celíaca, níveis de imunoglobulina A (IgA) e de hematínicos (B12, folato, ferritina). O teste de calprotectina fecal pode ser considerado, se disponível. Demonstrou-se que a calprotectina fecal permite diferenciar de forma consistente a DII e a síndrome do intestino irritável, pois apresenta um valor preditivo negativo excelente para descartar a DII em pacientes sintomáticos, mas não diagnosticados.[4][7][8] No entanto, a calprotectina fecal também pode estar elevada em alguns casos de câncer colorretal, infecção gastrointestinal ou com o uso de AINEs, limitando a especificidade do exame.[4]
São poucas as infecções virais ou bacterianas que causam diarreia crônica em um hospedeiro imunocompetente, mas certos parasitas, como a giárdia, são comuns e devem ser testados com uma amostra fecal em microscopia, cultura e sensibilidade. O número de amostras fecais necessárias para obter a especificidade adequada varia com a modalidade de diagnóstico. Uma única amostra pode ser adequada usando a imunofluorescência direta, enquanto 3 amostras serão necessárias para exames microscópicos.
Avaliação endoscópica
Na avaliação da diarreia crônica, a endoscopia é uma ferramenta diagnóstica valiosa e é frequentemente solicitada, a menos que haja evidência de outra patologia que exija tratamento, como, por exemplo, constipação grave (isso também torna ainda mais improvável uma doença da mucosa).[9] A endoscopia permite uma avaliação visual imediata da gravidade da doença e a extensão da doença inflamatória intestinal (DII), além de fornecer informações prognósticas.
A avaliação histológica documenta a presença de colite macroscópica e microscópica. A inflamação na colonoscopia pode direcionar futuras investigações, como avaliações adicionais de intestino delgado se houver suspeita de doença de Crohn. Uma colonoscopia negativa pode tranquilizar aqueles pacientes preocupados com a suspeita de DII ou câncer. Se houver suspeita de doença celíaca, uma gastroscopia com biópsias duodenais pode ser realizada na mesma visita.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Fotomicrografia de atrofia vilosa na doença celíacaImagem cedida por Daniel Leffler, MD e Ciaran Kelly, MD; usada com permissão [Citation ends].[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Imagem endoscópica de pregas serrilhadas observadas na mucosa duodenal na doença celíaca e em outros distúrbios, incluindo giardíaseImagem cedida por Daniel Leffler, MD e Ciaran Kelly, MD; usada com permissão [Citation ends].
Pacientes com evidência de sangramento gastrointestinal, anemia ou perda de peso significativa devem se submeter urgentemente a avaliação endoscópica do trato gastrointestinal superior e do intestino grosso.
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